Caros Amigos, alguns anos atrás eu escrevi sobre como é difícil se construir um autódromo. Realmente, não é uma tarefa fácil e vai muito além da vontade de pessoas que por mais apaixonadas que sejam pelo esporte a motor, por mais bem intencionadas elas sejam, por mais recursos elas tenham, isso não é o bastante. A regulamentação que a FIA tem e que todos os afiliados a ela tem acesso é bastante clara e específica para que, quem quer que seja, o interessado em construir um autódromo possa seguir para ter um autódromo aprovado para competições em qualquer nível que seja. Para o caso dos autódromos, a Federação Internacional de Automobilismo tem uma classificação que vai de 1 a 5, onde são levados em consideração, dentre inúmeros critérios, largura de pista, extensão, aspectos de segurança, aspectos de infraestrutura para atender os eventos que pleiteia sediar, etc. Está tudo claramente explicado e seguir um regulamento para uma construção é algo normal em qualquer seguimento da construção civil. Alguns anos atrás o piloto da motovelocidade, maior nome até hoje da história do país, Alexandre Barros, nos disse em entrevista algo que chamou minha atenção e que é uma verdade insofismável: “Se um autódromo for seguro para a prática do motociclismo, ele é seguro para o automobilismo. A recíproca não é verdadeira”. Nestas horas me aperta o peito a destruição do autódromo de Jacarepaguá, que era perfeito para a motovelocidade, muito melhor e mais seguro do que Interlagos, que é um autódromo FIA 1. Aqui no meu estado, em Minas Gerais, há alguns anos foi lançado um projeto que encheu a este humilde colunista de esperanças: o Autódromo dos Cristais, nas proximidades da cidade de Curvelo, distante 170 Km de Belo Horizonte. A ideia do projeto como um todo é muito boa, com a integração de um condomínio de casas e a criação de um condomínio-clube para apaixonados por esporte a motor poder usar a pista. Na época do lançamento do projeto, seus idealizadores projetaram fazer um autódromo FIA 2 e buscar a homologação junto a Federação Internacional de Automobilismo para tentar trazer uma etapa do mundial de motovelocidade para o Brasil. Excelente, um plano ambicioso, um projeto nascido do zero eu uma área enorme teria tudo para das certo... mas porque então deu errado? O local escolhido para o empreendimento, apesar da área ser muito boa e o relevo interessante para a instalação de um autódromo tem uma série de problemas que deveriam ter sido levados em conta antes da implantação do projeto e que eu não sei se eles foram considerados como deveriam ou se foram simplesmente negligenciados pelos sócios do projeto. A área onde o complexo foi instalado é uma reserva de vegetação onde as árvores – pequizeiros – são protegidos por lei ambiental e não podem ser removidos e, em caso de remoção, outras 400 (sim, quatrocentas) precisariam ser plantadas. Assim, o projetista do traçado precisou criar uma forma de “serpentear” o pequizal que toma conta da paisagem. Além desta limitação, a solução encontrada para fazer uma pista com mais de 4 mil metros não foi possível encontrar espaço para se fazer uma reta decente. O maior trecho de reta tem menos de 700 mas este é o menor dos problemas. A pista tem áreas de escape pequenas na maioria das curvas do traçado. Para quem estava pensando um circuito para receber uma categoria internacional de motociclismo só podemos chegar a conclusão de que não foi pensada, ou não foi tentada ou – pior – simplesmente foi ignorada a execução de uma apresentação inicial para a Federação Internacional de Motociclismo ou a DORNA, empresa promotora do mundial de motovelocidade, para que as deficiências fossem analisadas e adequadas às necessidades da Moto GP para que o houvesse uma possibilidade de receberem a categoria. Muito pelo contrário, a pista mineira se mostrou extremamente insegura, com áreas de escape diminutas, limitadas pelos pequizeiros, não condiziam com algumas das curvas da média e alta velocidade que fazem parte do traçado, mas o pior foi o que todos viram na primeira corrida de uma categoria nacional no Circuito dos Cristais, em 2016, quando a Stock Car foi correr em no autódromo mineiro, apesar de contar na equipe com o piloto Bruno Junqueira, tenho minhas dúvidas se davam ouvidos aos conselhos do piloto. Foi um ato de extrema irresponsabilidade por parte da CBA e da Federação Mineira de Automobilismo terem aberto um circuito sem áreas de escape preparadas, sem caixas de brita, sem guard rails e onde, nos treinos, vimos um piloto capotar o carro depois de sair da pista e subir num barranco e um outro ao sair da pista bater e derrubar um muro de tijolos onde deveria ser concreto. Ainda assim a corrida aconteceu e no início do ano seguinte, o presidente da Federação Mineira de Automobilismo votou a favor do candidato da situação na eleição para presidente da CBA. A VICAR exigiu mudanças no traçado e com menos de dois anos de construído foi feito um traçado alternativo de pouco mais de 300 metros, evitando algumas curvas perigosas para que a Stock Car retornasse a Minas Gerais em 2017, mas os problemas não estavam apenas na pista. A estrutura para receber a categoria e os profissionais que nela trabalham tinha dificuldades para se instalar na cidade e vizinhanças por falta de hotéis. Algo que acabou fazendo com que Magny Cours perdesse o privilégio de sediar a Fórmula 1. Este ano a categoria não foi para Curvelo. Acredito que esta coluna pode encerrar uma trilogia sobre nossos autódromos, mas os problemas vão muito mais além.Tomar o caminho errado na encruzilhada tem sido uma lamentável sucessão de fatos aqui no Brasil.
Um abraço e até a próxima, Fernando Paiva
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