Caros Amigos, acho que já falei – algumas vezes – que trabalho no mercado mobiliário e que sou sócio de uma corretora de investimentos. No prédio onde fica nosso escritório aqui em Belo Horizonte tem profissionais de diversos seguimentos, com engenheiros, arquitetos, dentistas, contabilistas, médicos de diversas especialidades, advogados etc.

Nesta semana peguei o elevador com alguma pressa, por ter me atrasado, e contei com paciência de dois médicos que seguraram a porta por alguns segundos até que eu conseguisse entrar. Agradeci a gentileza e um deles, depois do “de nada, disponha” virou-se para mim e disse ser leitor assíduo da minha coluna (eu sempre me surpreendo quando alguém fala isso) e puxou conversa sobre automobilismo.

Não deu para falar muito. O elevador é rápido e eu fiquei no 13º andar e ele seguiria até um andar mais alto, mas uma das perguntas que ele fez foi o que eu achei da exclusão do “nosso mineiro Sérgio Sette Câmara”  do GP de Mônaco de Fórmula 2 com uma luxação  no braço, sem ter sido examinado pelos médicos da FIA enquanto eles deixavam o Robert Kubica pilotar um Fórmula 1 com todas as limitações que ele tem depois do acidente que sofreu em 2011 numa competição de rally.

Eu respondi apenas que também gostaria de saber qual seria o parâmetro para isso, mas que tinha certeza que algum exame deve ter sido feito. O elevador chegou no meu andar e eu fiquei com aquela indagação rondando a cabeça o dia inteiro. Não perguntei a especialidade do médico, mas além de fã de automobilismo, seguramente ele tem mais conhecimento sobre assuntos médicos do que eu para ter feito aquele questionamento.

Fui buscar no noticiário do final de semana do GP de Mônaco mais informações sobre o ocorrido para não deixar escapar algum detalhe importante e fui lendo as declarações de ambos lados para não tomar partido e simplesmente defender o piloto brasileiro e, mais ainda, o piloto mineiro. Sergio Sette Câmara bateu forte na Sainte Dévote já nos instantes finais da sessão que definiu as posições de largada da primeira corrida e, no rádio, queixou-se de muita dor na mão.

Ao contrário do que muitos falaram (fui ver também alguns dos emails que recebemos na época) virtude da luxação sofrida no pulso direito, o piloto não foi liberado para participar da corrida desta sexta-feira. Ele passou por um exame de imagens e foi examinado pelos “médicos da FIA” (de forma interessante não houve um nome de um médico assumindo o posicionamento sobre o veto) que não permitiram que ele corresse na sexta-feira, quando largaria em quarto lugar.

Porém, após uma segunda análise, a FIA achou por bem vetar, também, a participação do brasileiro na corrida deste sábado, informou a assessoria de Sette Câmara, em nota, na tarde desta sexta-feira. No sábado, segundo nota divulgada pela FIA, o piloto vários exames de imagem, sendo novamente avaliado na manhã de sábado e novamente vetado.

É perfeitamente compreensível a precaução médica para que um atleta não possa participar de uma competição – ainda mais com o nível de risco envolvido em um esporte como o automobilismo – mas esta preocupação deveria ser a mesma ou tão grande quanto, independente de quem fosse o piloto, ainda mais se ele corresse em uma categoria com carros ainda mais rápidos do que os Fórmula 2.

No ano passado esta mesma “comissão de médicos da FIA” aprovou e autorizou Robert Kubica a pilotar um carro de Fórmula 1 e não apenas em testes. Se a equipe Williams assim desejasse, o piloto polonês poderia ser o titular em um dos seus carros para a temporada de 2018, algo que – aparentemente – só não aconteceu por “razões comerciais”.

Acredito que a grande maioria dos meus estimados leitores se lembram ou pelo menos já leram sobre o terrível acidente sofrido por ele em 2011, todo o tratamento pelo qual passou e todas cirurgias as quais ele foi submetido para tentar voltar a pilotar de forma competitiva em qualquer categoria que fosse. E ele correu de turismo, protótipos e até de rally.

Segundo ele mesmo, Robert Kubica, existem limitações, particularmente para a pilotagem em rallies, sobretudo da capacidade de reagir ao imprevisto, de salvar uma situação. Principalmente na terra, onde isto não se aplica só a situações de emergência, mas por exemplo, quando estamos a guiar num rego e o carro subitamente salta do trilho. Digamos que na terra o raio operacional de uma curva é muito longo quando comparado com o de um circuito ou de um trecho de asfalto.

Para o polonês, em um circuito é mais fácil porque é tudo mais previsível. No contorno da grande maioria das curvas, gira-se menos o volante, os movimentos são mais sutis e suaves, e o raio de uma curva também é menor. Apesar disso, Kubica afirma ter noção das suas limitações e sabe que atingir os objetivos a que se propôs será muito mais difícil.  Estas palavras foram dadas a um jornalistas de seu país, Mikolaj Sokol.

Diante deste reconhecimento por parte do próprio piloto e da sua liberação para pilotar um Fórmula 1, não há como não questionar os critérios dos médicos da FIA em relação ao que seria realmente a condição de Sergio Sette Câmara ter pilotado com uma proteção no pulso machucado em Mônaco ou de Robert Kubica estar “apto a pilotar” um carro de fórmula 1.

Gostaria de entender a lógica, a coerência – se é que esta existe – destas decisões ou se existe um “critério diferenciado” de pesos e medidas nas análises deste corpo médico. Que seu retorno neste final de semana em Paul Ricard seja glorioso.

Um abraço e até a próxima,

Fernando Paiva