A bandeira preta de Neveu para o Brasil Print
Written by Administrator   
Wednesday, 04 December 2019 21:35

Caros Amigos, há cerca de um ano, no final de 2018, quando acontecia a etapa de encerramento da Porsche Endurance, recebi uma mensagem de texto de um dos nossos enviados ao autódromo com um – hoje talvez seja fácil falar – “aviso prévio” sobre a, agora sabida, realização ou não das 6 Horas de São Paulo, parte do Campeonato Mundial de Endurance, agendado para 1° de fevereiro de 2020.

 

Acredito que a maioria dos meus estimados leitores estejam familiarizados com o termo “rádio paddock”, como sendo aquela forma de notícias correrem por trás dos boxes com uma velocidade muitas vezes maior do que os carros passam pela reta em frente a estes. Logicamente, nem todas as ditas “notícias” se confirmam, algumas, inclusive, vindo a fazer parte do anedotário do esporte a motor naquela temporada e, as vezes, por anos.

 

Informação precisa ter credibilidade e quando recebi a mensagem, vendo de onde a mesma tinha partido, guardei-a comigo como algo que poderia vir a ser útil no futuro, mas torcendo enormemente para que ela não se concretizasse. Nosso enviado, em conversa “off record” com o piloto Lucas Di Grassi ouviu deste, que além de um piloto competente é um empresário sério e uma pessoa séria, não uma previsão, premonição ou agouro, mas um alerta que – como profissional que trabalha com mercados futuros como é o mundo dos investimentos – não poderia deixar de ser levada em conta. Ele alertou que um evento como o WEC, para vir ao Brasil, demandaria um investimento da ordem de 15 milhões de Euros e isso é um montante financeiro muito mais que considerável.

 

A empresa no Brasil que seria a responsável por promover o evento, a N/Duduch, de São Paulo, é uma empresa que tem uma grande expertise em promoções de eventos, feiras, cenografia e que foi a responsável pela festa de encerramento da etapa de 2014 das 6 Horas de São Paulo, última corrida realizada no país, na época promovida pelo nosso grande campeão nas pistas pelo mundo, Emerson Fittipaldi.

 

É impossível não questionar se uma empresa que nunca promoveu uma corrida de automóveis seria capaz de realizar um evento de alcance mundial como o campeonato de endurance, que tem o envolvimento de várias das maiores construtoras de automóveis do mundo, contudo, não cabe a mim nem a ninguém julgar isso ou não, mesmo porque, não se sabe quais as bases do contrato entre a empresa de Nicholas Duduch e a de Gérard Neveu. Entrando em um campo meramente especulativo, talvez o contrato entre as partes tivesse sido feito com um acordo de que a empresa brasileira cuidaria dos aspectos promocionais, enquanto a parte desportiva ficaria a cargo da empresa que promove a categoria. Teoricamente, cada um agindo dentro da sua especialidade e que em um “casamento”, poderá proporcionar o melhor para as duas partes.

 

Apesar desta linha de raciocínio apontar em uma direção sensata, deveria haver por parte do promotor local um trabalho que permitisse a N/Duduch não apenas honrar o compromisso financeiro com a categoria dirigida por Gérard Neveu, mas também auferir algum lucro. Afinal, ele e sua equipe de trabalho não estariam dedicando tempo e esforços em troca apenas de aplausos e agradecimentos. Profissionais de qualquer área devem ser remunerados!

 

É neste momento que precisamos analisar todo um contexto que gravita em torno de um evento da magnitude de um campeonato mundial de automobilismo, também da condição sócio econômica do local onde este evento irá se realizar e do envolvimento (ou não) do meio político em que este evento estará inserido, considerando a forma como há (ou não) envolvimento deste em eventos de natureza semelhantes. Sob o frio olhar analítico, nada no nosso país, mesmo em São Paulo, corrobora a favor de eventos desta natureza. Vide a Fórmula 1, que hoje tem um impasse financeiro para continuar na capital paulista e há bem pouco tempo, o mandatário do município desejava vender o autódromo, apesar de, no momento e por conveniência política, ter se tornado um defensor do mesmo e do evento maior neste sediado.

 

Quando a assessoria de imprensa do WEC divulgou uma nota oficial, no final de semana da realização da etapa se Shanghai onde informava que a etapa brasileira poderia ser cancelada ou substituída, ficou evidente de que alguma coisa entre as partes não estava acontecendo dentro do que havia sido acordado e contratado. Neste caso, a probabilidade mais palatável era a questão financeira, especialmente se levarmos em consideração o cenário econômico do país.

 

Considerando os valores mencionados por Lucas di Grassi (15 milhões de Euros), onde o promotor local conseguiria arrecadar este montante? A venda de ingressos é completamente insuficiente. Se fizermos uma contabilidade aproximada, com o valor médio do ingresso a 150 Euros e forem vendidos 30 mil ingressos de arquibancadas, isso geraria 4,5 milhões de Euros... mas em uma corrida sem as estrelas mundiais como Lewis Hamilton, Max Verstappen, Sebastian Vettel, etc. conseguiria levar este número de fãs, mesmo com o ingresso mais barato a 50 Euros? O ingresso mais barato em Le Mans é de 115 Euros, apenas como referência. 6 mil ingressos VIP a mil euros gerariam outros 6 milhões de Euros, com os HCs todos sendo vendidos, ainda haveria a necessidade de garantia de patrocinadores para que não apenas fosse possível honrar o compromisso assinado com a categoria, mas garantir o retorno ao promotor local.

 

O contrato entre a N/Duduch e o WEC era de seis anos e nenhuma das partes se pronunciou se esta não realização do evento este ano implicará em um cancelamento total do contrato ou se para a próxima temporada os brasileiros amantes do automobilismo podem sonhar com uma etapa do mundial de endurance no Brasil.

 

Infelizmente, por enquanto, o que temos é o desaparecimento das páginas da N/Duduch nas redes sociais, o website não é mais encontrado e uma bandeira preta está sendo acenada na linha de chagada.

 

Um abraço e até a próxima,

 

Fernando Paiva