Mil bandeiras verdes Print
Written by Administrator   
Wednesday, 10 April 2019 16:00

Caros Amigos, a sociedade humana tem o hábito (e peço aos meus estimados leitores que não assumam minhas palavras como uma crítica) “criar números lúdicos”. Aquelas comemorações em “anos cheios”, do tipo “uma década disso”, “meio século daquilo”, relacionadas a diversos fatos, datas, metas e outras tantas coisas.

 

Em breve estarei sendo impelidamente obrigado a escrever sobre uma dessas datas que clamo de “lúdicas” devido à passagem de 25 anos de um dado acontecimento e que o assunto será comentado – provavelmente – em todo o mundo e no Brasil em particular. Contudo, aos frios olhos da história, seria o caso de se considerar estas datas apenas mais um “aniversário” ou não?

 

Ao longo dos próximos dias, quando esta coluna estiver sendo lida pelas graças e facilidades da internet, a Fórmula 1 estará na China para o final de semana referente à milésima corrida oficial da categoria (vale lembrar que entre estes anos, desde Silverstone, em 1950, aconteceram algumas dezenas de corridas extra-oficiais, duas delas aqui no Brasil, em 1972 e 1974, além das vezes que – oficialmente – as 500 Milhas de Indianápolis fizeram parte do calendário da competição sem que um único carro deixasse a Europa em direção aos Estados Unidos).

 

Contudo, a data aí está e o vencedor desta corrida, bem como outros fatos relativos ao evento do final de semana em si, ficarão registrados de forma diferenciada na história e estatísticas da categoria, como foi, por exemplo, o registro da vitória de Nelson Piquet no Grande Prêmio da Austrália de 1990, quando a categoria ainda corria nas ruas da cidade de Adelaide.

 

Desde que foi dada a largada para a primeira corrida, em 13 de maio de 1950 até os dias de hoje a Fórmula 1 mudou muito. Passou de um final de semana onde um grupo de homens se reunia com suas máquinas, onde equipes – algumas de grandes montadoras na época, como a Alfa Romeo – apresentavam seus carros e a estrutura que era disponível e compatível na época, para um espetacular e bilionário negócio que envolve potências mundiais do meio automotivo com a Mercedes Benz, a Honda, a Renault e as pertencentes ao grupo Fiat, Ferrari e Alfa Romeo a investir anualmente verdadeiras fortunas com o intuito de não apenas competir pelas glorias da vitória, mas também de se mostrar “a melhor das marcas entre elas”.

 

Fala-se no meio do automobilismo que a competição entre automóveis começou quando construíram o segundo carro movido à motor de combustão interna e o mesmo foi vendido. Ao encontrarem-se, os proprietários dos veículos quiseram mostrar um para o outro quão mais rápido e melhor era o seu carro. Assim desencadeou-se todo o processo que vivemos pelas quatro cantos do mundo. Um mundo que mudou muito e que está mudando cada vez mais e cada vez mais rápido como foram se tornando os carros da Fórmula 1.

 

Nestas mudanças há um fato que vi se repetir em alguns comentários o qual gostaria de compartilhar com os meus estimados leitores: se o mundo mudou tanto ao longo destes quase 70 anos e o balanço de forças políticas, sociais e econômicas sofreram tantas transformações, até onde vale a pena questionar de a China, a florescente e gigante economia do século XXI, seria ou não um “palco digno” para que se ocorresse esta “emblemática” milésima corrida oficial?

 

Não me recordava (e até fui buscar algum embasamento antes de escrever) sobre se houve algum tipo de “contestação” quando foi disputado o Grande Prêmio de número 500, em Adelaide, na Austrália, um país onde – apesar de ter tido um campeão mundial até então, Alan Jones – não era por assim dizer, nenhuma potência do automobilismo, ficando atrás da sua vizinha de continente, a Nova Zelândia, que também teve um piloto campeão do mundo (Denny Hulme), um grande construtor de carros (Bruce McLaren) e um grande desafortunado em se tratando de resultados (Chris Amon).

 

Li muito e ouvi muito sobre a questão de se levar a corrida de número emblemático para um palco igualmente emblemático como a própria pista de Silverstone, onde tudo começou em 1950, mas até onde deveria se considerar tal mudança de local, inclusive se levando em conta a data e o risco de haver uma prova em condições adversas como aconteceu na “corrida dos campeões” de 1973, disputada em abril naquele autódromo onde chegou nevar durante a prova?

 

A história é importantíssima para construção de qualquer sociedade, mas precisamos estar abertos a escrevermos novas páginas desta história, com novos palcos, novos personagens e novos fatos. Talvez, quem sabe, quando se comemorar o Grande Prêmio 1500, a corrida não estará acontecendo em um destes palcos tradicionais que estão servindo à categoria desde 1950, ou mesmo em algum lugar inusitado, onde não sejamos hoje capazes de imaginar onde seria este local como, certamente, ninguém no meio do esporte a motor, imaginaria que a China se tornaria o palco deste evento e a potência econômica que se tornou? Arrisco-me, inclusive, a aventar a possibilidade de que, neste dia, possamos ter um carro com construção chinesa ou de outro país que hoje sequer imaginamos, à frente do grid?

 

Vivamos o momento e celebremos o Grande Prêmio de número 1000 da Fórmula 1. Que seja uma grande corrida e que fique – para além da história e das estatísticas – em nossas mentes por muito tempo.

 

Um abraço e até a próxima,

 

Fernando Paiva