A ampulheta de Fernando Print
Written by Administrator   
Sunday, 11 August 2013 13:41

Olá fãs do automobilismo,

 

Pelo que temos visto na televisão, este ano o calor não está tão forte no verão europeu. 33 graus em Atenas, se compararmos com anos anteriores, é bem ameno... assim como os 31 graus de Roma. Temperatura anda alta mesmo é em Maranello, com todo o clima pesado visto dentro e fora das instalações da Ferrari.

 

Talvez este tenha sido o motivo que trouxe Fernando novamente ao meu consultório. O menino de Oviedo anda angustiado e, conhecendo bem a sua natureza, entendo perfeitamente o motivo de tanto sofrimento interno... a ponto de, depois de anos administrando bem as crises na equipe – sempre internamente – este ano alguma coisa acabou ‘vazando para fora da redoma’. Algum problema? Claro que não! Fernando é um ser humano como qualquer ser humano o é.

 

A grande maioria dos atletas de alto rendimento que estão nas principais posições do ranking de seus respectivos esportes foram, via de regra, formados e preparados para vencer... e vencer sempre! Quando isso não acontece e  este “insucesso” (sim, porque não vencer para estes atletas é visto como um insucesso) é fruto de um fator que ele julga ter sido independente de sua performance, as reações contra o que provocou o “insucesso” não costumam ser amenas ou afáveis, especialmente se estes fatores começam a se tornar repetitivos.

 

Quando Fernando foi para a Ferrari, certamente o sonho de repetir a situação de domínio que ele pode assistir no início de sua carreira, estabelecida pela equipe italiana com Michael Schumacher ao volante era algo a ser feito e, na mente de Fernando, possivelmente exequível. Contudo, entrando pela quarta temporada, sem nenhum título alcançado e vendo a distância aumentar mais e mais a cada corrida de 2013, o sangue latino de Fernando aflorou.

 

 

Em um país que não tinha tradição no automobilismo de pista, Fernando Alonso conseguiu ser vice campeão mundial de kart. 

 

Desde a infância Fernando parecia destinado a vencer... e, se não o fosse, faria por onde mudar esta realidade. Afinal, a Espanha até então não tinha um nome sequer no hall dos grandes competidores – campeões ou não – da Fórmula 1. A grande expressão do país, sobre rodas, era Carlos Sainz, o grande campeão de Rallies e que por anos a fio foi o maior vencedor nos campeonatos mundiais, até surgir o fenômeno  Sebastien Loeb.

 

Só que, ao invés das trilhas de pedra, terra, barro, asfalto ou neve, Fernando seguiria outro caminho, a começar do kart com o firme propósito de tomar o rumo dos monopostos, onde tantos outros espanhóis tentaram e não tiveram sucesso. E no kart já deu provas de que ele era um piloto diferenciado. Sagrou-se vice campeão mundial (como um dia Ayrton Senna o foi)!

 

Apoio não faltou para que sua carreira crescesse. Com as benesses da União Européia, Fernando colheu os frutos dos melhores anos do país e do crescimento das empresas locais, que apoiaram firmemente deu progresso nas categorias de base, tanto na Euro Series, onde foi campeão, quanto na Fórmula 3000, um estágio obrigatório antes de, precocemente, aos 19 anos, sentar em um carro de Fórmula 1.

 

 

Na Euro Series, com uma equipe espanhola - a Campos Racing - conquistou o título esmagando a concorrência. 

 

Está certo que não era um “carro de Fórmula 1”, era uma Minardi do insistente Giancarlo Minardi, que já tivera dias melhores, mas que àquela altura, já era uma das piores equipes do grid.

 

Mesmo com o orçamento pequeno e que sacrificava o seu companheiro de equipe – o brasileiro Tarso Marques – nas provas em que o carro aguentou chegar à bandeira quadriculada, até que o quase adolescente conseguiu impressionar alguns dos chefes de equipe e empresários ladinos, como Flavio Briatore, o um dia homem forte da Benetton nas pistas, que já tinha ligação estreita com a Renault.

 

Foi o suficiente para que Fernando conseguisse um lugar, mesmo que como piloto de testes, na equipe francesa. Como naquela época havia testes e os pilotos de teste iam pra pista, foi um bom negócio para Fernando e para a equipe. No ano seguinte, em 2003, Fernando já era titular, ao lado de Jarno Trulli, um piloto rápido e mais experiente que Tarso Marques, mas que também era protegido de Flavio Briatore.

 

 

Desde cedo (acima na F 3000) Fernando Alonso contava com forte apoio das empresas espanholas para construir a carreira. 

 

Não levou mais que um ano e  meio para Fernando se impor dentro da equipe, conquistar sua primeira vitória e tornar-se o parceiro ideal de Briatore e primeiro piloto da equipe. Assim, em 2005, com as mudanças das regras de pneus que beneficiaram a Michelin e  prejudicaram a Bridgestone – fornecedora da Ferrari – a balança pendeu para os adversários de Michael Schumacher e a Fórmula 1 teria um novo campeão... mas quem?

 

Fernando conseguiu se impor aos adversários diretos, especialmente Kimi Raikkonen, que corria pela McLaren, e conquistou seu primeiro campeonato. Era um sonho que se tornava real, mas ainda faltava algo. Faltava derrotar o maior dos adversários: Michael Schumacher! E isso aconteceu no ano seguinte, com os pneus melhores, a Ferrari conseguiu equilibrar as disputas e o duelo contra o super campeão alemão durou toda a temporada... com Fernando conquistando o bicampeonato, mesmo estando de contrato assinado para competir por outra equipe: a McLaren!

 

 

Começar na Fórmula 1 ao volante de uma Minardi não era grande coisa... mas aos 19 anos, foi o que deu para arrumar. 

 

Ao longo de sua carreira, Fernando conseguiu se impor aos seus concorrentes e companheiros de equipe com sua personalidade e com a força de sua retaguarda financeira. Contudo, na McLaren iria encontrar um ‘filho da casa’ dentro dos boxes. Um novato que tinha a mesma sede de vitória que ele, que era – talvez – tão bom e tão rápido quanto ele e que, definitivamente, não estava em seus planos dividir atenções dentro do time que ele julgava ser capaz de dar-lhe um reinado hegemônico. Afinal, foi ali que um de seus ídolos – Ayrton Senna – construiu grande parte do seu legado.

 

E assim deu-se a guerra! A equipe dividiu-se entre o bicampeão que devolveria a equipe a condição de hegemônica na Fórmula 1, e um novato com um potencial de gênio, que poderia escrever uma página ímpar na história não apenas do time, bem como da própria categoria. Não foi preciso meia temporada para o clima dentro dos boxes ficar insuportável! A disputa pendeu para o ‘filho da casa’ e Fernando, que tinha três anos de contrato, estava iminentemente sem time para correr no ano seguinte, mesmo contando com um enorme patrocinador e todo o seu currículo, sem falar na pressão da mídia espanhola que parecia ter encarnado a famosa “fúria” da seleção de futebol.

 

 

Como piloto de testes da Renault, além de ir para a pista, fazia apresentações, como em Moscou, no ano de 2002. 

 

Fernando deixou de ser tricampeão, tendo que correr contra o próprio time, perdendo o campeonato por um mísero ponto. Teve que sair da equipe e retornar para uma Renault que nem de longe tinha a competitividade que ele precisava para lutar pelo terceiro título. Ali amargou um verdadeiro purgatório de dois anos até conseguir retornar para uma equipe capaz de dar-lhe a chance de ser campeão novamente: a Ferrari.

 

O problema é que, novamente, parecia que ele teria que lidar com um ‘filho da casa’. Afinal, Felipe Massa tinha uma ligação com a Ferrari desde 2001. Fernando não poderia cometer o mesmo erro de 2007 e deixar de se impor desde o início. Assim, logo colocou, não apenas contratualmente, mas em termos práticos, a lei que vigoraria dentro da equipe, assim como fez Michael Schumacher.

 

 

Conquistando seu espaço e se impondo na equipe, em 2005 e 2006 sagrou-se bicampeão mundial, derrotando Schumacher. 

 

Se na McLaren, Ayrton Senna era a referência, na Ferrari, Michael Schumacher era o exemplo de como fazer as coisas funcionarem. O problema é que a equipe não era mais a mesma. Quando o alemão estava lá, a Ferrari tinha uma estrutura de comando e gerenciamento não italiana, que foi sendo desmontada mesmo antes de Michael Schumacher deixar a equipe, em 2006.

 

Fernando encontrou uma equipe “mais italiana”, como um dia foi o time e que oscilava entre grandes temporadas e vexames sem par. Uma equipe onde o coração costumava falar mais alto que a razão e este “método de fazer corridas” deixou de ter lugar no automobilismo há um bom tempo.

 

 

Em 2007, a ida para McLarem trouxe mais problemas que alegrias. Acima, em Mônaco, foi onde o clima 'azedou' de vez. 

 

Ainda assim, em seu ano de estreia, Fernando fez a equipe chegar bem perto do título. Venceu corridas improváveis. Contou com aquela famosa “sorte de campeão” em momentos cruciais e ainda teve a seu favor, as clausulas contratuais que ficaram expostas com o famoso “Felipe, Fernando is faster than you”. Contudo, a equipe errou!

 

Na última prova do ano, com uma confortável vantagem contra os dois pilotos da Red Bull, bastava a Fernando um quarto lugar, independente de quem vencesse a prova, para conquistar o tricampeonato. Os pilotos da Red Bull estavam, pelo menos em seus comunicados, ‘livres para brigar pelo título’. Após uma decisão estratégica errada dos boxes, Fernando se viu preso atrás de Vitaly Petrov... e amargou um 7º lugar. Ao final da prova, a expressão de desânimo em seu rosto falava mais que qualquer palavra.

 

 

Em seu primeiro ano de Ferrari, o título escorreu pelos dedos após um erro de estratégia do time. A imagem vale mais que 1000 palavras. 

 

Foi a melhor chance que Fernando teve para ser campeão na Ferrari. em 2011, a Red Bull foi dominadora. Sebastian Vettel foi dominador e não houve adversários, em qualquer equipe, capaz de derrotá-lo. Em 2012 houve uma nova chance, com a famosa “sorte de campeão” voltando a sorrir novamente para Fernando, mas a Red Bull e Sebastian Vettel conseguiram reverter o jogo na segunda metade do campeonato e frustrar mais uma vez a almejada conquista. Havia um tricampeão... e não era Fernando.

 

A temporada de 2013 ainda está na metade e, no momento, Fernando está na condição em que Sebastian estava no ano passado... com uma diferença: a Ferrari parece perdida na busca por encontrar a competitividade perdida do F-138, que não vence desde o GP da Espanha e que, a cada corrida, parece ficar mais longe do pódio.

 

Aos 32 anos de idade e com contrato assinado com a equipe italiana até 2016, Fernando está em conflito: teria apostado todas as fichas, mais uma vez, no projeto errado? Não conseguiu achar a “equipe perfeita” para estabelecer um “reinado”. Não conseguiu vencer outro campeonato desde que deixou a Renault em 2006... e o tempo está passando.

 

 

No meio da quarta temporada e sem ver muitas perspectivas, mais uma vez, Fernando desabafou. Será que ele sai da Ferrari? 

 

Quem tem o direito de criticá-lo por seu empresário ter buscado a Red Bull, que vai ter um cockpit livre ao final da temporada? Se a Ferrari não é capaz de dar a Fernando o que ele tanto quer e se ele não consegue fazer a Ferrari trabalhar da forma que ele gostaria, qual o problema em se querer mudar?

 

Pelo prisma sócio-psicológico, seria um cenário interessantíssimo ver alguém com a personalidade de Fernando, buscando espaço numa  equipe com a rígida estrutura saxônica da Red Bull... e mais ainda com os prováveis embates entre ele e o ‘consultor’ Helmut Marko, que não teria um resiliente Mark Webber para criticar, mas sim um explosivo latino de sangue quente a enfrentar, com as mesmas armas – ao menos em teoria – mais um “filho da casa”, como Sebastian Vettel.

 

 

Como todo ídolo, Fernando provoca reações a favor e contra si. Independente disso, para quem ama a F1, melhor vê-lo sorrir! 

 

Independente do que vai acontecer ao final destas férias de elevadas temperaturas nos bastidores da categoria, lembre-se Fernando: você ainda tem muitos capítulos a escrever em sua história como piloto, seja em que equipe for. Daqui há dez anos, quando as pessoas falarem sobre você, a palavra ‘vencedor’ sempre acompanhará seu nome... e vencedores nunca desistem sem lutar!

 

Beijos do meu divã,

 

Catarina Soares

  

 

 

Last Updated ( Sunday, 11 August 2013 17:29 )