Lewis: O céu é o limite Print
Written by Administrator   
Tuesday, 13 November 2018 10:35

Olá fãs do automobilismo?

 

No início das férias da Fórmula 1 este ano, uma época de agenda cheia e material farto para a minha coluna no site dos Nobres do Grid, preferi deixar os pacientes do Divã um pouco de lado para fazer uma avaliação psico emocional sobre os dois candidatos diretos ao título deste ano.

 

Na coluna, fiz um perfil comparativo do estado emocional e de como estava trabalhando com as situações e reações de Lewis e Sebastian. Estava bem claro que Lewis estava em vantagem e não estou falando da pontuação após o GP da Hungria. Apesar da vitória em Spa-Francorchamps, o abandono de forma terrível como foi em Hockenheim, a “corrida de casa”, aquilo mexeu com ele de uma maneira impactante.

 

Todos nós estamos sujeitos a abalos emocionais, a variações de humor e isso afeta o comportamento em qualquer sentido e o profissional é algo que pode ser abalado e foi o que já aconteceu com Lewis em um passado bem recente. A relação dele dentro da equipe enquanto seu companheiro de equipe era Nico Rosberg nem sempre foi simples e eu melhor que todos – talvez – tenha vivido isso muito de perto, como terapeuta de ambos.

 

Antes de ir para o Brasil, na semana que se seguiu ao Grande Prêmio do México, depois de conquistar o pentacampeonato mundial, Lewis tinha sessão marcada comigo para a quinta-feira à tarde. Como bom britânico, ele sempre foi pontual e lá estava, com todas as suas tatuagens e adereços e um sorriso leve de quem estava andando nas nuvens. O sorriso estava mais fácil e mais tranquilo como em poucas vezes vi.

 

Cumprimentei-o com um “boa tarde, campeão”! Ele deu uma bela risada e disse que em todos aqueles anos juntos eu nunca tinha dispensado este tratamento para ele, mesmo nos outros títulos conquistados anteriormente quando ele já era um campeão do mundo. A verdade é que este ano foi diferente, não só pela não presença de Nico Rosberg, algo que já veio do ano passado.

 

A relação entre Lewis Hamilton e Totó Wolff mudou desde 2016. Agora, a harmonia e cumplicidade são totais.

 

Um dos reflexos desta mudança ficou explícita na forma como Lewis e Toto Wolff se aproximaram, uma relação pouco comum entre um britânico e um austríaco há tanto tempo inserido na cultura alemã. É uma cumplicidade que, por exemplo, não se vê com o Valtteri e que ambos não tinham quando Rosberg estava na equipe. Definitivamente foi uma mudança extremamente positiva.

 

Mas uma grande parte desta nova atmosfera dentro da equipe Mercedes e entre Toto Wolff não é apenas fruto das mudanças dentro da equipe (a surpreendente e precoce aposentadoria de Nico Rosberg após a conquista do título mundial de 2016) ou do trabalho de fortalecimento psicológico que começamos quando ele ainda era piloto da McLaren. O trabalho que Angela Cullen tem feito, não apenas como fisioterapeuta, mas como amiga, assistente, antepara de proteção e anjo da guarda.

 

Por mais proximidade e contato que um terapeuta possa ter com seu paciente, ele não está – fisicamente – presente na maior parte do tempo, apesar de que, nos dias de hoje, com as facilidades de comunicação, o mundo ficou pequeno como um ‘marble’ destes que se acumula nas laterais do trilho na pista. Ainda assim, a presença física o olhar no olho, o falar no ouvido é de uma importância fundamental e a Angela e eu nos falamos por telefone pelo menos três vezes por semana. Nos ajudamos e ela me ajuda muito.

 

Se por trás de um bom trabalho psicológico pode estar o sucesso, o acompanhamento e confiança no dia a dia também é.

 

Foi com a providencial ajuda dela que Lewis mudou algumas coisas importantes na sua vida. Durante os anos com Rosberg na equipe eu achei que, em determinados momentos, Lewis “fugia” da realidade e vinha para os Estados Unidos para o meio no qual foi introduzido pela ex-namorada, Nicole, no show biz, onde ele se aproximou do mundo dos MCs e Rappers. As vezes ele parecia estar “desligado demais”. O pior momento, no meu entender, foi depois da conquista do título de 2015, quando ele massacrou Nico psicologicamente.

 

Depois do título conquistado, ele simplesmente “desligou” e com os problemas que teve no início do ano em 2016, viu Nico vencer 7 corridas em sequência, fazendo-o se sentir confiante. Isso tirou Lewis do sério e o que vimos foi o acidente no GP da Espanha. Depois disso, ele estava se sentindo tão poderoso que, quando venceu seis das sete corridas seguintes, subjulgou Nico, achando que ele não se levantaria e “relaxou” novamente. O resultado todos vimos.

 

Durante os anos com Rosberg, dificuldades de convívio, provocações e instabilidades emocionais.

 

Sem a sombra do rival alemão, depois de aprender a lição mais dura da forma mais dura, Lewis deu uma guinada na vida. Procurou buscar o equilíbrio entre as coisas que gostava de fazer e as coisas que precisava fazer. O que vimos neste ano foi o resultado deste processo de evolução pessoal do qual eu e a Angela fizemos parte, mas sem a fundamental compreensão e comprometimento por parte de Lewis, nada seria possível.

 

Perguntei para ele quando ele recebeu a bandeirada e conquistou o título, numa corrida particularmente complicada como foi aquela no México onde os carros da Mercedes não se entenderam com os pneus, se o que ele viveu ali, naquele instante, como o havia tocado (eu lembrei da corrida quando o Schumacher igualou o número de vitórias do Ayrton Senna e chorou como criança durante a coletiva de imprensa)? Mas a reação dele foi de celebração, de dividir com todos na equipe a conquista do título, de sorrir e não de chorar, algo que podemos traduzir como uma forma de celebração pessoal.

 

Não é apenas fisicamente que Lewis deixou de se parecer com aquele garoto que estreou na McLaren em 2007.

 

Definitivamente Lewis está mais maduro. Muito mais maduro. Em nada lembra aquele menino prodígio que chegou à Fórmula 1 e, de cara, desafiou o então bicampeão da categoria, Fernando Alonso, ao ponto de tornar o convívio entre eles insustentável na equipe e provocarem, juntos, a perda do título para Kimi Raikkonen e a Ferrari. Se um dia eles mal se olhavam, hoje se tratam cordial e profissionalmente, reconhecendo as capacidades e habilidades um do outro.

 

Até a relação com o pai, que foi seu empresário no início da carreira mudou. Eles que chegaram a ficar estremecidos nos últimos anos de McLaren e início na Mercedes hoje tem uma relação de pai e filho e há uma harmonia familiar, incluindo a mãe e o irmão. É a união de todos estes fatores que podem levar Lewis para o platamar onde chegou Michael Schumacher.

 

A frase “o céu é o limite” nunca fez tanto sentido.

 

De bem com a vida, Lewis é capaz de protagonizar cenas como essa: de se jogar nos braços dos fãs.

 

Beijos do meu Divã,

 

Catarina Soares