Fernando e sua corrida contra o tempo Print
Written by Administrator   
Monday, 23 March 2015 21:00

Olá fãs do automobilismo,

 

Estou começando a pensar que talvez algumas companhias aéreas vão ter que começar a pensar em ajustar as suas malhas aéreas e tornar San Diego como ponto de conexão para viagens entre os Estados Unidos e o oriente no lugar de Los Angeles.

 

Brincadeiras à parte, muitos de meus pacientes tem feito “rota regular” entre os continentes asiático e americano. Mesmo aqueles que estão na Europa e que teriam um voo mais curto para a Ásia ou a Oceania voando na direção oposta, tem feito o voo passando por aqui. Bom, o desvio por Cuiabá era mais longo, então acho que eles – meus pacientes – não estão achando ruim.

 

Quando você, querido leitor, estiver lendo a minha coluna – assim como foi na quinzena passada – o meu paciente já deverá ter retornado à sua rotina de trabalho, caso tudo tenha dado certo, logicamente. Contudo, confesso a vocês que fiquei apreensiva depois da consulta.

 

Fernando chegou no meu consultório era cerca das 10 da manhã. Seu empresário, Luis-Garcia Abad, perguntou se era possível reservar o restante da manhã para ele. Por sorte o Nico aceitou meu convite para o almoço e pude fazer um novo arranjo nas consultas da tarde.

 

Fernando não está nada confortável com a situação atual da McLaren...

 

As vezes, quando seu paciente se trata de uma figura pública e de grande exposição na mídia, acabamos por acompanhar parte de sua vida pela imprensa e algumas coisas que lemos, vimos ou ouvimos acabam por apontar questões que ou não foram bem tratadas nas consultas, ou simplesmente sofreram um desvio de comportamento.

 

Fernando chegou no consultório bem tranquilo... tranquilo até demais se levarmos em conta tudo o que ele vem passando desde 2013 quando a sua ansiedade em relação às perspectivas de sucesso da carreira como piloto acabou por provocar a deterioração da sua relação dentro da Ferrari.

 

Ele deitou-se no divã e ficou um bom tempo em silêncio... achei até que ele tinha adormecido depois de um longo tempo com os olhos fechados, mas logo ele começou a falar... falou sobre os dias que passou em casa, sobre a falta que sentia de quando nevava mais intensamente no inverno e que ele adorava brincar na neve... foi estranho!

 

Por mais que falem, não há uma explicação que faça os torcedores absorverem o impacto dos resultados.

 

Perguntei se ele tinha ido esquiar em algum lugar este ano, mas ele disse que não, que esteve mais concentrado em trabalhar junto à nova equipe e buscar soluções para os problemas que o McLaren MP30 tem apresentado e que eles todos estão tendo muito trabalho para procurar um meio de extrair mais potência da unidade de força sem que a mesma tenha problemas, como aconteceu tantas vezes nos testes de Jerez e Barcelona.

 

Disse-lhe que senti sua falta no grid em Albert Park e ele logo falou que também gostaria de ter estado lá, mas que só não foi por conta de uma proibição da FIA, preocupada com os efeitos do acidente sofrido em Barcelona no mês passado. Ele disse que estava bem, que podia correr sem problemas, mas acharam melhor não.

 

Fernando falou que a FIA anda muito rigorosa com relação às questões médicas. Sempre o foi, mas depois do acidente com Jules Bianchi, eles não querem mais correr riscos sob nenhuma hipótese.

 

O carro simplesmente não anda! A unidade de força não aguenta trabalhar em regime máximo.

 

Por conta disso, Fernando precisou submeter-se a exames de reflexo, sendo avaliado por três médicos na Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Este teste é um pré-requisito da FIA, um procedimento obrigatório para avaliar se ele estaria ou não em condições físicas de voltar a pilotar um carro de F1 depois da concussão sofrida no acidente e que o deixou hospitalizado por três dias.

 

Fernando passou nos testes sem problemas, tendo inclusive feito antes deste exame, um período de treino no simulador do carro na sede da McLaren. Contudo, ainda terá que passar por um novo exame com o médico-chefe da FIA em Sepang e apenas depois deste exame, caso aprovado, é que Fernando poderá ir para a pista na sexta-feira.

 

Em momento algum Fernando fez menção ao possível choque elétrico que teria tomado dentro do carro, segundos antes de bater no muro interno daquela curva em Barcelona. Muito já se falou e se publicou, inclusive sobre uma possível perda de memória, dele ter falado italiano, de achar que ainda era piloto de kart. Ao menos aqui no consultório, ele não mencionou nada sobre isso.

 

O pior é ter que, todos os dias, ir para a frente dos jornalistas e tentar explicar o inexplicável!

 

Senti meu paciente tranquilo com relação aos exames médicos. Contudo, em um dado momento Fernando mudou de atitude e falou abertamente sobre a situação que vive em termos de perspectivas futuras. Confessou ter ficado frustrado com o resultado prático dos testes pré-temporada na Espanha e acha que terá muito trabalho para conseguir deixar o carro da McLaren competitivo... para 2016! Em suas palavras, este ano está perdido em termos de competição.

 

Perguntei se ele assistiu a corrida da Austrália pela televisão e ele disse que sim. Que ver os carros da equipe ocupando a última fila do grid foi decepcionante e ainda ‘agradeceu’ o fato da Manor não ter treinado para a corrida. O vexame poderia ser ainda mais desastroso!

 

Ver Sebastian Vettel subir ao pódio e assistir de dentro dos boxes uma surpreendentemente rápida Ferrari nos testes pré-temporada e na corrida de abertura do campeonato também mexeu com a cabeça de Fernando. Temo que ele entre numa espiral negativa de que “esteja sempre indo para a equipe certa... no momento errado”.

 

Três dias no hospital, muitas perguntas, muitas suspeitas e muitas especulações...

 

Desde que conquistou seu bicampeonato, em 2006, Fernando optou – ainda no início daquela que seria a temporada do segundo título – mudar para a McLaren. Nesta mudança, encontrou com Lewis Hamilton... e todo mundo sabe como terminou aquele ano.

 

Fernando teve que voltar para a Renault, que já não estava com a força que tinha nos anos que o levou aos dois títulos. Amargou dois anos de vacas magras até conseguir ir para a Ferrari. Um sonho que tornou-se pesadelo com o passar dos anos e não conseguindo conquistar o título.

 

Mudar de rumo, trocar de equipe e continuar tentando conquistar um novo título não foi “uma opção”: foi “a única opção”. A forma como Fernando saiu da Ferrari só não foi pior do que a dispensa de Alain Prost em 1991, antes do final da temporada.

 

Dez anos depois do seu primeiro título, Fernando Alonso poderia dar adeus à F1 se continuar longe do título?

 

Mais do que se recuperar fisicamente e até neurologicamente, Fernando precisa se recuperar psicologicamente. Da sua capacidade e seu talento, ninguém tem dúvidas. Tanto que a Honda sempre o tratou como prioridade para o desenvolvimento da nova parceria com a McLaren.

 

A pergunta que só Fernando pode responder é: até onde irá sua paciência e o tom incisivo de suas cobranças irão perturbar o ambiente da equipe?

 

Beijos do meu Divã,

 

Catarina Soares