Como parar de perder autódromos? 3ª Parte - Dirigentes e Ex-Dirigentes Print
Written by Administrator   
Saturday, 30 July 2016 18:10

No intervalo de menos de uma década perdemos o Autódromo de Jacarepaguá (municipal), no Rio de Janeiro, o Autódromo de Brasília (estadual) foi semidestruído numa reforma que não se sabe onde vai parar e agora temos o Autódromo de Curitiba (privado), às portas do seu fechamento. O que pode ser feito, quem pode fazer algo e como isso poderia ocorrer para que paremos de perder autódromos no Brasil?

 

Carlos Col – Ex-Proprietário da VICAR.

O Brasil, apesar de sua história, de sua projeção internacional no automobilismo, nunca teve muitos autódromo e é profundamente lamentável estarmos perdendo alguns dos poucos que temos, e como foi o caso do autódromo do Rio de Janeiro e como está sendo anunciado em relação ao autódromo de Curitiba, de forma irreversível.

 

Em ambos os casos, tanto para o Rio de Janeiro como para Curitiba, não há um projeto de substituição, de construção de um outro autódromo. A incerteza de Brasília pasa pela esfera política, com discussões entre os órgãos do governo do Distrito Federal e não sabemos qual será o desfecho.

 

A solução para isso passa, necessariamente, pela mobilização da comunidade do automobilismo para gerar projetos novos pelo país, com autódromos multiuso e correr atrás, junto com quem vier a se interessar, para criar de meios que viabilizem a execução destes projetos. Uma coisa é certa: ficar apenas lamentando e esperando que algo surja por inércia, isso não vai acontecer.

 

É preciso que seja feito um trabalho, de forma coordenada, organizada, com a participação de todas as partes envolvidas para que sejam elaborados projetos viáveis, possíveis de serem executados, mas isso tem que começar já. Na verdade, isso já deveria ter se iniciado desde quando foi determinado que o autódromo do Rio de Janeiro iria desaparecer.

 

Carlos Montagner – Diretor de Provas da CBA/FIA.

Eu não sei dizer a quem nós que trabalhamos no automobilismo podemos recorrer. No caso dos autódromos públicos, são decisões políticas, muitas se não todas, tomadas sem nenhum critério técnico ou mesmo lógico, como se destruir um espaço esportivo para se instalar um outro espaço esportivo, caso de Jacarepaguá.

 

A situação atual do país praticamente inviabiliza o investimento em novos projetos. O autódromo de Curvelo, que deve ficar pronto este ano é uma exceção e temos um outro autódromo que é praticamente nosso, mesmo que do outro lado da fronteira, que é o de Rivera, no Uruguai.

 

Sem ser cético, mas realista, é muito difícil encontrarmos na iniciativa privada, alguém disposto a investir algumas dezenas de milhões de reais num autódromo e com a atual atmosfera política do país, com denúncias diárias de corrupção e propina, todo mundo vai achar que este dinheiro investido no autódromo veio de algum esquema desses.

 

Dos três autódromos que perdemos, o do Rio de Janeiro pode ser dito, entre aspas”, que foi por um motivo justo: construir o parque olímpico. O de Brasília, te toda uma coisa política por trás, com um valor a ser investido para trazer a Fórmula Indy e que a Indy não veio, a obra parou e se antes ainda dava pra fazer alguma coisa por lá, agora não dá mais.

 

O caso de Curitiba é diferente. Muito se fala de que vai fechar, não vai fechar, que vão fazer um condomínio, mas vão manter a pista, que não vão manter a pista, mas eu não acredito que se construírem algo lá a pista vai continuar. Essa é a realidade: cada vez mais, temos menos!

 

Chico Rosa – ex-administrador do Autódromo de Interlagos.

É uma situação complexa e de análises distintas. Temos os autódromos públicos, como é o caso de Interlagos e outros que de alguma forma ou de outra tem como despertar interesses em fazer outros eventos além dos eventos de automobilismo.

 

No caso de quem faz um autódromo particular, como é o de Curitiba, o de Tarumã, esse novo de Minas Gerais, quem faz um investimento deste tamanho precisa pelo menos não ter prejuízo e com isso tem que encontrar todos os meios para ganhar dinheiro, seja com eventos de automobilismo e motociclismo ou não.

 

Se formos ver o que se faz de esporte a motor de competição no Brasil, o volume de eventos, a quantidade de datas que eles ocupam é muito pouco para custear um autódromo. Então, é preciso usar de meios alternativos como os testes de montadoras, exposições de carros esporte ou carros antigos, track days e outros meios que ainda tenham alguma ligação com carros e motos.

 

Transformar o espaço ou projetar o espaço para que ele seja de múltiplo uso e com isso fazer com que o autódromo dê lucro como Interlagos tem dado com a sua ocupação. Contudo, não se pode deixar de ter como prioridade, como primeira atividade fim as competições. O autódromo antes de qualquer coisa tem que ser um autódromo.

 

Dione Rodrigues – Ex-Presidente da FADF.

A questão passa por com quem e com o que você está lidando. Se formos falar de administração, é preciso que quem está à frente do processo tenha idoneidade, tenha credibilidade e a Confederação Brasileira de Automobilismo não tem nenhuma das duas.

 

Se um órgão gestor de um esporte não tem força, como é o caso da CBA, não tem como se conseguir fazer com que as coisas aconteçam, ou não aconteçam. Se a confederação fosse forte, tivesse credibilidade, não teríamos perdido o autódromo de Jacarepaguá para fazerem lá o parque olímpico.

 

Quando tivermos uma Confederação Brasileira de Automobilismo com mais credibilidade, com uma gestão profissional, conseguiremos ter autódromos melhores, mais categorias disputando, mais espaço e opções para os pilotos, campeonatos regionais mais fortes, uma base maior para se formar pilotos para correr fora do Brasil.

 

Fortunato Guedes – Vice-Presidente do AIC.

Eu acho que o automobilismo está perdendo o prestigio no Brasil ano a ano, perdendo espaço, porque o grande motivador era e é a Fórmula 1. Há tempos não vemos mais um brasileiro vencendo na Fórmula 1 e nós nos acostumamos a ver isso com as vitórias dos nossos pilotos, especialmente com Ayrton Senna.

 

O automobilismo precisa se popularizar mais, atrair mais gente. É comum vermos eventos que acontecem no nosso autódromo feito apenas para um seleto grupo de convidados, com as arquibancadas sem público e o paddock repleto de gente poderosa... e ainda bem que ainda os temos, do contrário, nem isso. O único esporte de grandes públicos que ainda resiste no Brasil é o futebol.

 

Manter um autódromo, seja ele municipal, estadual ou privado é muito caro e é preciso que se façam eventos que dêem retorno financeiro, não apenas para quem os organiza, mas também para o autódromo e isso tem se tornado cada vez mais difícil. Um autódromo que hoje consegue empatar suas contas, receitas e despesas, está bem.

 

O automobilismo necessita de autódromos e estes necessitam ser rentáveis. Um autódromo não pode ser um sonho de um abnegado como o meu sócio, o grande ‘Peteco’ (Jauneval de Oms) que investiu neste sonho e que fez do autódromo de Curitiba o melhor autódromo do país. É preciso que se tenha meios de fazer os autódromos sobreviver e dar lucro aos seus donos.

 

Marco Túlio Ferreira Campos – Diretor da Tec Racing (Responsável pelo Autódromo dos Cristais em Curvelo-MG).

A primeira coisa que as pessoas precisam entender é que o investimento em um autódromo não é um investimento pequeno. Um autódromo simples requer um investimento de 30 a 40 milhões de reais e se formos analisar como negócio, buscando retorno de investimento, ninguém executa este tipo de projeto.

 

O Brasil não é o pais do esporte a motor, é o país do futebol e um dos grandes e, acredito ser, o principal fator para estarmos perdendo autódromos aqui no Brasil seja a falta de projeção dos esportes a motor no país. Veja o caso da Espanha, por exemplo: eles tem um futebol forte, tem os maiores times do mundo, mas também tem quatro ou cinco excelentes autódromos, categorias fortes de automobilismo e motociclismo que atraem pilotos de outros países para correr lá. Sem esporte a motor forte, fica muito difícil.

 

O que é um autódromo? É uma casa de shows. Se o show for bom, atrai público, enche a casa. É preciso ter eventos, ter movimento, ter ação. Ela precisa acontecer. Infelizmente temos um efeito dominó, com as categorias diminuindo, os autódromos vão ficando sem eventos e com a era pós-Senna, o automobilismo perdeu muito de sua visibilidade, de investimento e de participação do público.

 

O nosso projeto em Curvelo passa pela paixão, o desejo de se ter um autódromo aqui no estado e também passa por um planejamento estratégico capaz de garantir a viabilidade do empreendimento. São sete empreendimentos que juntos vão, com criatividade, vão permitir que tenhamos o retorno planejado. Até o momento estamos conseguindo cumprir este planejamento estratégico e o cronograma.

 

Paulo Gomes – Diretor de Marketing da CBA.

Vamos fazer a pergunta da forma justa. Vamos falar também dos autódromos que nós ganhamos. Tivemos a reforma de Cascavel, a reforma de Goiânia, tivemos o recapeamento da pista em Londrina, está sendo construído o autódromo dos Cristais em Minas Gerais... não é só perda. Também tivemos ganhos.

 

E quanto ao autódromo de Curitiba, eu duvido que ele acabe. A importância deste autódromo é muito grande para ele acabar e o que estão dizendo que está projetado para acontecer por lá eu não acredito que vá acontecer, mesmo porque o mercado de imóveis e a situação do país.

 

Lá em Brasília as coisas estão andando. Não ainda nas obras, mas estamos trabalhando, conversando e vamos chegar a uma retomada das obras e a conclusão do que foi começado para podermos ter corridas novamente por lá.

 

Rubens Gatti – Presidente da FPRA.

Na verdade, esta é uma questão de entendimento. É preciso que o autódromo seja visto como um centro de eventos, não apenas para corridas, mas para outros eventos que possam ser realizados neste espaço. O ganho se expande para a ocupação da rede hoteleira, o incremento do comércio, consumo nos restaurantes...

 

Logicamente existem alguns projetos que são bem sucedidos, outros nem tanto. Alguns projetos que estamos buscando viabilizar junto a grupos de investidores privados para que além do autódromo sejam montadas outras estruturas de funcionalidade e também de lazer para que seja possível a utilização do espaço durante todo o ano.

 

Sofia Costa – Administradora do Velopark.

É um tema bem complexo. Mas o caminho para se tentar solucionar este problema passa necessariamente pelo estabelecimento de parcerias para que o espaço autódromo possa ter a maior ocupação possível e assim viabilizar o funcionamento do autódromo.

 

Infelizmente um autódromo não consegue se manter apenas com as corridas e o público que ocupa as arquibancadas. É preciso agregar todo o tipo de evento paralelo possível de ser executado naquele espaço para elevar o nível de arrecadação. O investimento é alto. Um autódromo ocupa uma área grande e de um valor de metro quadrado alto por ser, geralmente, em um local valorizado. É preciso criar alternativas.

 

Não há outra forma de se buscar esta viabilização de um autódromo. A construção é apenas o investimento inicial e não é um investimento pequeno. Depois de construído, o autódromo precisa de manutenção e está também não é barata. A análise deste investimento não pode tem nenhuma ligação com o apelo emocional. É preciso ser visto como negócio.

 

Waldner Bernardo – Presidente da FPA.

Eu penso que nosso grande competidor é o mercado imobiliário. Se for feita uma análise do que aconteceu com todos estes autódromos citados, por trás de tudo está o mercado imobiliário. O Rio de Janeiro todos sabem o que vai acontecer com o parque olímpico depois das Olimpíadas. Em Curitiba todos sabem que o dono do autódromo tem um passivo que precisa cobrir e vai vender o autódromo por isso, para que seja feito um condomínio.

 

Os autódromos no Brasil, quando foram construídos, ocupavam áreas que não eram nobres. Veja o exemplo de Caruaru: era no meio do nada, longe de tudo, e hoje está sendo construído um Alfaville. É uma pressão muito forte porque o ganho imediato é muito grande e isso é um problema para os autódromos. Uma hora a cidade chega perto do autódromo.

 

Vou dar um número apenas como referência: o terreno de Curitiba seria negociado por cerca de 100 milhões. Quantos anos de utilização seriam necessários para se ter como retorno este mesmo montante? O dono do terreno não analisa o lado do esporte, ele analisa o lado financeiro. O retorno.

 

Maior que isso é o problema da falta de visão política, porque se você considerar que o maior evento em termos de retorno para a cidade de São Paulo é a F1 e que tudo é aprovado por unanimidade uma vez que para cada dólar investido retornam dois e sessenta, fica claro o que se consegue de receita com o automobilismo. O que falta é visão.

 

Falta de visão é um problema. Este ano Caruaru perdeu a F. Truck porque a prefeitura não quis investir 500 mil reais para custear a vinda da categoria. Acontece que a corrida era o segundo maior evento da cidade, perdendo apenas para o São João e gerava em um final de semana um retorno de 5 milhões de reais. O São João em Caruaru é uma festa que dura praticamente o mês inteiro e se formos fazer a conta de quanto se arrecada em 3 ou 4 dias, a F. Truck dá um retorno maior.

 

O poder público precisava abrir os olhos e entender que, percaptamente, o automobilismo dá mais retorno que o futebol. Outro problema é o rótulo de que automobilismo é esporte de rico, sem conseguir enxergar tudo que o esporte envolve, a geração de empregos e serviços diretos e indiretos, tanto os permanentes como os gerados nas cidades por onde o automobilismo passa. Prefeituras como Cascavel e Santa Cruz do Sul, que enxergaram a importância do seu autódromo e cuida deles como um bem gerador de benefícios, tem tido o retorno do seu investimento. Quando os outros políticos, de outras cidades, entenderem isso, teremos uma perspectiva melhor.


Last Updated ( Monday, 01 August 2016 19:49 )