Você construiria um autódromo? (2ª Parte - Promotores, diretores e narrador) Print
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Monday, 21 July 2014 21:37

Depois de vermos o autódromo do Rio de Janeiro destruído e dos rumores sobre a venda do terreno onde está o autódromo de Curitiba, que é um empreendimento privado, decidimos perguntar para diversas pessoas ligadas ao automobilismo se elas, tendo condições (um capital de 100 milhões de reais) e uma área própria de 1 milhão de metros quadrados investiriam em construir um autódromo (FIA 2 ou 3) ou optaria por investir este dinheiro em outra coisa e fazer uso desta área para outra atividade. O que será que eles disseram?

 

Dener Pires – Promotor da Porsche Cup.

Na minha ótica, a construção de um autódromo no Brasil partindo da iniciativa privada é algo que, como investimento, o retorno seria algo difícil para se ter um retorno financeiro. Eu confesso que nunca parei para pensar no assunto e fazer uma conta do que seria preciso e do quanto teria que ser investido, mas uma coisa eu tenho certeza: não seria fácil.

 

A construção de um autódromo implica em diversas coisas, como licenças ambientais e de construção, uma série enorme de normas de segurança e a questão não para na construção. Manter este autódromo dentro de tudo o que é exigido pelos órgãos que regulam o esporte, a CBA no Brasil e a FIA no mundo inteiro, tornam este projeto ainda mais complexo.

 

Quando a ótica é apenas a do apaixonado, onde o retorno financeiro teria um peso menor, talvez, eu até levaria uma ideia como esta adiante, mas ainda acho que investimentos como o de um autódromo ainda devam ser da iniciativa pública. O Brasil tem uma tradição na formação de bons pilotos, uma história internacional e eu penso que o investimento privado deveria ser mais voltado para a formação de novos valores, novos pilotos, incentivando promotores a criar novas categorias.

 

Com isso é possível termos um trabalho em conjunto: a iniciativa pública criando os espaços necessários para a prática do esporte, no caso, os autódromos. E a iniciativa privada investindo para o desenvolvimento do esporte, criando empregos, porque o automobilismo não é só feito de pilotos. Temos mecânicos, preparadores, engenheiros... diversos profissionais que estão envolvidos no esporte, direta e indiretamente.

 

Neusa Navarro Felix – Promotora da Fórmula Truck.

Se eu tivesse este capital para investir e tivesse pessoas competentes para gerenciar este autódromo eu construiria. O maior problema em um negócio deste porte, onde um investimento tão grande será feito é ter gente competente e honesta para gerenciá-lo.

 

Um autódromo tem que ter como prioridade o automobilismo, mas não dá pra sobreviver, arrecadar fundos, capaz de torná-lo economicamente viável e dar lucro. É preciso encontrar outros meios de manter o espaço ativo durante todo o ano. Ele tem que ser um investimento que seja incorporado pela cidade onde ele se instalar, fazer parte do dia a dia da comunidade, poder contar com a parceria das autoridades locais. Fazer um investimento de 100 milhões de reais é algo grande e ele teria que ser, pelo menos, autosuficiente.

 

Alguns anos atrás nós não construímos um autódromo em Santa Catarina, onde temos o terreno ao lado do parque do Beto Carrero, porque na época, o filho do Beto, o Alex, não quis construir. Mas eu tenho certeza que, se a gente tivesse construído teria dado certo e seria um projeto para ele tomar conta.

 

No dia que eu tiver uma pessoa que seja meu braço direito e que eu possa confiar, eu sou capaz de levar este projeto adiante construir um autódromo, mesmo isso não sendo uma vantagem para a Fórmula truck, uma vez que a categoria correria lá apenas uma vez por ano, eu não poderia correr lá mais do que isso por conta dos nossos compromissos com os patrocinadores.

 

O Brasil tem uma carência de autódromos e caso fizéssemos um autódromo, seria não apenas para atender a Fórmula Truck, mas também para atender as outras categorias. Seria importante ter as outras categorias correndo lá também. Caso contrário, não vai ser possível mantê-lo. Ele tem que ter atividades durante o ano todo. Nesta forma, eu acho que é algo viável se construir um autódromo.

 

Carlos Montagner – Diretor de Provas da CBA

Se eu tivesse 100 milhões de reais eu não construiria um autódromo. Caso eu tivesse dois bilhões de reais, dependendo do projeto, talvez eu investisse 100 milhões de reais na construção de um autódromo. Investir um valor tão alto requer que o investidor tenha uma gordura para queimar, ele não invista tudo o que tem em um projeto assim.

 

Com 100 milhões de reais é possível se construir um autódromo para atender uma demanda de calendários regionais e nacionais. Contudo, quem pensa em construir um autódromo vai pensar apenas nisso ou vai querer construir um autódromo com capacidade de receber categorias internacionais? Receber uma Fórmula 1? Neste caso 100 milhões de reais não serão suficientes.

 

Quando um investidor constrói um autódromo o que ele pensa como retorno de investimento? Se ele constrói um autódromo, investe 100 milhões, em quanto tempo ele vai querer ter o retorno deste capital? Um ano? Cinco anos? Isso não vai acontecer.

 

Talvez em 20 anos eu tivesse um retorno deste capital investido, desde que eu tivesse corridas a cada dois finais de semana por mês. Caso contrário, como seria possível não apenas ter o retorno do investimento, mas também ter como dar a manutenção que um autódromo exige?

 

Apesar de ser arquiteto, eu não me veria construindo um autódromo. Eu gosto de trabalhar em autódromo, de fazer o que eu faço. A gente conhece algum jogador de futebol que seja dono de um campo de futebol? Acho que não. Quem faz parte do esporte gosta de praticá-lo.

 

Thiago Marques – Promotor da Sprint Race

Jamais! Como vocês disseram, quem circula, convive, trabalha com os autódromos que temos aqui no Brasil e vê como as coisas são geridas, jamais teria coragem de investir em um negócio como um autódromo.

 

Um autódromo pode até vir a ser um bom negócio, desde que ele não seja apenas um local de corridas no final de semana. O autódromo precisa ser um local onde outras atividades possam acontecer. Ter uma pista de MotoCross no meio, por exemplo. Um kartódromo é quase mandatório. Ter um “half pipe”, atividades variadas que façam gerar lucro.

 

Partindo da concepção de um projeto integrado com outras atividades, que movimentem o espaço durante os períodos em que não houver corridas é possível que se tenha algum retorno financeiro deste capital investido, desde que seja um negócio bem administrado.

 

Eu já estive em diversos autódromos na Europa e pude ver diversos autódromos assim, com uma série de atividades ocorrendo dentro do espaço autódromo, inclusive com os autódromos servindo de parque de lazer das regiões onde eles estão localizados. Isso faz com que o autódromo seja um espaço da população daquela região, que ele seja visto como algo bom, benéfico pra eles, ao contrário de alguns aqui no Brasil, onde se faz protesto contra o barulho das corridas.

 

Eu acho que é possível se fazer algo bem feito e viável, que possa vir a ser bom financeiramente. Mas eu não faria. Com 100 milhões de reais no bolso eu não faria mais nada! Risos.

 

Maurício Slaviero – Diretor da VICAR, Promotora da Stock Car, Brasileiro de Marcas, de Turismo, da Fórmula 3 Brasil e do Mercedes Challenge.

Olha, se eu tivesse 100 milhões de reais na minha conta do banco talvez eu parasse de trabalhar, mas digamos que eu tivesse estas condições e decidisse partir para a construção de um autódromo. A primeira coisa que eu veria seriam as possibilidades de se fazer como o autódromo gerar rendimentos entre as corridas.

 

Muitas pessoas não sabem que um autódromo não tem como sobreviver apenas de corridas. Seria preciso fazer um estudo e ver que tipo de atividades seriam possíveis de ser desenvolvidas. Por exemplo, uma pista destinada a testes para as montadoras, espaço para convenções, espaço para shows... uma arena realmente multiuso com diversas possibilidades. Assim eu não tenho dúvida nenhuma de que ele será viável.

 

Um outro fator que tem que ser considerado é a localização. Não adianta querer fazer um autódromo a 50 Km de um grande centro. Tome por exemplo o autódromo de Paul Ricard, na França. É um autódromo super rentável, mesmo sem ter tantas corridas e nem é aberto ao público. O segredo é como você estrutura o projeto.

 

Galvão Bueno – Narrador da F1 pela Rede Globo

Esse é um assunto bem interessante e complicado. Estou envolvido com a Fórmula 1 há mais de 30 anos e nunca parei para pensar sobre isso. Nestes anos que andei pelo mundo, vi muito autódromo bom que não deu certo, assim como vi alguns que nem eram tão bons que sempre tiveram um lugar no coração da gente.

 

Eu tenho comigo o seguinte: tudo que é feito da maneira correta, tem tudo para dar certo. Eu nunca pensei em um dia ser dono de autódromo, mas se eu fosse, tem alguns exemplos que eu seguiria, assim como alguns exemplos eu evitaria porque vi dar errado.

 

Vou falar de Europa, porque a Europa é o berço do automobilismo. Existem na Europa centenas de autódromos e em praticamente todos eles existe atividades praticamente todos os dias. Tem testes de montadoras, tem abertura para você, se quiser entrar com seu carro e acelerar poder fazer isso. Em alguns você pode até alugar um carro esportivo para fazer isso. Eles sabem, de um modo geral, como fazer um autódromo dar retorno.

 

Não sei se este seria o destino para os meus 100 milhões. Provavelmente não. Acho que minha escolha seria continuar no ramo dos vinhos, dos cavalos, mas seria muito bom que pessoas investissem no automobilismo e tornasse o esporte algo mais interessante para o país.

 

 

Last Updated ( Thursday, 31 July 2014 02:23 )