Os Kamikases Print
Written by Administrator   
Monday, 02 May 2011 20:54

 

Esta palavra, que ficou conhecida em todo o mundo durante a II Guerra Mundial, era como eram chamados os pilotos japoneses que iam para o front dispostos a sacrificar a própria vida.

 

Diante de certas coisas que andamos vendo que andamos vendo nas nossas pistas, alguns pilotos – e alguns “pilotos” – podem, perfeitamente, incorporar o adjetivo às suas biografias. 

 

É impossivem não pensarmos sobre o que leva uma pessoa - seja profissional ou amadoristicamente - a buscar na prática de um esporte de tamanho risco, uma forma de vida, de se ter prazer na vida ou ambas. A pergunta é: quando é que que se ultrapassa o limite do bom senso e da prudência e se compromete a própria sobrevivência? 

 

É evidente que, quando recebemos a notícia da morte de um piloto, a primeira reação é o pesar... pelo piloto, seus familiares, seus companheiros de equipe e de pista. O segundo é o questionamento: porque? 

 

Fizeram, de algum tempo para cá, da curva do café o “Judas a ser malhado” e de Interlagos, sinônimo de insegurança! Será que o palco da F1 é mesmo uma “roleta russa” de 4.309 metros? “Overreaction”! A palavra em inglês talvez defina melhor como algumas pessoas tem tratado o assunto. É claro que não podemos ser negligentes ou ineptos visto tudo que aconteceu – especialmente em 2011 – mas há que se ter bom senso e tentar ver a questão de forma racional. 

 

 

 

 

Octavio Guazzelli, Cleiton Pinteiro, Ingo Hoffmann e Charles Whiting em Interlagos. E se a modificação da FIA não for eficiente? 

 

É muito "interessante" ver as pessoas criticando o diretor de provas da CBA, Sergio Berti, por ter falado que "os acidentes são necessários para que mudanças ocorram no automobilismo". Por mais duro que tenham sido as palavras, ele não falou nenhuma mentira. Alguém aqui já esqueceu da Tamburello? O pilotos achavam perigosa, muitos bateram forte ali... mas só mudaram a curva depois de uma morte!

 

O Sr. João Lisboa, fotógrafo de eventos motociclísticos, sofreu um grave acidente durante um “track day” quando contornava a curva do café. As imagens disponíveis na internet mostram a moto em chamas. O “piloto” foi atendido prontamente, sendo levado consciente para o hospital. Lá, durante uma cirurgia para reparar uma fratura no fêmur, o paciente, de 52 anos, teve uma parada cardíaca por conta de uma hemorragia. Reanimado, teve outras e não resistiu, vindo a falecer. 

 

 

João Lisboa, no exercício do seu ofício. Um acidente no momento da paixão, uma complicação cirúrgica e a indesejada fatalidade. 

 

Tirar fotografias e pilotar motos amadoristicamente é uma coisa... entrar em um autódromo e percorrer curvas a mais de 100 Km/h é diferente. Por mais que tenha-se a habilidade para conduzir de forma rápida e segura a motocicleta, o Sr. Lisboa estava participando de um “track day” em um autódromo... ele sabia dos riscos que estava expondo a si mesmo. O acidente foi grave? Sim, claro, mas ele saiu de Interlagos consciente, com fraturas e escoriações, evidentemente, mas consciente. A curva do café era contornada pelas motos em alta velocidade... o Sr. Lisboa era piloto? Piloto não faz “track day”. Corria em alguma categoria? Até onde sabemos, fazia fotos, não disputava campeonatos.  

 

Quantos motoboys morreram no selvagem trânsito paulistano no ano de 2010? Quem tiver a estatística, por favor envie para o site. Eu gostaria de saber. Aqui em BH também temos motoboys e, via de regra, eles andam mais rápido do que devem. Longe de mim comparar o fotógrafo com um dos velozes bailarinos dos nosso caótico tráfego... mas também há uma distancia considerável da posição por trás do guard rail com a câmera para o assento de uma máquina veloz. 

 

 

Os bravos e destemidos Kamikases juraram dar a vida pelo Japão. Não creio que seja este o caso dos nossos bravos pilotos. 

 

Pouco antes da etapa paulistana da Copa Porsche – uma categoria para abastados, que abriu sua temporada correndo no circuito do Estoril, em Portugal – teve nos dias de preparação uma presença ilustre: o nosso campeão olímpico e cavaleiro de altíssimo nível Rodrigo Pessoa... devidamente trajado com um macacão amarelo com detalhes em verde! 

 

Naquele dia o cavaleiro trocou o seu cavalo por outros 420, todos embutidos sob o capô de sua montaria germânica – um modelo 911 Carrera – disposto a dividir curvas e retas com outros 20 e tantos concorrentes em três etapas da temporada de 2011. 

 

Possivelmente nosso campeão olímpico em algum momento de sua vida fez algum curso de pilotagem... ou pelo menos um “track day” em algum circuito na Europa antes de pensar em trocar seus elegantes fraques e chapéu pelo macacão e pelo capacete... mas será isso o suficiente? Ele deu umas voltas ao lado de Flávio ‘Nonô’ Figueiredo – filho do ilustre Nobre do Grid, Carol Figueiredo – para conhecer melhor a sua “montaria”. 

 

 

Rodrigo Pessoa: 419 cavalos a mais para domar (e que - teoricamente - não saltam), pista dividida com outros e um relógio contra. 

 

Honestamente, será que Rodrigo Pessoa não está expondo a si mesmo e aos outros que já “rodam há algum tempo” com a cavalaria alemã? Não seria mais prudente começar com algo com menos cavalos, não tão rápido? Ele certamente saltaria com muito mais elegância a cerca sobre a qual Xandinho Negrão, toscamente, “voou e estatelou-se do outro lado” depois de “decolar no barranco de escape” da pista de Piracicaba. Não posso fechar os olhos a isso! 

 

E já que falamos em Xandinho – aproveitarei para falar sobre Bia Figueiredo também – será que não tem ninguém para dar um “sossega leão” (no caso da pilota, “leoa”) nessa moçada? Todo mundo sabe que piloto é “alucinado para correr”, não importa onde nem do que, mas o que ambos fizeram recentemente caberia uma atitude... nem que fosse dos pais! Ambos voltaram para dentro de seus carros após cirurgias sem a menor condição de desempenhar sua pilotagem com plenas condições.  

 

Xandinho mostrou que não tinha a menor condição de pilotar na etapa de abertura da StockCars em Curitiba. Não andou nos treinos livres (o que rendeu uma multa para a equipe, uma vez que Marcos Gomes fez o shakedown do carro 99), na classificação foi mais de 3s mais lento que o companheiro de equipe e alinhou para largar. Ao menos recolheu aos boxes na 2ª volta... mas e os riscos a que se expos?  

 

 

Xandinho Negrão foi liberado para correr em Curitiba... mas o que se viu no treino de classificação foi um piloto sem condições. 

 

Pior que isso foi o fato do mesmo ter sido liberado pelo médico da categoria, o experiente e renomado Dr. Dino Altimann. Será que Xandinho é tão bom “ator” que conseguiu dissimular as dores durante o exame a que foi submetido? Se foi isso, a dona dos direitos de transmissão pode aproveitá-lo em alguma novela. Será que o Dr. Dino Sofreu – e cedeu a – algum tipo de pressão para liberar o piloto? Com toda a vivência que ele tem no automobilismo é algo simplesmente impensável. Assim sendo, como é que o piloto foi para a pista? E se algo acontece? Quem seria o responsável? 

 

Com a Bia Figueiredo – que mostrou ser uma mulher de garra, mas nada prudente – a coisa pode ser considerada até mais grave, visto que o carro da Indy 'e bem mais rápido que o Stock de Xandinho. Depois de fraturar o pulso em St. Petersburg e colocar um pino em uma cirurgia, a própria equipe tratou de deixa-la de fora na prova seguinte – em Barber – mas uma semana depois da segunda corrida, Bia seguiu para Long Beach para alinhar no grid... visivelmente sem condições! 

 

Bia Figueiredo: Um "pino" np pulso, uns "parafusos a menos" na cabeça e um sofrível - e sofrido - desempenho em Long Beach. 

 

Andou mais lenta do que o travado circuito de rua obriga, sofreu com os “bumps”, que faziam o carro pular como um cavalo de rodeio e sofreu com dores todo o final de semana, comprometendo sua participação na corrida seguinte – em casa, em São Paulo. Que esta “forçada de barra” não venha a comprometer sua performance em Indianápolis, onde se anda a quase 400 Km por hora, onde as curvas tem um muro e a corrida dura mais de 3 horas. 

 

E o muro onde Gustavo Sondermann bateu será recuado... se a FIA deixar! Ingo Hoffmann e o Dir. Jurídico da CBA, Felippe Zeraik, seguiram para Paris a fim de apresentar o projeto da criação da área de escape na curva do café. E se a FIA dissesse não, como é que ficaria? E se o projeto que eles endossarem não atender as necessidades ou os anseios dos que correm nas categorias locais? O Charles Whiting veio ao Brasil e falou também sobre a entrada dos boxes... Se o projeto for considerado "ruim" para a nova associação dos pilotos, eles vão boicotar Interlagos?

 

 

A sequência do acidente de Gustavo Sondermann. A imagem do toque com Giromini "sumiu"... mas a culpa não foi dele.  

 

Como falei no início, não se pode por toda a culpa no muro. Será que algum dos leitores já ouviu falar no “Modelo de Gruyere” para descrever o que leva um acidente à acontecer? O modelo usa uma série de fatias de queijo... se em um dado momento os furos se alinham entre todas as fatias, temos a condição para que um acidente ocorra. 

 

 

O Modelo de Gruyere mostra, de uma forma didática, que um acidente para poder ocorrer, diversos fatores precisam estar lá.

 

Na investigação da CBA, o relatório citou o toque sofrido por Sondermann antes de cruzar a pista e atingir o muro, fala do retorno do carro, do choque lateral sofrido... mas omite o gritante fato de que um dos pneus estava montado de forma invertida. Gente dentro da equipe disse que aquilo era um “acerto” e que funcionava. Qualquer estudante do ensino médio sabe que as leis da física são imutáveis.

 

Se um pneu tem um desenho para “tirar água” entre ele e o asfalto e que tem um sentido para que ele funcione (ou será que os engenheiros da Goodyear são um bando de burros que não perceberam que fizeram o pneu "no sentido errado"?). No sentido contrário em que foi montado, ele coletaria água, aumentando o risco de aquaplanagem... e no momento do toque com Tiago Giromini, o pneu traseiro direito era justamente a única roda traseira, tracionando, em contato com o asfalto (a esquerda passava pela grama, no lado interno da pista). Nada foi mencionado no processo sobre o assunto. As fatias de queijo se alinharam! 

 

 

Os destroços do carro do Sr. Paulo Kunze. Desta vez o acidente não foi na curva do café, mas o acidente foi demasiadamente forte. 

 

E o queijo nos leva ao Sr. Kunze (lembrei, no mesmo instante em que li a nota, do queijo parmesão que compro... seria o mesmo o empresário do ramo alimentício?). 

 

Ninguém pode – ou poderia – condenar o Sr. Paulo Kunze por querer se divertir e extravasar as tensões do trabalho, descarregando a adrenalina no acelerador de um carro em Interlagos... antes lá do que nas ruas e estradas. Contudo, ao volante de um carro grande, pesado e rápido – os Ômegas da Stock Light Paulista eram os carros da Stock nos anos 90 –seria de se esperar que os pilotos ao volante de carros assim estivessem em boa forma física, algo que as fotos do sr.Kunze denunciaram não ser o caso. 

 

Aos 67 anos, certamente o Sr. Paulo Kunze fazia do automobilismo uma forma de lazer e prazer nos seus finais de semana. 

 

Além disso, por mais que bem preparado venha a estar o piloto sênior, seja ele quem for, é evidente que aos 67 anos pessoa alguma terá os reflexos, tanto físicos como mentais dos seus 27, 37 ou mesmo 47 anos. Será que as federações e a CBA não podem criar regras para limitar a velocidade e potência dos carros que um determinado grupo de pilotos pode vir a pilotar ou não? Aqui temos apenas os “Novatos”, “Graduados B”, “Graduados A” e “Masters” – esta última criada este ano para os pilotos da StockCars – e exigir que os pilotos se submetam a exames físicos e médicos rigorosos antes de ter suas licenças renovadas? Isso pode ajudar a “mudar a posição de uma das fatias de queijo e desalinhar os buracos”.

 

Abraços, 

 

Mauricio Paiva

 

Last Updated ( Saturday, 14 May 2011 21:32 )