Bandeira Vermelha: Qual o Motivo de Tanta Confusão? Print
Written by Administrator   
Sunday, 13 October 2019 16:42

Em 2003, no GP Brasil em Interlagos, a prova foi encerrada em bandeira vermelha após um acidente na curva do Café entre Mark Webber (Jaguar) e Fernando Alonso (Renault). A vitória foi dada à Kimi Raikkonen (McLaren), mas após alguns dias, ao verificarem a regra da  Bandeira Vermelha, reconheceram que a vitória correta era do Fisichella (Jordan), inclusive, no Grande Prêmio seguinte, de San Marino, fizeram uma pequena cerimônia para a entrega do troféu de vencedor ao Fisichella.

 

Em junho deste ano (2019), na prova da Fórmula E em Berna na Suíça, foi dada a bandeira vermelha após um acidente na 1ª volta, e apesar do Diretor de Provas ter agido corretamente, foi criticado por alguns pilotos e entre eles o Lucas Di Grassi e o Felipe Massa, por ter reestabelecido o grid para dar continuidade a prova, conforme a classificação original da corrida.

 

Se procurarmos, encontraremos na história do automobilismo outras “confusões” relacionadas à bandeira vermelha, então eu pergunto:

 

Quais são os erros de interpretação que podem ocorrer após a apresentação de uma bandeira vermelha?   

 

Resposta: Nenhum!

 

   A bandeira vermelha quando acionada pode trazer várias consequências atreladas a interrupção da prova.

 

Nenhum porquê uma bandeira vermelha não é interpretativa, ela é lógica e deve ser aplicada de acordo com uma regra clara (vejam no final desta coluna a reprodução do artigo 124 do CDA da CBA que regulamenta a utilização e os procedimentos em caso de bandeira vermelha).

Então como podemos justificar tanta confusão após a apresentação de uma bandeira vermelha? Acredito que as pessoas (pilotos, equipes e até jornalistas), precisam prestar mais atenção no regulamento antes de se posicionarem. Vejam na matéria abaixo extraída do site Motosport.com,  onde fica claro o equívoco ou desconhecimento do Lucas Di Grassi, do Felipe Massa e também do próprio jornalista Alex Kalinauckas, quando dizem na matéria que o Diretor de Prova “DECIDE” ou que a “FIA UTILIZA O ARGUMENTO...”, (o diretor não decidiu. Ele apenas cumpriu o regulamento. A FIA não participa das decisões ou ações durante o decorrer de qualquer prova e não existem argumentos para esta situação, existe aplicação do regulamento).

 Abaixo a reprodução de parte da matéria publicada no site motorsport.com, e em destaque/sublinhado o assunto colocado acima:

 

   F-E: Di Grassi e Massa detonam direção de prova do ePrix de Berna

 

Por: Alex Kalinauckas

 25 de jun de 2019 11:26

Brasileiros escaparam de confusão no começo da etapa suíça, mas direção de prova tomou decisão que prejudicou os pilotos.

Piloto da Audi que briga pelo segundo título na Fórmula E, Lucas di Grassi sustenta que redefinir a ordem do grid após o caos na primeira curva do ePrix da Suíça para as posições de largada foi “muito injusto”. O brasileiro havia galgado vários postos depois das luzes verdes em Berna, mas foi prejudicado pela decisão da direção de prova de fazer o reinício da corrida com a restauração da ordem inicial, já que a primeira volta não fora inteiramente completada.

 

   Pilotos protestam contra a decisão dos comissários e direção de prova. (reprodução da imagem da TV)

 

... Mas o incidente inicial acabou provocando um longo período de bandeira vermelha, que terminou com a FIA decidindo reordenar o pelotão conforme a ordem da largada, utilizando-se do argumento de que a primeira volta não fora completada, o que invalidaria a manutenção das novas posições na segunda largada.

 

Indignados com a decisão do diretor de prova, di Grassi e Massa foram protagonistas de um grupo de pilotos que discutiram com um oficial da FIA no pitlane antes da corrida recomeçar.

 

Após a prova, o piloto da Audi classificou o episódio como “muito injusto”. Ele explicou: "nunca vi um esporte onde alguém causa um acidente e, em seguida, é permitido voltar aos boxes, consertar o carro e começar de novo da mesma posição"...

 

Quando o Di Grassi, diz “muito injusto” eu posso até concordar com ele, pois a “justiça” nem sempre acompanha a legalidade, por vezes até passa muito distante, porém, quando um regulamento é feito, tenta se buscar a forma mais justa de se interferir numa prova trazendo o menor prejuízo possível à maioria dos participantes, eu sempre digo nos meus briefings com os pilotos: “em uma corrida, qualquer interferência da Direção de Prova, TRARÁ PREJUÍZOS PARA ALGUNS E BENEFÍCIOS PARA OUTROS”, isso ocorre em uma bandeira vermelha ou na entrada do safety car, acontece até mesmo em uma bandeira amarela, porém nestas situações, escutamos apenas as manifestações dos que se sentiram prejudicados, pois aqueles que foram beneficiados não teriam o por que se manifestarem.

 

   Briefing com os Pilotos da Porsche Carrera Cup: tirar dúvidas, esclarecer ações e orientar os pilotos antes da prova.

 

Vamos tentar entender um pouco mais sobre a bandeira vermelha:

O que todos sabem é que se uma bandeira vermelha for apresentada em uma corrida, a classificação deverá ser a da volta anterior à sua apresentação.

 Até aí está fácil e muito simples! Então vamos “dificultar” um pouco a história:

- e se a bandeira for apresentada na 1ª volta, como retornar a prova à volta anterior?

- e se metade do pelotão já abriu a volta 10 e o restante ainda está na volta 09?

- e se a bandeira vermelha for apresentada juntamente com a bandeira quadriculada, como aconteceu no caso do Ayrton Senna x Prost em Mônaco em 1984?

- e se acontecer em uma prova de Endurance, onde temos carros na pista e carros parados nos boxes. Como voltar à volta anterior de um carro que está há alguns minutos fazendo seu pit stop?

 

   F1 Mônaco 1984: Enquanto Jacky Ickx apresenta a bandeira vermelha, o fiscal de pista mostra a bandeira quadriculada.

 

São tantas as possibilidades que as vezes até eu fico apreensivo em aplicar a regra da bandeira vermelha. Não dará para explicar todas as variaveis aqui nesta coluna, porém vou tentar explicar algumas situações.

 

Para entender bem o procedimento de bandeira vermelha, ninguém melhor do que um especialista em cronometragem para explicar, pois são eles que aplicam o regulamento sobre o mapa de corrida para entregar aos Comissários o resultado da prova naquele instante, ou seja “uma volta atrás”. Então eu conversei com o Jean Pierre Caradec, da Caradec Cronometragem e ele me explicou o seguinte:

 

“Para nós da cronometragem é mais fácil porque a nossa visão de corrida é da tela da cronometragem no computador e não a visão da pista. Enquanto vocês, oficiais de competição, jornalistas e publico veem tudo que acontece em cada ponto da pista, nós só vemos quando o carro passa na linha de cronometragem ou linha de chegada fechando uma volta e abrindo outra.”

 

   Equipe Caradec de cronometragem. Sempre posicionados na Torre e na mesma direção da linha de cronometragem, ou linha de chegada.

 

O que é que ele quis dizer?

 

- Quis dizer que toda vez que ocorre uma bandeira vermelha, a cronometragem “trava” a tela do computador no exato momento em que o Diretor de Prova dá a ordem para apresentarem a bandeira vermelha, e muito provavelmente, neste momento, teremos alguns carros que já passaram pela linha de chegada e outros não. Vamos imaginar que estamos fechando a volta 9 e abrindo a volta 10.

 

   Figura 01 – realidade da pista e visão do público,

 

Quem está assistindo a corrida, vê a situação conforme o desenho da figura 1 acima, enquanto a equipe de cronometragem vê conforme a figura 2 abaixo.

 

   Figura 02 – visão da cronometragem – carros que passaram e carros que não passaram a linha de chegada,

 

Para a cronometragem não existem posições na pista, existem àqueles que passaram pela linha de chegada e os que não passaram.

 

Se a bandeira vermelha foi dada conforme o exemplo acima, então a cronometragem  deverá aplicar um “retorno” naqueles carros que passaram pela linha de cronometragem até que todos estejam na mesma volta. Seria como no desenho abaixo, o da figura 03.

 

   Figura 03 – os carros devem estar espalhados na pista, porém para a cronometragem eles são apenas carros que não passaram pela linha de chegada,

 

Estando todos os carros na mesma volta, a cronometragem aplica a regra da bandeira vermelha ou seja: se todos estão na volta 9 então, para efeito de classificação será considerado a volta 8.

 

E aí começam as confusões, pois os pilotos que já haviam passado pela linha de cronometragem acham que voltaram 2 voltas, porém eles apenas abriram a volta 10 e para a equipe de cronometragem a volta 10 ainda não existe, pois só são registradas as voltas fechadas.

 

E porque deve-se retornar até a volta 8 (regulamento: volta anterior a apresentação da bandeira vermelha)? Porque esta volta nove ainda não foi concluída e durante a corrida, na volta 9 podem ter ocorrido ultrapassagens. Ultrapassagens estas, que apesar de todos terem visto, o público ter vibrado, a TV ter mostrado replay, mas que a cronometragem não reconhece, lembrem-se que a cronometragem só reconhece os carros que já passaram pela linha de chegada, então tudo que aconteceu na volta 9, que ainda não foi fechada, não existe para a cronometragem, inclusive se algum carro bateu ou quebrou na volta 9 a cronometragem também “não sabe”, e sendo assim, o resultado oficial, segundo a regra da bandeira vermelha deverá ser o da volta 8.

 

Por isso que muitas vezes, carros que estavam parados por quebras ou acidentes, voltam a constar na classificação da prova, desde que na volta válida eles estivessem ainda na competição e também por isso que se bandeira for apresentada antes do fechamento da 2ª volta, a relargada deverá ser de acordo com o grid original.

 

Para entender melhor, vamos ao mesmo raciocínio do exemplo anterior:

 

- se apenas alguns carros abriram a 2ª volta,

- a cronometragem “retorna” a corrida até que todos os carros estejam na mesma volta,

- desta forma, todos retornam para à volta 1,

- não existindo uma volta anterior a volta 1, então a corrida não é considerada e o grid será formado de acordo as posições que os pilotos conquistaram no treino classificatório. Inclusive, existem algumas curiosidades em relação a este regulamento:

- como não é considerado prova se a bandeira vermelha for apresentada até a 2ª volta, então os pilotos poderão trazer seus carros para o grid na mesma posição da classificação, a menos que não consigam por terem o carro danificado no acidente, dessa forma sua posição deverá ficar vazia no grid (na F1 antiga podiam até colocar o carro reserva), para enfatizar esta regra, o Rubinho que é recordista de GPs, tem pela FIA 322 GPs,  ele conta que tem 326 já que ele considera todos que participou, porém a FIA não considera aqueles que ele esteve envolvido em acidente na 1ª ou 2ª volta e não conseguiu voltar para a largada (ou relargada).

 

No caso da bandeira vermelha ser apresentada junto com a bandeira quadriculada, teoricamente a quadriculada seria desnecessária, mas neste caso o Diretor de Prova quis deixar claro que a corrida estaria interrompida e encerrada, já determinado que não voltaria para complementação da prova conforme o regulamento permite se a bandeira vermelha for apresentada após a 2ª volta e antes de 75% da prova.

 

E a última situação que eu comentei, é quando a bandeira vermelha é apresentada em uma prova de Endurance, onde os pilotos são obrigados a fazerem “pit stops” e pode acontecer uma bandeira vermelha no exato momento em que alguns pilotos estejam fazendo seus pits, outros já fizeram e ainda outros estão por fazer. Pode ocorrer enquanto algum piloto esteja entrando nos boxes ou ainda pior, algum piloto que esteja saindo dos boxes após ter feito seu pit. Vamos pegar este último exemplo, o piloto que acabou de fazer o pit stop e está saindo dos boxes. O que fazer? Se retornarmos ele a uma volta anterior ele “perderá” seu pit ? (lembrando que na maioria dos regulamentos de Endurance, um número determinado de pit stops é obrigatório). São situações de corrida que podemos ter tantas variáveis que é praticamente impossível colocar todas elas no regulamento , então nesta hora é importantíssima atuação dos Comissários Desportivos para avaliar  a situação de momento e tentar resolver dando o menor prejuízo possível, mas neste caso, aquela situação que escrevi lá no início irá acontecer: a interferência do Diretor de Provas e Comissários  trará prejuízo para alguns e benefícios para outros”, mas não há o que fazer, isto é o que chamamos de “coisa de corrida”.

 

   André Bragantini, Chefe de Equipe, Alceu Feldiman, Piloto e Sergio Berti, Diretor de Prova em alguma explicação sobre a corrida....

 

É isso!

 

Abraços,

 

Sergio Berti 

 

ABAIXO O CAPÍTULO DO CDA SOBRE BANDEIRA VERMELHA:

SEÇÃO XIII – DA INTERRUPÇÃO DE UMA PROVA

Art. 124 – Caso seja necessária a interrupção de uma prova, deverá ser adotado o seguinte procedimento:

I – Uma bandeira vermelha deverá ser mostrada no PSDP.

II – Simultaneamente, a mesma bandeira deverá ser apresentada em todos os postos de sinalização.

III – A decisão de interromper a corrida poderá ser tomada apenas pelo diretor de prova.

124.1 – Quando a bandeira vermelha for apresentada conforme o procedimento descrito no caput deste artigo, todos os veículos deverão imediatamente ter suas velocidades reduzidas e serem levados para o Pit Lane, ficando bem claro que:

I – Os veículos estarão em regime de “parque fechado” e ninguém poderá tocá-los, sob pena de exclusão sumária.

II – Caso não haja relargada, a classificação da corrida será a da volta precedente àquela em que a bandeira vermelha tiver sido mostrada.

III – Os veículos de socorro ou de serviço poderão estar circulando pela pista.

124.2 – Em caso de relargada, deverão ser observados os seguintes pontos:

I – Os veículos que permaneceram no Pit Lane pelos comissários serão realinhados, em fila única, nas posições que ocupavam na volta precedente àquela em que a bandeira vermelha tiver sido mostrada.

II – Os pilotos que se dirigirem aos boxes deverão largar do mesmo, de acordo com as regras estabelecidas para largada.

III – Os pilotos que forem para o Pit Lane, e cujos veículos necessitarem de reparos mais específicos, poderão ser empurrados para os boxes para a execução dos respectivos trabalhos, e de lá deverão largar para continuação da prova, desde que autorizados pelos comissários desportivos.

124.3 – Após a interrupção de uma prova, estarão previstas as seguintes hipóteses:

I – Se menos de duas voltas tiverem sido completadas – a largada será considerada anulada e todos os pilotos que dela tiverem tomado parte serão admitidos no novo grid de largada, que não será alterado em relação ao original; caso não seja possível a relargada, nenhum ponto será considerado para campeonato, torneio, copa ou troféu.

II – Se mais de duas voltas e menos de 75% da distância prevista para a prova tiverem sido completados – se houver condições, a prova deverá ser reiniciada com os veículos realinhados em fila única e a relargada será feita com safety-Car. Caso a largada da prova tenha sido dada com o safety-car e se faça necessário uma interrupção com bandeira vermelha, a largada será considerada cancelada, não sendo computados pontos. Se possível for uma nova largada será dada, descontando-se as voltas/tempo já concluídas sob procedimento do safety-car, passando a prova a ter um número de voltas ou o tempo menor.

III – Se mais de 75% da distância prevista para a prova tiverem sido completadas - a prova será considerada completada e não haverá nova largada, sendo a classificação final a verificada na conclusão da volta que tiver precedido à interrupção da prova e a pontuação para campeonato, torneio, copa ou troféu será feita na sua totalidade.

SEÇÃO XIV – DO REINÍCIO À INTERRUPÇÃO DE UMA PROVA

Art. 125 – Caso seja possível se efetuar nova largada, deverão ser observados os seguintes procedimentos:

125.1 – Para todas as situações de relargada:

a) Os veículos serão realinhados de acordo com o artigo 124.2 I, em fila única e a relargada será com safety-car.

b) Os pilotos deverão utilizar os mesmos veículos com que tiverem participado da primeira largada, desde que consigam, por seus próprios meios, levá-los ao Pit Lane caso contrário não poderão largar.

c) Os veículos que tiverem se dirigido ao Pit Lane poderão ser levados de volta aos boxes, desde que empurrados, e com autorização dos comissários desportivos.

d) Os veículos acidentados deverão ser vistoriados pelos comissários técnicos que decidirão se estão em condições de prosseguir na prova.

e) Os veículos que forem recolhidos aos boxes para manutenção deverão relargar dos mesmos.

f) Não serão admitidos veículos reserva.

g) Após a nova largada, a prova poderá ser reduzida em voltas ou tempo, a critério dos comissários desportivos.

h) Em qualquer procedimento de relargada, após o instante em que é dada a ordem de partida, as ultrapassagens estão permitidas.