O que se tem que fazer para ser G.O.A.T? Print
Written by Administrator   
Thursday, 26 August 2021 22:06

Nos últimos tempos, ouve-se muito esta expressão, para as várias modalidades desportivas, desde o basquetebol ao futebol, e claro, o automobilismo não é exceção. Então, um destes dias, li uma citação dita por Jim Clark... e comecei e pensar na ideia. E eis ao que cheguei.

 

Primeiro, falar sobre o que disse (aparentemente)

“Os grandes pilotos têm de ser multifacetados. A história não se escreve só na Formula 1, longe disso.”

 

E é verdade: Clark correu na Formula 1, IndyCar, experimentou um carro da NASCAR – mas nunca correu – venceu as 500 Milhas de Indianápolis e correu por três vezes nas 24 Horas de Le Mans, onde conseguiu um terceiro lugar na edição de 1960, ao lado de Roy Salvadori, num Aston Martin da Border Reivers. E claro, foi absolutamente fiel à Lotus, correndo por ele em todas as 72 corridas na sua carreira na Formula 1. E além disso, foi tricampeão na Tasman Series, uma competição que havia no inverno europeu, na Austrália e Nova Zelandia, onde todos os grandes pilotos desse tempo faziam, desde Jack Brabham a Bruce McLaren, passando por Jackie Stewart e Denny Hulme. E era como se fosse uma temporada paralela na Formula 1.

 

 Nos anos 60, Jim Clark correu nos Estados Unidos algumas corridas. Além de vencer a Indy500, também correu na NASCAR.

 

E uma das poucas coisas que as pessoas sabem, é que teve como vizinho e um bom amigo um senhor chamado Andrew Cowan. Um piloto de ralis ativo no final dos anos 60 e inicio dos anos 70, vencendo o rali Londres-Sydney e foi segundo classificado no Dakar de 1985. Mais tarde, ajudou a montar a Mitsubushi Ralliart Europe, que foi a equipa de fábrica da marca japonesa no WRC, ajudando a conseguir quatro títulos mundiais com Tommi Makinen ao volante, no final dos anos 90. E ele conta que muito do seu estilo nos rali aprendeu nas muitas vezes que ele e Jim saiam para a estrada e competir um contra o outro. E pensa-se sempre no que ele poderia ter sido ao volante de um carro de ralis.  

 

Nos anos 60, 70 e inicio dos anos 80, era comum os pilotos fazerem Endurance, por equipas oficiais ou privadas. Não era anormal alguém abdicar de correr no Mónaco porque queria correr em Indianápolis, ou fazer Can-Am entre as datas da Formula 1, que era isso que gente como Bruce McLaren, Dennis Hulme, Dan Gurney e Peter Revson faziam. E as vezes sem conta que Mário Andretti atravessava o Atlântico e iria correr as 500 Milhas ou outra prova da CART, enquanto corria na Formula 1, fosse pela Ferrari, Parnelli ou Lotus, só porque queria ser como Alberto Ascari e vencer o título mundial em Monza? Pois bem, conseguiu-o.

 

 Bruce McLaren tinha também uma equipe na CanAm além da equipe de F1. Inclusive foi em um CanAm que ele morreu. 

 

Contudo, a meio da década de 80, os donos de equipa de Formula 1 queriam-os como exclusivos. Chapman deu 20 mil dólares a Nigel Mansell para não corresse as 24 Horas de Le Mans de 1982 porque alguém dera dez mil dólares para poder correr nessa prova. E claro, os acidentes fatais de Manfred Winkelhock e Stefan Bellof, em três semanas, em agosto de 1985 ajudou muito na decisão dos pilotos assinarem contratos exclusivos na Formula 1.

 

E para piorarem as coisas, no inicio da década de 90, Bernie Ecclestone, com a ajuda de Max Mosley, decidiu “acabar com a concorrência”. Primeiro, com o final do Mundial de Sport-Protótipos, com os regulamentos que fizeram com que os motores tivessem a mesma cilindrada dos de Formula 1, em 1992, e três anos depois, aproveitando a divisão entre CART e IRL, atrair os melhores pilotos dessa competição americana e impedindo os melhores pilotos de Formula 1 de correrem no outro lado do Atlântico.

 

 

 

E por cerca de década e meia, os pilotos de Formula 1 só pensavam naquilo. Toda uma geração meteu na cabeça que o automobilismo “era” a Formula 1, e isso contaminou nos espectadores. As marcas estavam lá, a elite estava lá, e quem não chegasse, não era ninguém. A sua carreira não valeria a pena, porque a Formula 1 era... tudo.

 

Contudo, as coisas mudaram nos últimos cinco anos. O reavivar do Mundial de Endurance, a fusão da CART e a IRL, rebatizada de IndyCar, o surgimento da Formula E, a competição elétrica, a troca de proprietários, com a saída de Ecclestone e a chegada da Liberty Media, e por fim, a decisão de Fernando Alonso em correr nas 500 Milhas de Indianápolis no dia de um GP do Mónaco, mudou a perceção das coisas.

 

 Além de correr no WEC e vencer em Le Mans, Fernando Alonso também correu duas vezes a Indy500.

 

Agora, os pilotos jovens tem muito mais escolhas, para além da Formula 1, e mesmo que estejam lá, já pensam seriamente em fazer algumas provas – pelo menos, as mais importantes – a bordo de outro tipo de carros. E mesmo depois da Formula 1, gente como Romain Grosjean já vê outras competições com respeito e admiração e afirmam que se sentem mais completos.

 

Hoje em dia, os pilotos já começam a pensar numa carreira longa, dividida em três, quatro ou mais partes. Uma nas categorias de base, outra na Formula 1, depois dela, IndyCar, Endurance e quem sabe, o Dakar ou o WRC, como fez Kimi Raikkonen e Robert Kubica. E até Sebstien Loeb, quando fez o contrário e conseguiu um segundo lugar nas 24 Horas de Le Mans de 2006. Caso entrem outras competições na equação, a ideia de experimentar todo o tipo de carros e uma carreira bem longa já entra nas mentes dos pilotos. E a mentalidade de quem só pense na Formula 1 como automobilismo já começa a não ser bem vinda.

 

 Depois de deixar a F1 no final de 2008, Kimi Raikkonen correu no WRC... e foi protagonistas de alguns fortes acidentes.

 

Gostaria de ver Lewis Hamilton, Sebastian Vettel ou até outros, no futuro, irem a Le Mans e tenteram a Tripla Coroa do automobilismo. Só conheço um piloto que está ativamente na busca disso, que é Fernando Alonso. A busca por Indianápolis mobilizou milhões nas televisões quando o fez em 2018 e 2020, para além do Dakar, e claro, quando triunfou com o Toyota em Le Mans, ajudou muito no seu palmarés. Tecnicamente, Juan Pablo Montoya é outro que poderá conseguir a Tripla Coroa, se colocarmos como critério a vitória no GP do Mónaco. É que nestes últimos tempos, está a dedicar-se à Endurance.

 

 

 

Em suma, os tempos mudam. Os pilotos querem ser os mais variáeis possível, e os próximos tempos prometem muito em termos de competição. Os pelotões alargam-se, as construtoras aceitam os desafios novos na Endurance – embora já se saiba: eles sairão em cinco anos – e o futuro não vai ser só uma categoria. E acho que para o “Greatest of All Time”, o futuro será mais completo e mais versátil. Acredito nisso. 

 

Saudações D’além Mar,

 

Paulo Alexandre Teixeira

 

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Nota NdG: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Nobres do Grid.