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GEIA – Mais erros que acertos PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Friday, 16 August 2013 13:20

 

Quando vemos nas nossas ruas a infinidade de marcas e modelos transitando (quando não parados em engarrafamentos) nos dias de hoje, dificilmente nos perguntamos sobre a origem de tudo, como chegamos a este estágio... afinal, a vida anda tão corrida que nem temos tempo para vivê-la direito. Este especial do site dos Nobres do Grid vem não apenas para tentar resgatar uma parte da história, mas também para convidar o amigo leitor a viajar no tempo e buscar algumas respostas para perguntas mal ou não respondidas.

 

O primeiro carro chegou ao Brasil, importado da França, em 1891. Artigo de altíssimo luxo, eram raros os cidadãos que tinham um veículo sem ser de tração animal. Com o passar dos anos e a industrialização atingindo a produção de automóveis, graças à genialidade de Henry Ford e sua linha de produção, os automóveis começariam a ficar mais acessíveis e conquistar o mundo.

 

Não demorou muito para que as grandes montadoras norte-americanas inaugurassem fábricas no Brasil (como a Ford, em 1919, e a General Motors, em 1925).  Na época, as empresas estrangeiras apenas montavam os veículos no País, não produziam peças em território nacional.

 

 

Os livros de história costumam apontar Juscelino Kubitschek como o precursor do nascimento da indústria automotiva no Brasil. Contudo, antes dele, importantes passos foram dados para que o país pudesse sonhar em ter um parque industrial. Foi durante os governo de Getúlio Vargas que, efetivamente, o país deu seus primeiros passos no caminho da industrialização. Em seu último governo, Getúlio Vargas tomou medidas importantes como a proibição da importação de veículos montados e a imposição de alta taxação de peças. Outro ponto capital, não só no nascimento da indústria automobilística como na de outros setores foi a instalação da CSN – Companhia Siderúrgica Nacional, que possibilitou  a manufatura em território brasileiro de chapas e barras de ferro e aço, matéria-prima de todo automóvel, bem como a fabricação de várias peças.

 

O papel de Juscelino Kubitschek foi o de desenvolvimentista. Para proporcionar o crescimento de uma indústria nacional sólida. Em maio de 1956, o Grupo de Estudos da Indústria Automobilística, do qual o Almirante Lúcio Meira fazia parte, apresentou ao presidente da República um relatório sobre a indústria automobilística onde era proposta a criação de um grupo executivo com o objetivo de centralizar as decisões e estudos referentes à sua implantação. Além disso, o relatório defendia a idéia de que as empresas do setor deveriam ser privadas e preferencialmente estrangeiras, em detrimento de organizações estatais ou de economia mista.

 

 

O Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA), subordinado ao Conselho do Desenvolvimento, foi finalmente criado em junho de 1956. O novo órgão foi presidido pelo Almirante Lúcio Meira. A formação do GEIA, assim como dos demais grupos executivos criados durante o governo Kubitschek, tornou-se um dado importante para a execução do Plano de Metas. O  GEIA seria o responsável pela política de estímulos fiscais para implantar a indústria automobilística no Brasil. Naquele mesmo ano, é inaugurada em São Bernardo do Campo (no ABC Paulista) a primeira fábrica de caminhões com motor nacional. A partir daí, especialmente com a política automobilística a pleno vapor, o Sudeste passa a crescer a taxas superiores às demais regiões do Brasil. O projeto do GEIA tinha como objetivo dando condições às indústrias no Brasil para desenvolver localmente qualquer tecnologia estrangeira.

 

O feito de ter o primeiro carro 100% fabricado nacionalmente foi da Romi, indústria de tornos e equipamentos agrícolas, que obteve o licenciamento de um minicarro italiano, o Isetta. Surge assim, em 1956, a Romi-Isetta, como ficou conhecida, com um motor semelhante ao de uma motocicleta, rodas diminutas, aro 14 e somente uma porta, frontal. No mesmo ano, outras fábricas, como a FNM (Fábrica Nacional de Motores) e a Vemag (de origem alemã) lançavam carros totalmente nacionais, apesar de serem cópias licenciadas de modelos baratos europeus e norte-americanos.

 

 

Em 15 de novembro de 1957, saía às ruas o primeiro automóvel – de quatro lugares – fabricado no Brasil, com um índice de nacionalização relativamente elevado: Era uma perua DKW, produzida pela Vemag, uma das empresas do grupo alemão ‘Autounion’. Era um carrinho feio. As linhas traseiras quadradas destoavam da frente arredondada, herdada dos DKW fabricados na Alemanha. Não havia muitas alternativas quanto à cor da pintura nem do estofamento. Mas a perua andava bem e surpreendia pelo desempenho e economia.

 

O motor era de dois tempos e três cilindros, com tração dianteira. Apenas 900 cm3 e 40CV. No entanto, sua aceleração e sua velocidade máxima eram razoavelmente boas para a época. O câmbio tinha quatro marchas para a frente e a estabilidade era satisfatória. O consumo de gasolina – que não era levado em conta naqueles tempos de fartura de petróleo – era surpreendentemente baixo. O grande inconveniente era a necessidade de se misturar o óleo à gasolina, uma vez que era um motor de dois tempos, o que fazia muita fumaça.

 

 

Juscelino queria popularizar o carro de passeio entre os brasileiros e por isso, pediu ao GEIA que procurasse fazer por onde as montadoras priorizassem os utilitários, depois os carros populares, e por último, bem por último, os veículos de luxo. O projeto até começou bem, mas se observarmos a história que se sucedeu no final dos anos 50 e início dos anos 60, os carros produzidos no Brasil no início da indústria, notaremos que o plano acabou não sendo seguido.

 

Com o passar dos anos os carros mais baratos e chamados populares produzidos no Brasil eram apenas o Fusca (VW) e o Dauphine (Willys/Reuault). Os utilitários continuavam sendo as peruas da Vemag, o Jipe que ela também produzia e a Kombi, que era o furgão da VW. Uma série de carros que podemos chamar de médios entrou em produção, como o ‘sedan’ DKW, o Gordini da Willys/Renault e até mesmo esportivos foram produzidos, como a Berlineta Interlagos. Além destes, três veículos de luxo passaram a ser montados: o Aero-Willys, o FNM JK e o Simca.

 

 

O fato é que, como tudo na política deste país, o GEIA sofria – e acabava cedendo – à pressões de diversos tipos, especialmente depois da passagem do governo de Juscelino. Assim, projetos como o do JK e Simca eram aprovados, e projetos da Ford, GM e Chrysler, rejeitados. A própria Mercedes-Benz teve um projeto para montar carros no Brasil aprovado nos anos 60, numa época em que não tinha carros populares (se é que um dia os teve), mas os alemães resolveram engavetar o projeto estranhamente aprovado pelo GEIA, continuando a produzir somente ônibus, caminhões e motores.

 

Quem mais perdeu com isso foram justamente os pioneiros do transporte de passageiros. a Romi-Isetta, como ficou conhecida, com seu motor super econômico e pequenas dimensões foi “jogada na marginalidade” porque o GEIA “definiu automóvel” como um veículo capaz de levar pelo menos quatro pessoas... e na Romi-Isetta só cabiam três! A produção ainda continuou até 1961, com o remanescente das peças da fábrica, mas o Brasil – mais uma vez – deixou de estar à diante de seu tempo para criar o primeiro carro compacto, econômico (fazia 25 Km com 1 litro de gasolina) e popular da indústria automotiva.

 

 

Os primeiros anos da indústria automobilística nacional marcaram a fase da cópia, ou seja, os “nossos” carros nada mais eram do que veículos já existentes, fabricados nos seus países de origem, onde geralmente não haviam obtido muito sucesso. Graças à política de incentivos de então, os fabricantes podiam importar seu ferramental sem pagar impostos.

 

Os DKW eram fabricados pela Vemag, sob licença da Auto-Union da Alemanha. Já tinham dois anos de experiência de Brasil e uma pequena rede de revendedores. A Volkswagen Acreditou no Brasil e fez aqui sua primeira fábrica fora do país, com um grande estardalhaço, tendo Juscelino desfilando em um fusca conversível, guiado pelo próprio presidente da montadora. Ele e a Kombi tinham praticamente a mesma mecânica, baseada num motor de 1200 cc e foram, desde o início, um sucesso de vendas. Posteriormente, foi lançado o Karmann-Ghia, um esportivo que foi sucesso de vendas e que hoje é cobiça de colecionadores.

 

 

A francesa Simca instalou-se num prédio que anteriormente pertencera à Varam Motores, montadora de automóveis e caminhões Nash. O primeiro Simca Chambord de 1959, era uma cópia do Simca Vedette, fabricado na França desde 1957. Este carro, curiosamente, lembrava um modelo Ford, pois seu projeto originalmente era americano. O motor, de oito cilindros em “V”, tinha válvulas laterais e assemelhava-se aos antigos motores importados dos Ford 60HP.

 

O Simca Chambord possuía uma carroceria das mais luxuosas, com acessórios totalmente inúteis no Brasil. Suas linhas eram vistosas e os materiais usados no acabamento também.  Mas o carro tinha muitos defeitos; deles, o mais aborrecido era uma embreagem que patinava constantemente. Outros possuidores queixavam-se também de problemas na parte elétrica e, mais tarde, verificou-se que seus motores gastavam muito óleo.

 

 

O Renault Dauphine havia sido lançado na Europa em 1957 com a finalidade de combater o VW, cujo sucesso de vendas era  esmagador. Estranhamente, porém, era fabricado no Brasil por uma firma americana, a Willys Overland. Os primeiros Dauphines fizeram sucesso inicial, mas logo começaram a surgir problemas e defeitos, em grande parte por conta das nossas péssimas vias. O Dauphine possuía motor de quatro cilindros, quatro tempos, tração traseira, câmbio de três marchas e deslocava apenas 850 cm3.

 

Logo, tanto ele como o “seguimento melhorado”, o Gordini, lançado em 1962, ganharam o apelido de “Leite Glória” (um dos leites em pó vendidos no país e que dizia em sua propaganda que aquele leite “desmancha sem bater”). Mas não foram apenas os pequenos carros da Renault que sofreram com o bom humor dos brasileiros. Os primeiros Simcas foram logo chamados de “Belo Antonio”, por causa de um filme exibido na época, cujo protagonista principal, Marcelo Mastroiani, era um homem bonito, requisitado por todas as mulheres, mas que na hora “H”, simplesmente “não funcionava”.

 

 

A Fábrica Nacional de Motores, que já montava e fabricava os caminhões FNM sob licença da Alfa Romeo há algum tempo também entrou no mercado de produção de automóveis. O JK, batizado assim em homenagem à Juscelino Kubitschek, era o Alfa Romeo 2000, que havia sido lançado na Itália em 1957, mas que não tinha obtido o mesmo sucesso dos demais Alfas. Em um acordo com os italianos, a Fábrica Nacional de Motores, que era a única indústria automotiva de propriedade do governo brasileiro, trouxe todo o ferramental para a construção desse carro.

 

Os primeiros JK eram procuradíssimos  pelos experts brasileiros. Mas como a fábrica era do governo e a produção muito pequena, era um carro raro de ser visto e muito difícil de ser comprado. Na verdade, para a época, era um supercarro com motor de quatro cilindros em linha, 2000cm3, duplo comando na cabeça, câmbio de cinco marchas e suspensão muito estável, ele era nitidamente superior aos seus concorrentes. Muito veloz, ultrapassando os 150km/h. Entretanto, a Fábrica Nacional de Motores passava por sucessivas crises administrativas. E a qualidade de seus automóveis se ressentia disso.

 

 

O grande golpe mercadológico para conquistar o público comprador potencial era mostrar o carro como sendo o melhor de todos, melhor que os concorrentes e para isso, nada melhor do que colocá-lo nas pistas. O autódromo Internacional de Interlagos virou um verdadeiro laboratório de desenvolvimento onde cada fabricante não só tentava mostrar a qualidade de seus carros, como também desenvolvia melhorias nos mesmos, adaptado-os às condições brasileiras.

 

Segundo o lendário mecânico Miguel Crispim, uma corrida como as mil milhas brasileiras valiam por 16 mil Km de testes em qualquer lugar do mundo. Além destes “testes” onde era possível ver a nata do automobilismo nacional, duas montadoras, a Willys/Renault e a Simca realizaram testes de resistência que detém recordes mundiais até hoje (Leia aqui sobre os testes com o Gordini em Interlagos e com o Simca em estrada).

 

 

Dentre os erros cometidos pelo GEIA, o maior deles, ao menos em nossa opinião, foi o de não ter fomentado o desenvolvimento de uma indústria 100% nacional na produção de veículos.

 

Nos anos 60 nós tivemos uma geração de geniais projetistas que, caso tivessem o apoio devido, poderiam ter colocado o país no cenário automobilístico com o peso de uma Coréia do Sul ou de um Japão, antes mesmo destes países terem atingido o platamar mundial onde se encontram.

 

Genaro ‘Rino’ Malzoni, Toni Bianco, João do Amaral Gurgel, Anísio Campos, Walter Hahn Jr, Rigoberto Soler e outros idealistas conseguiram produzir verdadeiras joias sobre rodas, com imensas dificuldades e nenhum apoio. Pelo contrário, em muitos casos foram de certa forma boicotados em seus projetos por fornecedores de peças e mesmo pelo próprio governo.

 

 

Quem sabe, se em 1965, Juscelino tivesse sido eleito presidente da república novamente, como era seu plano, não teríamos um cenário diferente na indústria automobilística.

 

 

Fontes: Arquivo Nacional; Revista Quatro Rodas; Revista Autoesporte; CDO. 

 

 

Trabalho de Pesquisa: Paulo Alencar E Flavio Pinheiro 

 

 

Last Updated ( Friday, 16 August 2013 14:20 )