Especiais

Classificados

Administração

Patrocinadores

 Visitem os Patrocinadores
dos Nobres do Grid
Seja um Patrocinador
dos Nobres do Grid
O dia em que Enrique Bernoldi apareceu na TV. PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Monday, 11 February 2013 00:47

 

 

 

A temporada de 2001 pode ter ficado marcada para muitos como a da estréia de Fernando Alonso na Fórmula 1, mas para o brasileiro Enrique Bernoldi, ela teve uma outra ótica e que poderia ter terminado de uma outra maneira.

 

Depois de correr atrás de tudo que era vaga disponível, Bernoldi acabou assinando com a Arrows, chefiada por Tom Walkinshaw, que o Nelson Piquet chamava de Tom ‘Walkinshark’ (sentiu o amor, não?) e que o Raul Boesel tem em grande consideração até hoje, uma vez que ele era o chefe de equipe do Brasileiro na Jaguar em 1987, quando Boesel sagrou-se campeão mundial de protótipos.

 

A Arrows de Tom Walkinshaw era uma destas equipes estranhas. Provavelmente foi a precursora do capitalismo selvagem na categoria. Embora não passasse lá tanta vergonha dentro das pistas, tomando voltas e mais voltas dos carros mais rápidos, também não era mais sombra do que foi nos anos 80 e de seus último suspiro, quando teve Damon Hill como piloto. O grande problema era a forma de gestão do ‘tubarão’, como dizia Piquet, em não respeitar contratos assinados com seus pilotos. O finlandês Mika Salo, que surgiu junto como xará compatriota Hakkien ficou sem lugar para a temporada de 1999 faltando apenas poucas semanas para o início da temporada. No ano seguinte, quem tomou um pé na bunda sem maiores explicações foi o espanhol Pedro de la Rosa, que era o primeiro piloto da equipe naquele ano, com o patrocínio da Repsol.

 

Para 2001, Tom Walkinshaw chutou a Repsol, chutou de La Rosa e a vaga que abriu acabou nas mão de Enrique Bernoldi (o nome dele é dem o H mesmo), que assinou contrato por três temporadas, levando consigo um patrocínio da não tão famosa e poderosa na época Red Bull.

 

O sonho de 99 entre 100 pilotos (exceção do Cacá Bueno, que não cabe no carro), correr na Fórmula 1 era o nirvana... mas o tal Arrows-Asiatech era uma M de carro. Quebrou em cinco das seis primeiras corridas. A direção não era hidráulica. O motor Asiatech, era um Peugeot – aquele que a McLaren chutou fora – recondicionado, longe de ser competitivo, o controle de tração não funcionava direito e o tanque de combustível – valendo-se da pouca potência e menor consumo – era o menor de todos os carros. Em termos de aerodinâmica, era um caminhão laranja e preto!

 

 

Para não dizer que a Arrows não tinha absolutamente nada de interessante, ela chegou a trazer uma interessante novidade aerodinâmica para o GP seguinte, em Monaco: contudo, apenas o então primeiro piloto do time, o holandês Jos Verstappen, iria usá-la, uma vez que não tinha para dois carros. Era um aerofólio extra, instalado sobre o bico do carro, uma dessas coisas horrendas tipo aquelas galhas que apareceram uma época nos carros da McLaren. Por questões de segurança, a FIA baniu o ‘apêndice aerodinâmico ainda na quinta-feira.

 

Nos treinos, os dois carros sempre andando entre os que nos dias de hoje cairiam no Q1. No treino oficial de sábado, Bernoldi pegou tráfego em suas ‘voltas rápidas’ e não conseguiu nada melhor que um 20º lugar no grid. Até mesmo a Minardi de Fernando Alonso largaria à sua frente. Ao menos, Enrique foi o segundo melhor brasileiro do grid: na última fila, estavam os compatriotas Luciano Burti e Tarso Marques. Seria mais um daqueles finais de semana eu que o objetivo principal seria ‘sobreviver até a bandeira quadriculada’... mas como bem dizia Juan Manuel Fangio, “Carreras son Carreras” e aquela teria seu momento.

 

Na volta de apresentação, um evento que, a princípio, pouco influenciava na vida de Bernoldi acabaria sendo crucial em sua passagem pela categoria: O McLaren MP4/16 do pole-position, David Coulthard, não saiu do lugar. Um problema eletrônico no sistema de largada foi o responsável pela perda que viria a se mostrar maior que qualquer estimativa. Coulthard só conseguiu sair do lugar empurrado e como determinava o regulamento, teria de largar dos pits. Com isso Bernoldi era o 19º.

 

 

Na largada, Bernoldi conseguiu deixar o companheiro Jos Verstappen para trás e ainda herdou uma posição com o acidente de Nick Heidfeld na Mirabeau. Com isso, o brasileiro passou na primeira volta em 17º lugar e à frente do companheiro de equipe. No sinuoso e estreito traçado do principado, Bernoldi lutava para manter o carro no traçado correto e evitar problemas, como um parceiro capaz de arriscar tudo como fez Jos Verstappen, que na 8ª volta foi pra cima do brasileiro e recuperou a posição. Bernoldi caiu para 18º e depois dele quem vinha? A McLaren de David Couthard, babando no capacete, tentando recuperar o tempo perdido. Para piorar, o tubo da garrafinha de isotônico havia arrebentado ainda na volta de apresentação. Só um piloto sabe o que isso significa em uma prova de quase duas horas!

 

É claro que David Coulthard virava tempos muito mais rápidos que Enrique Bernoldi, mas Monaco tina uma coisa: pra passar, o piloto que vai na frente tem que cometer um erro muito grande ou ser muito frouxo, ou ser muito bonzinho. O Mansell que o diga, com aquela super Williams não conseguiu passar o Senna com aquela McLaren de motor Fordinho.

 

Coulthard chegou rapidamente. Era apenas uma questão de pegar o vácuo na reta dos boxes (que não é nada reta), frear na Saint Devote e deixar o carro da Arrows para trás. Caso não desse ali, tinha a freada depois do túnel. Couthard ficou uma volta inteira atrás do carro nº 15 e nada. As voltas foram passando e nada do escocês conseguir a ultrapassagem.

 

 

Os Comentaristas e narradores, assim como as câmeras de TV começaram a destacar o que estava acontecendo. Mesmo pilotando um poderoso MP4/16, Coulthard não conseguia aproximar-se o suficiente para tentar ultrapassar o Arrows de Bernoldi. Com isso os planos de tentar reduzir ao máximo o prejuízo de ter perdido a posição na primeira fila, que ficou ainda maior com o abandono de Mika Hakkinen e a dobradinha da Ferrari que seguia na ponta.

 

Coulthard começou a se irritar, tentava de tudo, fugindo de suas características de piloto de guiada limpa, técnica e suave. Nisso o rádio devia estar falando cobras e lagartos. Enquanto o desespero batia na McLaren, a turma da Arrows estava vibrando, não apenas com a pilotagem segura do brasileiro, mas também com a exposição do carro na TV.

 

Bernoldi conseguia permanecer à frente de Coulthard com bastante destreza, mesmo com um carro tão inferior. Ron Dennis esbravejava e as câmeras de TV mostravam isso, mas ele estava reclamando do que? Enrique Bernoldi estava apenas fazendo a mesma corrida dos outros 21 que largaram tentavam fazer, ou seja, tentando obter o melhor resultado possível. E ali não era retardatário atrapalhando, era disputa por posição!

 

 

A corrida seguia e apenas os abandonos permitiam que Couthard subisse algumas posições. Se a corrida já estava perdida, agora até mesmo tentar marcar algum ponto estava ficando complicado. Pior ainda foi receber a informação no rádio – e depois nos retrovisores – de que os líderes se aproximavam para colocar uma volta nos dois. Na volta 26 Michael Schumacher colocou uma volta sobre David Couthard, que vina sendo seu direto perseguidor no campeonato daquele ano.

 

A passagem do líder poderia ser uma chance para tentar passar Bernoldi, mas nem isso David Couthard conseguiu. A ultrapassagem só veio na volta 42, tendo o escocês ficado 35 voltas atrás da Arrows do brasileiro.

 

Depois de livrar-se do indigesto oponente, Couthard enfrentou menos dificuldades para avançar, e ainda conseguiu conquistar a quinta posição, marcando dois pontos. Enrique Bernoldi conseguiu aquele que seria o seu segundo melhor resultado na temporada, finalmente lavando o carro até o final da prova e terminando em 9º lugar (no GP da Alemanha, Bernoldi foi o 8º).

 

 

Terminada a corrida, retornando aos boxes exaurido, Enrique Bernoldi dava de cara com alguns homens vestidos de cinza se aproximavam querendo confusão. No meio deles, um furioso Ron Dennis.

 

– “O que diabos você estava fazendo aqui hoje?”, berrou o chefão da McLaren.

– “Estava correndo, oras”, respondeu um Bernoldi, cansado e sem forças.

– “Sério? E você acha que segurar um dos líderes do campeonato daquela maneira é correr de maneira esportiva?”, gritou Dennis, vermelho como uma lagosta.

– “Não fiz nada de errado. Era disputa de posição”, Respondeu Bernoldi.

 

Ron Dennis ameaçou “acabar com a carreira de piloto” de Enrique Bernoldi ali, na frente de todo mundo. Bernoldi contou tudo o que havia acabado de acontecer ao seu chefe de qeuipe, Tom Walkinshaw e aí deixou a briga com quem era de direito.

 

À portas fechadas, Tom Walkinshaw chamou Ron Dennis para uma conversinha pouco amistosa. “Ron, no dia em que você pagar os meus pilotos, você poderá dizer a eles o que devem fazer. Enquanto eu pago, mando eu. OK?”, disparou – curto e grosso – o dirigente da Arrows. Dennis não reagiu (ele sabia que o ‘Walkinshark’ não era flor que se cheirasse). O recado estava dado.

 

Para a mídia, Walkinshaw tirou onda da situação, dizendo que a posição da McLaren era “inaceitável”. E que não conversaria com Ron Dennis, pois ele não ouve ninguém e pensa que é Deus. “Só quero encontrá-lo quando for pegar meu barco aqui no porto. Já que Ron é tão poderoso assim, vou pedir para ele escancarar o mar para eu passar”, arrancando risadas dos repórteres.

 

Bernoldi ainda correu a temporada de 2002 pela Arrows, mas teve o contrato encerrado ai final daquele ano e não pilotou mais na F1. Contudo, já merece meu respeito por ter enfurecido o Ron Dennis!

 

Um abraço,

 

Paulo Alencar

 

 

 

 

Agradecimentos ao Gerbis que enviou as fotos do seu site na Hungria e ao Motorsport.com