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Written by Administrator   
Wednesday, 29 November 2023 21:50

No passado dia 20, segunda-feira, no dia a seguir ao final do mundial de ralis, no Japão, o finlandês Kalle Rovanpera anunciou que iria correr a temporada de 2024 a tempo parcial, dividindo o carro com o francês Sebastien Ogier. No vídeo oficial, o piloto finlandês afirmou que já guia há 15 anos, e pretende tirar um tempo para recuperar de forma física e mental, logo, abdicará de lutar pelo título em 2024. 

 

Detalhe curioso: Rovanpera tem 23 anos, enquanto Ogier fará 40 no próximo dia 17 de de dezembro.

 

A noticia da temporada parcial do piloto finlandês, agora bicampeão do mundo, já era falada há semanas. As razões eram algumas, desde o cumprimento do serviço militar, que é obrigatório na Finlândia, até uma espécie de “vazio existencial”, cumprido que está o seu objetivo de ser campeão do mundo, eram especulados. E quando Timo Jouki, o seu empresário, ter confirmado que estava a negociar o contrato dele com a Toyota para 2024, os rumores só aumentaram. E um dia depois de ter sido terceiro classificado no Rali do Japão, a prova final de 2023, o anuncio feito pelo filho de Harri Rovanpera só surpreendeu quem estava desatento.

 

 

Uns meses antes, soube-se da noticia de que o canadiano Nicholas Latifi, agora com 28 anos e com três anos de Formula 1 nos ombros, como piloto da Williams, decidiu fazer uma pausa na carreira no sentido de prosseguir um MBA, um Masters em Administração no London Business School. Ele fez o anuncio através da sua conta pessoal no Twitter. Pelo menos não foi tão radical quando Jaime Alguersuari, que depois de três temporadas na Formula 1 e ser um dos “originais” na Formula E, em 2014, decidiu cortar com o automobilismo em 2015 para se concentrar na sua carreira como DJ. Só em 2022 decidiu regressar ao karting.

 

Quem conhece a história de Kalle – aliás, escrevi sobre ele neste site em agosto de 2022, nas vésperas do seu primeiro título mundial – falei que o conhecia desde os seus nove anos quando no frio finlandês, ele correu ao volante de um Toyota Startlet, dando as suas primeiras voltas num lago gelado ao pé da sua casa. Harri colocou o video na Internet, que causaou sensação, como seria de esperar.

 

 

Mas Kalle começou a correr desde os 14 anos. Como não podia fazr na Finlândia, foi para a Letónia, onde se pode correr até abaixo dos 16 anos. E aos 15, já era campeão. E mal fez 18, ganhou uma licença da FIA, e já na altura, era piloto da Toyota, depois de ter convencido gente como Jari-Matti Latvala, ex-piloto e agora, o responsável da marca japonesa.

 

Claro, muitos pensam “tem tudo, pode bater recordes, porque fazer isto?”. Primeiro que tudo, temos de saber o que ele quer na realidade. Quer bater os recordes do Sebastien Loeb e marcar uma era, ou quer ser só campeão do mundo? Todo e qualquer piloto tem os seus objetivos, quando escolhe isto. Uma geração antes, um piloto formava-se pela vontade dele, e por vezes, contra a familia. Agora, os filhos de pilotos são atirados nisto desde crianças. Olhem para Max erstappen, filho de Jos erstappen, que começou cedissimo nos karts, e desde muito cedo teve de aprender – por vezes da pior forma – como ser um piloto competitivo e implacável. E claro, teve resultados: bastou um ano de monolugares para chegar à Formula 1, com 17 anos. E aos 26, já é tricampeão do mundo.

 

 

Mas o proprio Kalle afirma que já tem 15 anos de guiar carros por trás das costas. Ele tem 23. É toda uma vida. E ser pressionado desde cedo para que saiba todos os aspectos do carro, ter conhecimentos de mecânica e engenharia, passar 250 dias por ano fora de casa, entre testes, ralis, “briefings”, para não falar das viagens de carro e avião... que vida estes garotos têm? E como nos habituamos a talentos precoces, o contrário de gente que corria com 35 ou 40 anos – Fangio foi até aos 46, recordo – achamos agora que alguém que tenha 25 anos já é “velho”, já não serve.

 

E tem outra coisa: bem vistas as coisas, isto é trabalho. Colocar um garoto de 13, 14, 15 anos num carro para ser competitivo é quase trabalho infantil. Nesta geração, muitos garotos – não interessa se é ralis ou monolugares – são colocados perante a profissionalização nessa idade. Estão na escola, e tem de, ou abandonar o ensino, ou fazer “homeschooling”, ou seja, aprender em casa, com ensino à distância, e gente a mandar os testes e as matérias por e-mail. E ainda por cima, estes garotos deixam de estar com rapazes e raparigas da sua idade, acabando por relacionar com alguém, no mínimo, o dobro da sua idade, formados em engenharia, ou seja, educação superior.

 

 

E estão desconectados da realidade. Um dia, mais tarde, olham para o espelho e afirmam “não quero mais”. Mas nessa altura, os pais afirmam que não podem desistir do sonho, porque investiram dezenas, senão centenas de milhares de euros.

 

É claro que Kalle Rovanpera e Max erstappen querem e adoram o automobilismo. Mas querem nos seus termos. E viver a vida é um deles. São “veteranos”, apesar da sua provecta idade, e no caso do finlandês, deve ter lido os sinais de alerta e chegado a conclusão que é melhor levantar o pé que aplicar com força no pedal do travão. E só fez bem. A sanidade mental tem de estar acima de todas as vitórias nas classificativas e nos ralis, bem como os campeonatos. Tem tempo para ganhar muitos mais, e bater recordes, até aos 50 anos, se quiser.

 

 

O que interessa é a velha máxima: mens sana in corpore sano.

 

Saudações D’além Mar,

 

Paulo Alexandre Teixeira

 

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Nota NdG: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Nobres do Grid.

 

    
Last Updated ( Thursday, 30 November 2023 08:57 )