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A história mortal de Donald Campbell PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Tuesday, 25 January 2022 22:10

Se no mês passado falei sobre Malcom Campbell, um dos recordistas mais conhecidos de antes da II Guerra, a par de John Cobb e Henry Segrae, este mês é a altura de recordar Donald Campbell, filho de Malcom e que também herdou a obsessão pela velocidade. A certa altura da sua vida, chegou a ter o recorde em terra e na água, ambos feitos no mesmo ano, mas a sua busca por ser o melhor acabou por ter um desfecho trágico a 4 de janeiro de 1967, há precisamente 55 anos. 

 

Donald, nascido a 23 de março de 1921, já tinha experiência e o “bichinho” da velocidade, especialmente depois da guerra. Com a morte do seu pai, em 1948, esperou pelo ano seguinte para tentar a sua sorte com o barco do seu pai, o Bluebird K4. Mas não só não conseguiu, mas soube que Stanley Sayres melhorou o recorde para os 257 km/hora, para além das capacidades do seu barco. 

 

Na altura, Campbell seguia as tentativas de velocidade de John Cobb. Ambos se davam bem, porque ele tinha sido amigo do seu pai. Em 1952, ele tinha construído o "Crusader", o primeiro barco com um motor a jato. E enquanto ele reconstruia o "Bluebird", Cobb ia para o Lago Ness, na Escócia, para bater o recorde de velocidade sobre a água. Mas a 29 de setembro desse ano, durante uma nova tentativa, o barco de Cobb desequilibra-se sobre uma onda e desfaz-se, causando a morte imediata do piloto, que fora cuspido do seu barco no impacto. 

 

 

Ali, Campbell ficou a saber que aquele poderia ser o seu destino, e que o seu pai até foi um privilegiado por ter tido uma longa vida. 

 

OS SEUS RECORDES 

 

No meio disto tudo, o seu barco era reconstruído, e tornara-se no Bluebird K7. A sigla tinha a ver com o registo do banco Lloyd's para os títulos mais prestigiados, dado que o seu pai tinha trabalhado na prestigiada firma londrina. O seu símbolo era o “8” invertido, que representava o infinito, e em junho de 1955, estava pronto para as suas tentativas. E o primeiro recorde com o seu nome aconteceu a 23 de julho, quando chegou aos 325,60 km/hora, regressando o apelido “Campbell” no registo dos recordes, e também - com um ponta de orgulho - o recorde voltava a ser britânico.  

 

 

Depois da água, regressou à terra, onde outra ideia se apossou dele: ter ambos os recordes. Outro carro Bluebird foi construído, com a ajuda da Dunlop e da BP, e com a ajuda de Sir Alfred Owen, que iria ser o dono da BRM, graças à sua firma, a Rubbery Owen. Batizado de CN7, tinha um turbina e cerca de 4450 cavalos, com a esperança de alcançar 450 a 500 milhas por hora, ou... 800 km/hora. 

 

Pronto na primavera de 1960, e equipa foi para o lago salgado de Bonneville, no estado americano do Utah, e a ideia inicial era de chegar aos 700 km/hora nesse ano, ficar com o recorde e depois regressar em 1962, para levar o carro ao limite, ultrapassando os 800 km/hora. Pelo meio, regressaria à água e melhoraria o recorde com o outro Bluebird, e depois, quem sabe, abandonaria a competição, porque já estava perto dos 40 anos e sabia que o futuro era o jato puro e a barreira do som.

 

 

Contudo, na sua sexta tentativa, a 360 milhas por hora - cerca de 579 km/hora - perdeu o controle do carro e despistou-se. Foi hospitalizado com fratura craniana e um tímpano perfurado, mas sobreviveu para contar a história. Tinha sofrido o acidente mais rápido em terra e iria contar a história.

 

Restabelecido do acidente, disse que iria regressar para tentar de novo. O carro foi reconstruído com a ajuda de Alfred Owen, e Campbell chegou à conclusão que Bonneville era muito curto para ele. A alternativa estava no outro lado do mundo, mais concretamente no lago Eyre, na Austrália, também seco e bem maior - a sua bacia tem 9500 km quadrados e tinha uma pista de 32 quilómetros para tentar bater recordes - e naqueles tempos, estava seco devido à escassa chuva, pois em 1962, não havia precipitação há quase uma década. 

 

TEMPOS ERRADOS

 

Contudo, quando o Bluebird ficou pronto, em finais de 1962, Campbell queria ir logo para a pista. A reconstrução fora lenta - ficou pronto nove meses mais tarde que o previsto - e as modificações feitas estavam por experimentar. Em novembro, começaram os testes, mas poucos dias depois, começou a chover no local, por mais de duas semanas, inundando o lugar e inviabilizando qualqur tentatiba. E para piorar as coisas, o recorde de terra tinha sido batido por um americano, Craig Breedlove, no seu “Spirit of America”, um puro jato, colocando-o a 655,73 km/hora. E em Bonneville, lugar que Campbell achava ser “demasiado curto”...

 

 

Tentativas em março de 1964 não deram resultado, e para piorar as coisas, um dos patrocinadores, a BP, saiu do projeto. Sentindo-se apertado - havia criticas em casa, especialmente de Stirling Moss, que não achava sentido nas tentativas de Campbell - queria provar a todos que estavam errados. E isso aconteceu a 17 de julho desse ano. Mas as condições não eram ideais, pois a pista estava húmida, a superfície frágil e o risco de acidente era elevado. Duas passagens e com o pescoço em jogo, conseguiu uma média de 648,73 km/hora. O recorde era de novo seu... 

 

Mas não estava feliz. Apesar do desabafo de satisfação – “Conseguimos, conseguimos voltar a ter aquele filho da p*** de novo nas nossas mãos!” – o carro chegou a ser medido a um topo de 710 km/hora, e isso o irritou, porque achava que o seu potencial não tinha sido plenamente usado. Mas a irritação foi de pouca dura, porque foi a outro lugar na Austrália para tentar outro recorde. No Lago Dumbleyung, nos arredores de Perth, na Austrália Ocidental, estava o Bluebird K7 à sua espera para ir buscar o recorde de velocidade na água. E não tinha muito tempo: queria faze-lo até ao final do ano. 

 

 

As primeiras tentativas foram frustrantes, mas conseguiu – no último dia do ano. A 31 de dezembro, véspera de Ano Novo, alcançou 444,71 km/hora perante uma multidão em delírio. Pela primeira – e única altura, até 2022 – ele era o homem mais rápido em terra e água.   

 

"ACHO QUE FICAREI SEM CABEÇA"

 

Em 1965, com os novos critérios da FIA a relegarem o Bluebird CN7 para o museu, Campbell pensa em construir uma máquina nova, totalmente a jato para poder alcançar as 850 milhas por hora, ou os 1350km/hora, sendo a primeira máquina a aproximar-se da barreira do som. Mas quebrá-lo é, na realidade, o sonho de Campbell, porque assim garantia definitivamente o seu lugar nos livros de história. Ele achava que em três anos, o carro estaria pronto e as primeiras tentarias aconteceriam no final de 1969, apesar de já caminhar para os 50 anos.

 

 

Para 1966, e também para arranjar publicidade para o seu projeto para o carro-foguete, Campbell regressou à água com o seu Bluebird K7. O objetivo era chegar para os 480 km/hora, ou as 300 milhas por hora, se calhar, passar dos 500 km/hora. O lugar escolhido foi Conninston Water, no Lancashire inglês, e Campbell esperava resolver a questão antes do final do ano, quando lá chegou, em setembro. Contudo, problemas no motor o impediram de tentar ao longo do outono de 1966. 

 

O barco ficou pronto em dezembro, e nas primeiras tentativas, andou a rondar os 400 km/hora, pronto para bater o recorde. Mas por causa de problemas com o sistema de alimentação de combustível, Campbell não conseguia chegar à marca pretendida. Alguns dias no estaleiro para tentar resolver o problema, e tudo ficou pronto por alturas do Natal. Com isso, agora, ele esperava por um dia perfeito para tentar. E este só apareceu depois do Ano Novo, a 4 de janeiro. 

 

 

Na véspera, ele estava a jogar póquer com os amigos quando lhe saiu uma mão com a Rainha e o Ás de Espadas, precisamente as mesmas que Mary, a rainha da Escócia, jogava na véspera da sua decapitação, em 1587. Ao reparar na coincidência, Campbell disse que tinha um mau pressentimento e e acabou dizendo: “acho que acabarei sem cabeça, desta vez.” 

 

O dia da tentativa estava calmo e frio. Campbell levou o seu barco até ao meio do lago e partiu para a sua primeira passagem pela água. Aconteceu sem problemas e alcançou um pico de 500 km/hora, mas a média registada foi de 478,9 km/hora. Neste tipo de tentativas de recorde, o limite para a segunda passagem é de uma hora, e normalmente, isso é usado para reabastecer, mas desta vez, ele retomou o caminho de regresso sem fazer isso, provavelmente para evitar as ondas causadas pela sua passagem pela água, que estavam a bater nas margens. 

 

 

No regresso, quando começou o seu quilómetro lançado, estava a alcançar velocidades na ordem dos 528 km/hora, bem acima do seu recorde. Mas estando mais leve por causa de ter menos gasolina estava a fazer com que o barco ficasse mais leve na frente, arriscando ir no ar. E foi o que aconteceu, quando estava a meio do caminho no quilómetro lançado. A 490 km/hora, o barco começou a voar, dar uma pirueta e a bater fortemente na água, afundando-se em menos de um minuto. Ficara à vista de todos que, aos 45 anos de idade, Donald Campbell tinha morrido. A sua existência tinha acabado abruptamente no momento do impacto do barco na água. 

 

Ele era um piloto extremamente supersticioso. Não gostava de pilotar às sextas-feiras, não se separava de “Mr Whoppit”, o seu ursinho de pelúcia desde a infância, odiava o numero 13 e a cor verde, e tinha um interesse no paranormal. Quando morreu, o seu ursinho foi encontrado no meio dos destroços, a flutuar na água, bem como o seu capacete. Mas o seu corpo não foi, e após duas semanas, as buscas foram encerradas. Apenas foi encontrado em maio de 2001, 34 anos depois do seu acidente, nas operações de resgate aos destroços do Bluebird. Pequeno detalhe: não tinha a cabeça, e esta nunca foi encontrada. Parecia que Campbell tinha razão...

 

 

Poucos dias depois da sua morte, a 28 de janeiro de 1967, foi postumamente condecorado com a “Queen's Commendation For Brave Conduct”, uma condecoração por bravura, devido “à sua coragem e determinação em alcançar um novo recorde do mundo de velocidade.” Isso veio acrescentar ao seu CBE (Commender of the British Empire), atribuído em 1960, pelas suas tentativas em terra e na água.

 

Donald Campbell está enterrado do cemitério de Conninston, o local do seu acidente mortal. Na aua tumba, está pintado um pássaro azul e não é raro encontrarem-se ursinhos de peluche, deixados pelos seus admiradores.

 

Saudações D’além Mar,

 

Paulo Alexandre Teixeira

 

 

Nota NdG: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Nobres do Grid.

 

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Last Updated ( Tuesday, 22 February 2022 15:03 )