Vettel queima a largada no Japão (outubro 2019) e não foi punido, joga o carro para cima de Leclerc em Interlagos (novembro 2019) e também não é punido. Esta coluna será mais uma da série, “tentando explicar o inexplicável”. Na verdade, esta eu nem vou tentar explicar por que estes fatos fogem ao meu conhecimento desportivo e entram na linha de “outros interesses do esporte”. Por que será que existe tamanha isenção às faltas do Vettel? Apenas tentarei expor aqui, o que acontece no race control, em corridas brasileiras e em algumas situações semelhantes que podem até isentar certas penalizações, porém o que realmente aconteceu na Fórmula 1 em Interlagos nós nunca saberemos. (podemos até supor, mas nunca saberemos...). Relembrando a prova do Japão, Vettel visivelmente queimou a largada e não foi penalizado. (queima de largada é qualquer movimento do veículo antes de autorizada a partida, mesmo que o piloto não tenha tido vantagem sobre esta queima). Na coluna que escrevi no mês passado, expliquei algumas coisas sobre estes procedimentos, mas disse que pela primeira vez estava vendo Comissários complacentes e inclusive estabelecendo um “limite de tolerância” para este movimento que eu nunca havia visto antes. Agora uma visível mudança de trajetória do Vettel para cima do Leclerc na reta oposta de Interlagos que também não houve penalização. Imagens mostram o movimento do carro do Vettel evidenciando a queima de largada (reprodução canal +) A primeira dúvida é: será que não houve penalização por serem da mesma equipe? Teoricamente isso jamais poderia acontecer! Existe apenas uma situação que isentaria o Vettel de uma punição, independente de serem da mesma equipe ou não, explicarei mais adiante, mas todos perceberão que a explicação que darei, não seria “verdadeira” neste caso. Antes das explicações, vamos tentar entender o que ocorre na Torre em situações como esta: A Torre é composta por 3, ou 5 Comissários, um Diretor de Provas e seus adjuntos, teoricamente, o procedimento é o seguinte: acontece o incidente na pista, os Fiscais de Pista relatam ao Diretor de Provas e este encaminha a ocorrência aos Comissários Desportivos para que a julguem e decidam se deverá haver penalização ou não. Imagem do momento do toque entre Vettel e Leclerc em Interlagos. Reprodução do Site F1.
Havendo, entregam a ordem de penalização ao Diretor de Prova para este aplicar a pena. Na prática, este processo é abreviado, pois com a facilidade atual de aquisição de imagens, quando o fato ocorre na pista, os Comissários já se antecipam a tentam julgar o mais breve possível, para chegarem a um veredito antes do término da prova, não conseguindo, por falta de imagens claras ou ainda entendendo que os Pilotos envolvidos no incidente devam ser escutados, o veredito será apresentado somente após estas ações, e se houver penalização, deverá ser aplicada no resultado da prova após seu encerramento. No último andar da torre de direção de prova em Curitiba, Diretor de Prova, Comissários e Adjuntos. Com relação ao Vettel, temos uma ocorrência antiga dele com Mark Webber no GP da Turquia em 2010, bem semelhante a esta que aconteceu com Leclerc em Interlagos, porém, naquela, a disputa era pela liderança e apenas o Vettel ficou de fora da prova, Mark Webber continuou e chegou em terceiro, diferente daqui do Brasil, onde a disputa era pelo 4º lugar e os 2 Pilotos da Ferrari ficaram de fora da corrida. Normalmente, os Comissários começam suas análises avaliando o prejuízo de cada Piloto no acidente, no caso do Piloto causador do acidente ter tido um prejuízo maior do que o Piloto vítima, é possível que os Comissários entendam que este prejuízo já bastaria como penalização, mas o Webber também teve prejuízo, já que vinha liderando a prova e caiu para 3ª posição, então, o Vettel só não teria uma punição se o Webber o isentasse de culpa. GP da Turquia, 2010. Sebastian Vettel e Mark Webber se tocam e abandonam. Fernando Alonso agradeceu. Bem, como já expliquei o funcionamento do “race control”, vou tentar descrever aqui, o que eu “imagino” que deva ter acontecido com os Comissários que julgaram esta ocorrência de Interlagos: este acidente estava muito fácil de se julgar, pois a Fórmula 1 disponibiliza muitos recursos e principalmente muitas imagens à disposição dos Comissários e neste acidente, estava bem nítido que o Vettel fez uma mudança de trajetória, tocando no Leclerc causando a quebra da suspensão da sua Ferrari e o furo do pneu do Vettel, deixando os dois de fora da prova. Provavelmente os Comissários fizeram um “pré” veredito, onde aplicariam uma penalidade ao Vettel, mas optaram por aguardar e escutar os Pilotos antes de darem a penalização, então, ao escutarem os Pilotos, principalmente o Leclerc, este deve ter isentado o Vettel de culpa. Esta é a única alternativa de um piloto que tenha causado um acidente tão visível não ser penalizado, ou seja, quando não há outros envolvidos e a vítima isenta de culpa o responsável. Agora, porque o Leclerc isentou o Vettel de culpa? Deve ser pelo mesmo motivo que o Webber também o isentou em 2010, “ordem da equipe”. Algumas vezes, já presenciei situações semelhantes, onde os Comissários já têm um veredito, mas optam por uma oitiva entre os pilotos e de repente o Piloto prejudicado alega que “ninguém teve culpa” e que “foi coisa de corrida”. Nestas situações os Comissários só manteriam a penalização se outros pilotos também envolvidos na ocorrência, tivessem tido prejuízos com o fato. Estes assuntos deixam claro o que digo há algum tempo, a Fórmula 1 não é um esporte, é um grande negócio que utiliza as corridas para sua realização. O interesse de um Promotor ou uma Equipe se sobrepõe a outros interesses desde que não fira a desportividade. Isto não é uma crítica, é apenas uma constatação, pois se a Fórmula 1 chegou ao sucesso que é hoje é por conta de toda exposição de mídia que ela consegue e obviamente do dinheiro que ela movimenta, afinal qualquer categoria se inspira na F1 para tentar obter bons resultados de mídia, bons lucros e desta forma conseguir sobreviver. E convenhamos....jogo de equipe existe desde a época do Emerson, tanto que ele saiu da Lotus em 1973 por conta de uma “quebra” de acordo entre ele, Colin Chapman e Ronnie Peterson no GP da Itália. (para quem quiser ler sobre: http://globoesporte.globo.com/motor/formula-1/noticia/2014/10/40-anos-do-bi-fittipaldi-lembra-rixa-com-lotus-que-o-fez-ir-para-mclaren.html )
Brigas e Abraços. Até que ponto as Equipes têm influência sobre as brigas e disputas nas pistas e fora delas? Hoje em dia, os contratos entre equipes e pilotos fazem com que os pilotos se submetam aos interesses das equipes, na verdade acho que sempre foi assim, mas hoje os pilotos ganham mais, porém também se submetem mais. Todos sabem das diferenças entre Senna e Prost, mas os 2 se abraçam no pódio após o título de Ayrton Senna em 1988. Nelson Piquet e Eliseo Salazar, trocam socos no circuito de Hockenheim em 1982 e algumas semanas depois já haviam superado o episódio. Vários anos depois, os dois se reencontram e "revivem a cena" de 1982. Resumindo tudo e tentando responder a pergunta lá de cima: Será que não houve penalização por serem da mesma equipe? Pode ser que sim. A Ferrari deve realmente ter interferido junto aos pilotos e sabendo que os Comissários acatariam uma posição do Leclerc isentando o Vettel de culpa, deve ter orientado o Leclerc a agir desta forma, apesar de, ao observarmos seus gestos e escutarmos o que disse no rádio no momento de acidente não parece que ele achava que o Vettel não tinha culpa...
Apesar do crédito, a câmera on board é do carro do Leclerc. Imagem extraída do site da Fórmula 1. É isso! Abraços. Sergio Berti
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