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Vettel queima a largada e não é punido (mais uma da série tentando explicar o inexplicável) PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Tuesday, 12 November 2019 04:49

O mundo do esporte a motor é cheio de desafios e um deles tem sido tentar explicar coisas que temos visto nas corridas no Brasil e no mundo que as vezes vão em direção oposta as muitas das coisas que no entendimento geral são as regras a serem seguidas e por conseguinte, o descumprimento das regras deve vir seguido de uma punição de acordo com a infração.

 

No GP do Japão de 13 de outubro de 2019, o Vettel nitidamente queimou a largada movimentando sua Ferrari antes de apagarem-se as luzes vermelhas.  Então, por que será que ele não foi punido?

 

Com a visão das duas fotos logo abaixo observem nos destaques que a roda se aproxima da faixa quadriculada antes do semáforo se apagar.

 

O que diz o CDA - Código Desportivo do Automobilismo da CBA?

 

SEÇÃO VII – DA QUEIMA DE LARGADA

Art. 118 - A queima de largada ocorre quando um piloto, sem ordem do largador, e antes que lhe seja mostrada a sinalização apropriada, avança da posição que lhe foi designada para largar.

118.1 – Nas largadas lançadas, será considerada como queima de largada o carro que se posicionar fora do alinhamento do pelotão.

118.2 – Todo piloto que tiver queimado a largada deverá receber uma das seguintes penalizações:

 

I - LARGADA EM GRUPO EM PROVA DISPUTADA EM CIRCUITO – passagem pelos boxes em velocidade reduzida – Drive-Through.

No CDI – Código Desportivo Internacional, também retrata da mesma forma a queima de largada:

 

Artigo 8.1 - Largada

8.1.2 – Todo o Automóvel será considerado como tendo largado no instante em que o sinal de Partida é dado independentemente do método de largada utilizado. Em caso algum este sinal deve ser repetido.

 

Artigo 8.6 – Falsa Largada (queima)

8.6.1 – Há uma falsa Largada quando um Automóvel:

8.6.1.a – não esteja na posição correta de Partida (prevista no regulamento desportivo aplicável ou pelos Regulamentos Particulares), ou

8.6.1.b – abandone a posição que lhe estava destinada antes que o sinal de Partida tenha sido dado; ou

8.6.1.c – esteja em movimento quando o sinal de Largada for dado durante uma Largada parada, ou

8.6.1.d – acelere mais cedo ou de forma irregular durante uma Largada lançada ou não mantenha a formação prescrita (tudo conforme descrito no Regulamento desportivo aplicável ou nos Regulamentos Particulares, ou conforme especificado pelo diretor de Prova ou diretor de corrida nos briefings).

8.6.2 – Toda a falsa Largada constituirá uma infração aos regulamentos.

 

Como os códigos, CDA e CDI apresentam apenas genericamente as regras, infrações e penalizações, então os Regulamentos Desportivos ou Particulares geralmente enfatizam os detalhes dos procedimentos e penalizações se assim desejarem, podendo dar maior ou menor penalização para as penalidades, desde que não infrinjam os códigos acima.

 

Desta forma o Regulamento Desportivo da Fórmula 1 é bem claro em seu Artigo 36.13:

“Uma punição será imposta por uma queima de largada se julgada detectada através do transponder da cronometragem homologada pela FIA que será instalado nos carros”, sendo que as penalidades especificadas serão um drive-through ou um stop-and-go de 10s.

 

Uma punição será imposta a qualquer piloto que:

a) se mover antes de o sinal de largada ser dado, em um julgamento que será feito detectado pelo transponder aprovado e fornecido pela FIA e que será instalado nos carros, ou;

b) Se posicionado no grid de forma que o transponder não possa detectar o movimento após o sinal de largada ser dado.”

 

  Imagens que mostram o movimento do carro de Sebastian Vettel evidenciam a queima de largada (Reprodução Canal +)

 

Pelo entendimento atual da CBA, pautado no CDA, assim como no CDI e no Regulamento Desportivo da F1, nas largadas paradas, “qualquer movimento do veículo antes do apagar das luzes será considerada queima de largada”. (mesmo que o carro não saia,  movimentou = queimou).

 

Então o Vettel queimou a largada?   Sim!

 

E por que não foi punido?

 

Vamos lá pessoal, para “tentar” explicar tenho que relembrar algumas coisas que já escrevi aqui, de como agem os Comissários Desportivos  e os Diretores de Provas durante as corridas.

 

Os Comissários são os juízes da prova e tem como fundamental responsabilidade julgar qualquer ação que contraponha ou desrespeite o regulamento, lembrando que o regulamento retrata a ideia principal de uma competição transformada em palavras e transcritas em um papel, e por conta disso existem interpretações sobre o que está escrito. (o fato é que não se consegue, através da escrita, traduzir exatamente a ideia principal, por isso que muitas vezes escutamos engenheiros, preparadores e chefes de equipes dizendo que “agiram em uma brecha do regulamento”, neste caso, fica bem claro que eles sabiam da “ideia principal” e conseguiram achar uma falha na escrita ou ainda uma dupla interpretação do texto. Na minha opinião isso é antidesportivo, porém é difícil penalizar nestas situações, pois as penalizações devem ser pautadas no que está escrito nos regulamentos...).

 

Vejam um exemplo simplista, mas que facilitará o entendimento:

 

- no regulamento de uma categoria de turismo nacional dizia que: - o carro deverá manter o chicote original de fábrica (chicote são todos os fios elétricos do veículo, embalados num conduíte).

 

Um preparador descobriu que se usasse um fio mais grosso que o original, a bomba de combustível funcionaria melhor. Então ele manteve o chicote original e fez um fio passando por fora do chicote para ligar à bomba e melhorar a alimentação de combustível do seu carro. (o carro dele ficou melhor do que os outros).

 

Vejam, ele sabia que a ideia era manter todos os carros originais, mas como o texto do regulamento dizia apenas “manter” o chicote original, ele usou a sua interpretação para burlar o regulamento. (burlar o regulamento não é enganar os Comissários, na verdade é enganar todos os outros concorrentes).

 

Neste caso, o engenheiro ou preparador usou a interpretação para ter vantagem, da mesma forma que os Comissários também podem fazer uso da interpretação para penalizar, porém, nesta situação acima, se os Comissários penalizarem, muito provavelmente a equipe recorrerá ao tribunal desportivo vencerá, já que o tribunal desportivo não é tão conhecedor das práticas de uma corrida e farão seu julgamento, baseado principalmente pelo que está escrito no regulamento.

 

Assim sendo, no ano seguinte o regulamento já veio com a frase alterada para “manter e usar obrigatoriamente o chicote original. Proibido qualquer ligação alternativa”.

 

Voltando ao nosso assunto, mas e o Vettel, queimou ou não queimo a largada?

 

Sim, queimou!

 

Em 1995 o Rubinho Barrichello, correndo de Jordan, foi penalizado por queima de largada no GP da Inglaterra, por ter movimentado o seu carro antes de apagarem as luzes de largada. Na verdade, o que  ocorreu é que após acenderem-se as luzes, o Rubinho ao engatar  a primeira marcha, seu carro deu um “pulinho” para frente, quem for desta época, de carros com câmbio manual e embreagem no pé, lembra de como era comum o carro dar este pulinho para frente na primeira engatada, mas segundo a explicação dos comissários da  época, é que o que determinava a queima, era o transponder (sensor) de largada que “alertava” qualquer movimento do veículo desde o acender das luzes de largada até o seu apagamento, e o sensor de largada do carro do Rubinho deu o alerta de queima, então não tinha o que fazer.

 

   Rubens Barrichello e sua Jordan 1995. Ele também foi punido por queima de largada. Foto do Wikpedia

Exatamente como ocorreu agora com o Vettel, porém, com interpretações diferentes. E quem está certo ou errado? Não existe certo ou errado, existe a interpretação de momento e também o que foi conversado no briefing.

 

Por isso que eu inicio a coluna – “tentando explicar o inexplicável”. Não dá para falar exatamente o porquê os Comissários agiram desta forma, pois eu não estava na torre, mas segundo o documento que eles apresentaram ao final da corrida, disseram que houve a queima, porém ela estava dentro da “margem de tolerância”. E isso é justo? Pode até não ser, mas se foi combinado em briefing ou se é um procedimento dos atuais comissários então mesmo não sendo justo, é “legal”.

 

Este assunto me remete à última prova da Porsche GT3 Carrera Cup que aconteceu em 26/10/2019 em Goiânia, era uma prova de endurance e eu era o Diretor de Prova.

 

Cinco carros foram penalizados por queima de faixa branca (ou amarela) de entrada de box. Entre estes carros estava o carro da equipe de Cacá Bueno e Sylvio de Barros. Assim que foi apresentada a penalização, quem pilotava no momento era o Sylvio de Barros, o Cacá subiu à Torre para reclamar da penalização, pois o carro dele “não havia transpassado sobre a faixa, havia passado só um pouquinho com apenas uma roda no início da faixa....” (na interpretação do Cacá, passar só um pouquinho não deveria ser queima”), porém os Comissários da prova usaram um procedimento bem simples para aplicar as penalizações: eles observaram a faixa  de entrada de box como se fosse um “muro virtual”, ou seja, quem bateria no muro na hora da entrada seria penalizado. Vejam abaixo o destaque na folha do briefing entregue aos pilotos e as imagens dos carros que foram penalizados:

 

   No documento do "Briefing", assinado pelos pilotos na prova de Goiânia, estava claro que as linhas tinham que ser respeitadas.

 

   # 5 – Cacá Bueno e Sylvio de Barros # 7 – Miguel Paludo e Justin Algaier # 50 – Ramon Alcaraz e Marcio Mauro # 53 – Rodolfo Toni e Danilo Dirani

 

Observando as imagens, todos teriam “batido” no muro.

 

Curiosamente, durante o briefing, o Cacá Bueno pediu a palavra e disse que “muitos carros estavam queimando a faixa de saída de boxes e que isso era perigoso e que os Comissários deveriam ser mais enérgicos com estas queimas”.

 

Bem, vamos voltar ao Vettel e sua queima de largada. Como eu disse acima, não tem como saber os critérios usados pelos Comissários da F1, mas na Porsche, nós, Diretor de Prova, Comissários e Cronometristas, temos como costume fazermos uma reunião sempre antes das largadas e estabelecermos alguns critérios de procedimentos, sempre tentando manter os padrões aplicados durante o ano Acredito que na F1 não seja diferente disso e se eles optaram pela não penalização do Vettel, não vejo nenhum problema desde que seja uma posição padrão, pelo menos para o ano do campeonato.

 

Vou escrever abaixo, o que eu imagino que tenha sido a interpretação dos Comissários da F1:

- perceberam que houve a queima (o sensor deu o alerta),

- observaram que o Vettel teve não vantagem,

- também observaram que o erro do Vettel não induziu nenhum outro piloto ao erro.

- tinham como procedimento aplicar uma margem de tolerância.

 

Aqui no Brasil, já observei penalizações por queima de largada onde o piloto penalizado também não teve vantagem, mas sim prejuízo pela queima, porém o fato dele ter acelerado antes ou ainda mudado sua trajetória fez com que outro ou outros pilotos fossem induzidos ao erro. (a largada é sempre um momento muito tenso de qualquer corrida).

 

É isso!

 

Abraços,

 

Sergio Berti