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Minha luta com um campeão mundial de boxe PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Monday, 25 February 2019 23:22

Como estou cansado de reclamar da falta de calendário da Copa Truck e dos locais definidos da Stock Car, vou aproveitar que nada mudou desde a semana passada para cá para contar mais um ‘causo’.

 

Era o distante ano de 1975 e eu cursava o primeiro ano da Faculdade de Educação Física de Santo André (Fefisa), no Grande ABC paulista. Na minha classe estavam alguns alunos que já eram conhecidos do público, como o Zé Roberto, levantador da Pirelli e reserva do William, e hoje técnico do Brasil, o também levantador Décio Cataruzzi e o Helio Kleiber, ginasta da seleção brasileira, além de uns corredores de fundo de menor expressão. Tinha um também que, no começo, a gente conhecia de nome, mas depois virou um grande camarada e amigo: o lutador de boxe Miguel de Oliveira.

 

O Miguel era um sujeito legal que inventou uma brincadeira que ele chamava de mordida de cavalo. Ele pegava com a sua delicada mãozinha as gorduras laterais na cintura e confesso que na época não tinha quase nada, diferentemente de hoje, e apertava. Doía, mas a gente aguentava, pois também devolvia nele. Como diriam meus avós (hoje isso é complicado demais de falar) era brincadeira de menino, menino mesmo!!!!

 

Depois de cerca de um ano estudando juntos ele começou a se preparar para disputar o título mundial dos meio-pesados. Miguel era, e ainda é uma pessoa não muito alta, mas forte e atarracado e na época ainda tinha um pouco de cabelo, algo que, não só nele, acabou por desaparecer. Coisas da vida! Devido à intensa preparação, ele teve de se ausentar em várias aulas e os professores, alguns ex-atletas acostumados às necessidades especiais, entenderam e abonaram suas faltas.

 

 

 

A história mostra e depois nós vimos várias vezes, a vitória do Miguel sobre o espanhol José Manuel Duran. A luta foi em Mônaco e dias depois o Miguel retornou às aulas e após receber muitos cumprimentos, o Nelson, um professor de ginástica olímpica (era assim que se chamava na época) mandou a gente fazer um corredor polonês para o Miguel passar. A classe toda e éramos mais de trinta alunos. Tínhamos combinado que em vez de enchê-lo de tapas, aplaudiríamos. Ele não sabia e entrou no corredor com os dedos das mãos cruzados atrás da cabeça esperando a pancadaria.

 

Aplaudimos muito, pois não é todo o dia que se tem um brasileiro campeão mundial, ainda mais de boxe, do seu lado e com um título recém-conquistado. Logo que começou a entrar no corredor, Miguel viu que ninguém batia nele e cumprimentou a todos, que o abraçamos. Alguns dias depois combinamos em fazer uma brincadeira. Ele trouxe luvas de muitas onças (onça é uma medida de peso e não o bicho, claro!), improvisamos um tablado com colchões de ginástica, sem cordas e ele fez um rounde com vários amigos de classe.

 

Eu fui um deles. Estava com pouco mais de vinte anos e cheio de esperança de acertar um soco no campeão mundial que, claro, não reagiria em hipótese nenhuma. Se o fizesse eu não estaria mais neste mundo. Confesso que tentei de todos os jeitos, mas ele se esquivava e só acertei quando mirei no meio dele e dei uma espécie de cruzado, quando meu antebraço pegou nele, que nem se alterou. Foi como um tapa de criança. Me senti o pior dos homens. Mas ri muito e até pedi desculpas para ele, que retrucou rindo: Do quê? Minha autoestima desabou de vez.

 

O Miguel só deu alguns leves toques, na testa, pois se tocasse no nariz ou boca, sangraria, de um amigo, cheio de graça, mas gente boa demais, o Gibinha, que hoje mora na Nova Zelândia. Marrento e metido, sempre brincalhão, Gibinha entrou e o Miguel tocava na testa dele com a luva e girava. Miguel estava em plena forma física, pois tinha acabado de se sagrar campeão mundial e se escondia do Gibinha que, quando o via era para ser tocado na testa. Rimos muito e guardo esta recordação até hoje.

 

Alguns anos depois, já como jornalista de O Globo, entrevistei o Miguel de Oliveira sobre uma luta do Maguila com não lembro quem e voltamos a nos ver. Foi divertido, muito bom e inesquecível esse meu momento de fama frente a frente, num ringue, com um campeão mundial de boxe.

 

Milton Alves 
Last Updated ( Wednesday, 27 February 2019 00:11 )