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Lewis e o "fantasma" de 2016 PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Friday, 28 July 2017 19:10

Olá fãs do automobilismo,

 

Há algum tempo diretores das equipes onde pilotos são meus pacientes tem me procurado para conversar sobre como anda o “progresso” ou que linha de trabalho tem sido feita com eles, preocupados com o desempenho em pista dos seus “atores principais” dentro das pistas e mesmo fora delas.

 

No caso de Toto Wolff, a preocupação com Lewis Hamilton diz mais respeito ao que seu primeiro piloto tem feito longe dos compromissos contratuais com a Mercedes, algo que o incomoda mais do que ele deixa transparecer nos olhares e entrevistas quando perguntado sobre o assunto.

 

A ausência de Lewis no evento da Trafalgar Square, em Londres, na quarta-feira que antecedeu o GP da Inglaterra foi algo mais difícil de explicar dentro do meio administrativo – Mercedes e Liberty Media – do que para os milhares de fãs que esperavam ver o maior ídolo do automobilismo local participando do evento, distribuindo autógrafos e não sendo o único dos pilotos do grid a estar ausente.

 

Estavam todos lá na Trafalgar Square... menos Lewis.

 

O efeito da ausência ampliou-se devido ao fato dele ter declarado ter tomado a semana para “concentrar-se para a corrida” e no vazamento de que a “concentração” estava acontecendo em festas provadas com os amigos na Grécia, bem longe da Inglaterra e de um lugar que parecesse ser um local apropriado para um piloto top estar se preparando para uma corrida de Fórmula 1.

 

Lewis veio para a sua consulta quinzenal na quarta-feira após o GP da Inglaterra, onde calou todos os críticos, sufocou todas as vaias iniciais e simplesmente ignorou os demais 19 pilotos do grid com uma atuação impecável, sem ser ameaçado em nenhum momento de perder a condição de vencer a corrida e, para encerrar o domingo de forma sem igual, saltou as grades e atirou-se nos braços do público como nenhum outro piloto fez (ao menos que se tenha registro).

 

Quando cruza o portão do autódromo ou da fábrica da Mercedes, Lewis "disconecta" da F1 e vai pra "seu mundo".

 

Britanicamente pontual, Lewis chegou ao consultório com aquele visual que nada tem a ver com o de qualquer outro piloto da categoria ou de qualquer categoria do automobilismo mundial. Sempre educado, balançou suas correntes no pescoço até acomodar-se no meu Divã para começarmos mais uma sessão. Ele estava particularmente feliz com o momento em que estava vivendo nas pistas, confessou.

 

Perguntei se tinha sido apenas pela vitória na corrida em Silverstone, mas ele foi além: não se tratava apenas do bom desempenho em Silverstone, mas também por sentir uma melhora efetiva no equilíbrio do carro e achar que, finalmente, eles deixaram a Ferrari para trás. Não deixou de dizer que o trabalho da equipe em procurar encontrar soluções para as deficiências do carro foi algo impressionante, que a Mercedes não mediu esforços para superar as deficiências do equipamento.

 

Mas havia um “traço extra” naquele sorriso que parecia ir além do que apenas acontecia no carro e na fábrica da equipe e tive que perguntar sobre o assunto. Apesar de ainda não ter 30 anos completos (faltam uns meses), sei bem quando um homem tem um brilho diferente no olhar e parece que o coração do meu paciente anda um pouco mais acelerado.

 

Chegado a Silverstone, Lewis ignorou a concorrência, cravou a pole position e venceu sem ameaças o GP Inglês.

 

Voltando ao meio do automobilismo, toquei novamente num ponto que costuma deixar Lewis incomodado até hoje: a temporada de 2016. Lewis recebeu muitas críticas por sua aparente “perda de foco” com sua vida social enquanto Nico Rosberg mantinha-se completamente focado na conquista do título mundial. Conversamos bastante sobre o assunto e nossos pontos de vista não são exatamente os mesmos.

 

Nenhum atleta de alto rendimento consegue manter seu rendimento no máximo quando não está completamente focado no seu objetivo e isso é uma regra que se aplica a qualquer esporte, automobilismo inclusive, especialmente com a “reação em cadeia” iniciada por Ayrton Senna que foi o primeiro a levar este comprometimento para um platamar que não existia nos anos 80. Lewis sempre contesta não só a mim como a todos que defendem este raciocínio.

 

Quando vivemos uma determinada situação, temos uma tendência de julgar se ela é boa ou ruim. Isso faz parte da nossa sobrevivência no que diz respeito a questões práticas. Para questões psicológicas, emocionais, isso pode representar uma armadilha. Continuar pensando em uma situação estressante mesmo após ter passado por ela, ficar remoendo o passado ou ansioso pelo futuro pode atrapalhar o dia a dia, tirar o foco do presente e deixar a pessoa menos funcional.

 

As vaias que se ouviu nos primeiros momentos em Silverstone se tornaram aplausos e depois delírio.

 

Esse padrão de comportamento altera o estado de humor e, se por um lado Lewis usa sua vida social “atípica” como válvula de escape para as pressões contratuais e de performance que lhes são exigidas, há que se dar uma certa razão para ele. O ponto em questão é o limite: até onde sair do meio da Fórmula 1, onde Lewis não cultiva praticamente nenhum convívio, é realmente positivo?

 

Uma das habilidades psicológicas necessárias para um atleta de alto rendimento é a capacidade de concentração, já que esse indivíduo está exposto a diversos fatores que podem tirar sua atenção, tanto em treinos quanto em competições. Nos treinamentos, alguns atletas têm dificuldade para deixar questões pessoais e familiares fora da pista, assim como questões de relacionamento interpessoal entre os próprios companheiros de treino. Nesse caso, a falta de concentração pode contribuir para que o exercício seja executado de forma automática, sem a atenção necessária, pelo fato dos pensamentos estarem direcionados para essas questões externas.

 

Lewis atirou-se nos braços dos torcedores, quebrando os protocolos que Brnie Ecclestone jamais permitiria.

 

Em situações de competição esses "estímulos flutuantes" podem exercer ainda maior influência, já que os fatores de distração podem ser muito mais poderosos, como o adversário apontado como favorito na prova, as pessoas na torcida (familiares, treinadores, demais atletas e dirigentes, patrocinadores, mídia, etc) e o mais poderoso de todos: a cobrança interna do competidor. Nesses momentos, é frequente que os pensamentos relacionados ao resultado final e à necessidade de ganhar ou de fazer uma marca específica se tornem o foco de concentração do atleta, que, em consequência, não consegue se concentrar nos elementos que realmente contribuirão para que obtenha bom desempenho.

 

Quando os meus amados leitores estiverem lendo esta coluna, já terá sido dada a bandeira quadriculada para o GP da Hungria e Lewis podeia ter assumido a liderança do campeonato, mas o resultado foi totalmente adverso, e agora está 14 pontos atrás de Vettel. É bom lembrar que ele recuperou-se de seus problemas no início da temporada passada e foi para as férias de agosto 6 pontos à frente de Nico... e no final do ano amargou o vice-campeonato.

 

Meu trabalho com Lewis, hoje, é evitar que 2016 se repita.

 

Beijos do meu Divã,

 

Catarina Soares


Last Updated ( Monday, 31 July 2017 09:55 )