Especiais

Classificados

Administração

Patrocinadores

 Visitem os Patrocinadores
dos Nobres do Grid
Seja um Patrocinador
dos Nobres do Grid
Os trinta anos da morte de Henri Toivonen. PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Monday, 25 April 2016 01:02

Foi considerado como um dos mais velozes do seu tempo. O seu estilo era descrito ao mesmo como arrojado e arriscado. Contemporâneo de pilotos velozes na sua Finlândia natal como Ari Vatanen, Juha Kankkunen, Markku Alen ou Timo Salonen, e herdeiro de uma distinta família de pilotos, o talento de Henri Toivonen fazia apaixonar os adeptos de ralis, que o viam como um potencial vencedor de campeonatos. Contudo, a 2 de maio de 1986, na Corsega, o seu acidente mortal chocaria o mundo dois ralis, que iria ser mudado para sempre.

 

UMA TEMPORADA ATRIBULADA

 

A Volta à Corsega era a quinta prova a contar para o Mundial de pilotos. Nesse Mundial, as coisas andavam algo atribuladas e já tinham acontecido polémicas e mortes nesse campeonato. Quase dois meses antes, em Portugal, duas pessoas tinham morrido e outras 40 ficaram feridas quando o Ford RS200 de Joaquim Santos, um piloto local, tinha perdido o controlo numa classificativa na serra de Sintra, na primeira etapa do rali. Os pilotos de fábrica, depois de saberem do acidente, reuniram-se no Hotel Estoril-Sol e decidiram boicotar o resto do rali, para compreensão da organização, mas do desagrado da FISA, que não queria que tal acontecesse. O rali seguiu em frente, e outro piloto local, Joaquim Moutinho, foi o vencedor, num Renault 5 turbo.

 

Pelo meio, houve o rali Safari, que acontecia no Quénia, e onde os Lancia decidiram levar os velhos 037, onde Markku Alen foi o melhor, sendo terceiro classificado, batido pelos Toyota dos suecos Bjorn Waldegaard e Lars-Erik Torph. Por esta altura, tinha havido quatro vencedores diferentes – e quatro carros diferentes - nos quatro ralis deste campeonato: Toivonen em Monte Carlo, num Lancia; Kankkunen na Suécia, num Peugeot; e Moutinho em Portugal, num Renault.

 

Na Córsega, os pilotos tinham pela frente 24 classificativas, todas em asfalto, e que iriam acontecer ao longo de três dias. E aqui, a disputa entre Lancia e Peugeot continuava, com o os italianos a inscreverem três Delta S4 para Toivonen, Alen e o italiano Massimo Biasion, enquanto que a Peugeot tinha três 205 Ti16 para o finlandês Timo Salonen, o campeão do mundo em título, e os franceses Bruno Saby e Michele Mouton.

 

A Audi estava a deixar os ralis, e não alinhava nesta prova, bem como a Ford, e a Toyota apenas alinhava nas provas africanas. Apenas a MG Rover é que fazia uma aparição, com três carros para os britânicos Tony Pond e Malcom Wilson, e um jovem francês chamado Didier Auriol.

 

O RALI DAS DEZ MIL CURVAS

 

Tal como em Monte Carlo, a Volta à Córsega era uma prova veloz. Contudo, as curvas e contracurvas das estradas dessa ilha, situada no sul de França faziam com que a prova tivesse o nome não-oficial de “Rali das Dez Mil Curvas”, devido à sinuosidade do percurso.

 

Existente desde 1956, a Volta à Córsega era uma das provas que fez parte do primeiro calendário do Mundial de ralis, em 1973. Desde então, abrigou vencedores como Sandro Munari, Gerard Larrousse, Bernard Darniche (o maior vencedor, com cinco vitórias), Jean Ragnotti e Markku Alen, o vendedor no ano anterior.

 

 

Contudo, era também um rali trágico. No ano anterior, o italiano Attilio Bettega, piloto oficial da Lancia, perdera o controle do seu modelo 037 e embateu contra uma árvore, matando-o. Bettega tinha o numero 4 no seu carro e o acidente fatal tinha acontecido na quarta especial do rali.

 

O rali também já tinha tido outros acidentes, não tão graves como o de Bettega, mas os pilotos tinham medo de se despistar naquelas estradas. Era que caso o pior acontecesse, muitas vezes tinham de lidar com precipícios com dezenas, senão centenas de metros…

 

Em 1986, o duelo iria ser entre Lancia e Peugeot, e os franceses iriam estrear uma versão mais evoluída do seu 205, pois os Lancia Delta S4 já começavam a ser uma séria ameaça. E entre os carros italianos, os números estavam distribuídos da seguinte forma: Alen tinha o numero 1, Toivonen o 4. O mesmo de Bettega, no ano anterior.

 

TOIVONEN, O FINLANDÊS VOADOR

 

Mal foi dada a bandeira de largada, começou o duelo franco-italiano. Bruno Saby começava a dar nas vistas, dado o seu conhecimento das estradas francesas, mas era Henri Toivonen não só a andar a par, como também a superar os Peugeot. Depois das classificativas iniciais, o finlandês já tinha aberto uma vantagem superior a um minuto, quando chegaram ao final do primeiro dia, em Ajaccio, a capital corsa.

 

 

Toivonen, que tinha vencido em Monte Carlo, queria ter mais uma vitória no seu palmarés para que relançasse a sua candidatura ao título mundial. Tinha desistido na Suécia e aderido ao boicote em Portugal, e não participara no rali Safari. Logo, era apenas o quinto classificado, mas com uma forte hipótese de liderar o campeonato, se saísse da Corsega como vencedor.

 

Aos 29 anos, Toivonen – apesar da juventude – já tinha veterania. Correndo desde 1980 a tempo inteiro, tinha sido o vencedor mais jovem ao conseguir chegar ao lugar mais alto do pódio no Rally RAC desse ano, ao volante de um Talbot Sunbeam Lotus. Tinha 24 anos e 86 dias quando o fez. Depois disso, teve passagens por Opel e Porsche, especialmente em provas do Campeonato da Europa de ralis, mas foi quando ingressou na Lancia, em meados de 1985, que a sua carreira voltou a entrar nos eixos, voltando a vencer no rali RAC em 1985, prova de estreia do Lancia Delta S4.

 

 

Na Córsega, Toivonen era visto como um dos favoritos à vitória, mas tinha Markku Alen, cinco anos mais velho do que ele, como uma força a ter em conta. E parecia que ele era o piloto que conseguia lidar melhor com os carros do Grupo B, crescentemente mais velozes… e mais leves. Com chassis tubulares e capas de fibra de vidro, a proporção peso-potência poderia ser de 1 para 1, pois para um carro de 500 cavalos, o peso total muitas vezes rondava… os 500 quilos. Carros crescentemente perigosos, e os pilotos ficavam muito cansados.

 

E na Corsega, Toivonen tinha um segredo guardado: estava engripado.

 

“FIZEMOS UM RALI INTEIRO”

 

Toivonen estava a ser medicado para a gripe, mas apesar das febres, continuava a ser veloz. Tinha ganho classificativa atrás de classificativa, mas no final do dia 1, queixava-se do percurso: “Este rali é de loucos, apesar de estar a correr tudo bem para nós. Se tiver problemas por aqui, estou lixado”, comentou à imprensa.

 

Apesar das preocupações, Toivonen não tirou o pé. Na manhã de sexta-feira, dia 2 de maio, continuou a alargar a diferença para a concorrência, mas cada vez que parava, no final das classificativas, comentava que tinha dificuldades em manter o carro na estrada, porque este não era balanceado o suficiente. E isso o fazia cansar ainda mais, por causa do seu estado debilitado de saúde.

 

 

No final da 17ª classificativa, a diferença entre ele e o segundo classificado era superior a minuto e meio. A seguir, era a especial Corte-Taverna, e ele iria fazer de pedal a fundo, como se fosse ele a perseguir o primeiro classificado. Por esta altura, já se queixava do cansaço: “Esta manhã, corremos o equivalente a um rali inteiro. Não está a ser fácil manter o ritmo”.

 

Mesmo assim, lançou-se para mais uma classificativa. Seria a sua última.

 

SEM TESTEMUNHAS

 

O acidente aconteceu por volta do sétimo quilómetro da classificativa, uma curva à esquerda. Nesse local, Toivonen seguiu em frente e caiu ribanceira abaixo, chocando contra uma árvore. O depósito de combustível rompeu-se, causando fogo quase de imediato. As imagens do acidente foram captadas e mais de 800 metros de distância, e não havia testemunhas no local.

 

 

O primeiro carro a chegar foi do seu companheiro de equipa, o italiano Massimo Biasion. Desesperado, comunicou à base via rádio para que fossem buscar socorro, mas ele e o seu navegador, Tiziano Siviero, tinham também reparado que eles não estavam fora do Lancia. Em poucos minutos, soube-se de toda a dimensão da tragédia, especialmente quando se viu os restos calcinados do carro. Toivonen e o seu navegador, o italo-americano Sergio Cresto, tiveram morte imediata. Tinham 29 e 30 anos, respectivamente. A Lancia, em sinal de luto, retirou os seus carros do rali, e este prosseguiu por mais um dia, com Bruno Saby como vencedor. Mas ninguém comemorou no pódio.

 

A morte de Toivonen teve ondas de choque no automobilismo, mostrando que esses carros estavam cada vez mais velozes. O público, ainda a digerir os acontecimentos em Portugal, exigiu medidas, e a FISA deu-as, de modo radical: o Grupo B seria banido no final do ano, e os Grupo A seriam promovidos. Dias depois, mais acidentes mortais como o do italiano Elio de Angelis, na Formula 1, fizeram com que os motores Turbo fossem banidos do automobilismo no final de 1988.

 

 

Até hoje se especula sobre o que aconteceu naquele acidente. Não houve marcas de travagem no local, e muito se fala sobre o que teve. Estava debilitado por causa da constipação, logo, poderia ter cedido ao cansaço, mas anos depois, Malcom Wilson (que depois de terminar a sua carreira, tornou-se diretor da M-Sport, preparando os carros da Ford para o WRC) contou que Toivonen se queixava de “blacakouts” após um acidente que tivera em 1984, no Rally Costa Smeralda, onde sofrera uma fratura no pescoço, ficando imobilizado por algum tempo.

 

Uma coisa é certa: naquele dois de maio de 1986, não só foram dois pilotos que saíram da vida para passar à História: foi todo um período na história dos ralis. E até aos dias de hoje, as pessoas recordam o Grupo B como o período onde os pilotos guiavam os carros mais selvagens do seu tempo.

 

Saudações D’além Mar,

 

Paulo Alexandre Teixeira