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Os Marvados PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Monday, 29 September 2014 04:13

Conta-se a estória de um homem da cidade que, ao chegar a um vilarejo do interior, depara-se com uma rinha de galos. Curioso, após observar algumas brigas, resolveu também fazer uma aposta. Em dúvida sobre qual seria o melhor galo, resolveu perguntar para um dos caipiras:

 

- “Ô meu amigo, qual é o galo bom aqui pra eu apostar?”

- “O bão é o branco, uai!”, respondeu o caipira.

 

Diante da resposta, resolveu apostar todo o dinheiro que tinha na carteira no galo branco. Logo no começo da briga, o galo adversário arrancou a cabeça do branco. Estupefato, e cheio de ódio contra o caipira que havia feito com que perdesse todo o dinheiro, o homem pega o interiorano pelo colarinho e lhe pergunta, espumando de ódio:

 

 - “Por que você me disse que o galo branco era o bom? Você queria me sacanear, é isso?”

 - “Mas é verdade! O branco era o bão! Marvado mesmo é o preto...”

 

Brincadeiras à parte, a anedota acima tem como conteúdo aquele tipo de pergunta que todos nós fazemos, ao observarmos uma competição: Em quem devemos apostar? Quem é o melhor?

 

Na coluna deste mês, vou falar de alguns kartistas que fizeram história no kartismo nacional, aparecendo na lista de todos aqueles que conhecem este esporte. Temos muita dificuldade em encontrar informações de corridas, fotos e testemunhas fidedignas, mas contei com a ajuda de alguns amigos, especialmente o Marcelo Afornali, do Museu do Kart, a lenda Carol Figueiredo, de quem vou falar nesta coluna e o meu eterno amigo, o “titio” Dionisio Pastore.

 

Em sentido horário: Acima, disputas ferozes de Carol Figueredo e J. Carlos Pace. Abaixo, contra Affonso Giaffone e Waltinho Travaglini.

 

A lista de “Marvados” é extensa, e tem que ser dividida em décadas. Ainda assim, muitos pilotos fantásticos ficarão de fora, pelo simples motivo de falta de conteúdo para pesquisa. Por exemplo, o carioca Mário “Marrom” Seixas, que correu nos anos 70, foi citado por muitos como um cara agressivo, fora de série, mas não consegui encontrar uma foto sequer dele.

 

Existe também a questão da injustiça histórica, algo que o Carol me falou por telefone e que o Dionisio já havia me falado diversas vezes: Na mesma época em que havia alguns pilotos dominando as suas categorias, outros estavam lá também disputando a ponta, mas não vencendo tanto porque não dispunham do mesmo equipamento e apoio de fábrica. Para que vocês tenham uma idéia do que eu estou falando, no final da década de 70 havia uma categoria chamada “POC 100” (Pilotos Oficiais de Competição, motores 100cc), que permitia a utilização de equipamentos importados e era a nata do kartismo da época, com os melhores pilotos e os karts mais rápidos.

 

Nesta escola ninguém matava aula...  Também, com Maneco Combacau e Carol Figueiredo de professores, todos queriam estar lá.

 

Esta categoria começou no início dos anos 70 e foi extinta no ano de 1985, quando seus participantes não chegavam à meia dúzia. Pois bem, falando especificamente do final da década de 70, época dominada por Ayrton Senna, hoje em dia pouco se fala deste fato, mas a maioria dos melhores pilotos de então desistiu de competir na POC 100 para migrar para a POC 125, que utilizava equipamentos nacionais, pela simples razão de que ninguém tinha condição de brigar contra o DAP/DAP e pneus Bridgestone de Ayrton. Ainda que ele tenha travado belas disputas nas pistas contra Mário Sérgio Carvalho, Ruy Croce Guimarães, Décio Bellini e outros, a briga era quase de Davi contra Golias.

 

Com tudo isto em mente, e sem desmerecer ninguém, seguem abaixo alguns dos maiores Marvados que passaram pelas nossas pistas.

 

Anos 60 - Carol Figueiredo.

Conhecido pelos amigos pelo apelido de “Chinês”, fruto de uma avó paterna chinesa e uma avó materna índia, Carol tornou-se uma referência no kart brasileiro dos anos 60 e 70.

 

A primeira prova de kart do Brasil foi disputada no Jardim Marajoara, em 1960. No grid, pilotos como Cláudio Daniel Rodrigues (o “pai” do kart no Brasil), Wilsinho Fittipaldi e... Carol Figueiredo. “Aqueles karts eram mancos, não andavam nada”, ri Carol. “Nossas corridas eram em parques e loteamentos e costumávamos ir guiando os karts das nossas garagens para o local das provas. Eles eram tão lentos, que se um cachorro resolvesse correr atrás da gente, nos ultrapassaria! Nesta época, quem ganhava a corrida geralmente era aquele que conseguia impulsionar melhor o kart na partida parada empurrando as rodas dianteiras com as mãos.”

 

Acima correndo pela equipe Mini nos anos 60. Quase 50 anos depois, Carol reencontra a 'banheira' restaurada: emoção.

 

Tendo partido para o automobilismo profissional em 1964, onde foi companheiro de equipe de lendas como Bird Clemente, José Carlos Pace e Luiz Pereira Bueno na equipe Wyllis, Carol nunca abandonou o kart, onde integrava a equipe Mini com Maneco Combacau (seu maior companheiro no kart e grande amigo), Emerson Fittipaldi, Tite Catapani e outras feras.

 

O ano de 1968 foi de contrastes para Carol: No kart, teve uma de suas maiores vitórias, ao vencer uma batalha contra o gaúcho Clóvis de Moraes em Volta Redonda; no automobilismo, teve um acidente que quase o deixou paralítico, na prova de rua de Petrópolis, onde guiava um Mark I da equipe de Luiz Antônio Greco.

 

O acidente o obrigou a abandonar o automobilismo e dedicar-se 100% ao kart, e isso foi maravilhoso para o kartismo! Fundou em 1970 a ESPAKA (Escola Paulista de Kart) junto com o amigo Maneco Combacau, escola esta que formou grandes talentos para o nosso automobilismo, entre eles o “titio” Dionisio Pastore. Fiel à Kart Mini, fábrica que nunca abandonou, batalhou junto com o amigo Mauro Salles o patrocínio da Hollywood para formar uma equipe de kart, onde pilotou junto com Maneco, os irmãos Renê e José Lotfi e Paulo Salles. Venceu dezenas de corridas, tornou-se o primeiro campeão sul americano de kart, ao vencer o torneio em El Pinar, Uruguai, em 1972 e ajudou a elevar o nível das nossas competições.

 

A conquista do sulamericano de kart em El Pinar foi um feito marcante para toda uma geração que se seguiria.

 

Após aposentar-se das pistas em 1975, voltou ao kart no começo dos anos 80, disputando o Torneio de Superkarts (karts de 2 motores 125cc), categoria criada para reunir novamente nas pistas as lendas do kartismo brasileiro e alavancar a carreira de Emerson Fittipaldi. Mesmo depois de muitos anos fora das pistas, Carol continuava competitivo, conquistando diversos pódios em grids com mais de 30 pilotos por prova.

 

Sua tocada foi sempre técnica, limpa, sem exageros, mostrando no cronômetro aquilo que os olhos muitas vezes não conseguem ver. Exímio acertador, estratégico, Carol era um piloto mais “cerebral”.

 

Carol fez parte da poderosa Equipe Hollywood nos anos 70, quando voltou a focar no kartismo de competição.

 

Perguntei-lhe qual teria sido a sua maior vitória... Ele, com toda a sua humildade, me respondeu: “É difícil dizer. Às vezes, pensamos que somos os melhores, mas na verdade temos uma superioridade de equipamento. Eu estava sempre próximo à fábrica, e muitos pilotos que competiram comigo tinham que amarrar seus karts com arame. Desta forma, como é que eu posso dizer que fui o melhor no dia em que venci?”

 

Carol, um campeão também na humildade!

 

Anos 70 - Waltinho Travaglini

Você pode conversar com centenas de pilotos que viveram esta época e eles serão unânimes em dizer: “Waltinho foi o melhor de todos nós.”

 

Segundo todos entre todos os pilotos de uma geração, Waltinho Travaglini foi o melhor kartista dos anos 70.

 

Tendo começado no kart em novembro de 1964, em uma prova de rua de Ribeirão Preto, Waltinho venceu logo de cara, correndo em dupla com o primo “Affonsão” Giaffone. Affonso e Zeca, primos de Waltinho, foram os responsáveis por sua ida ao kart e também foram dois dos melhores pilotos da história de nosso kart e automobilismo, como muitos de vocês já sabem.

 

Os irmãos Giaffone e o primo Waltinho não gostavam de usar o equipamento que a maioria usava, estavam sempre buscando chassis e motores alternativos. Assim, na época de domínio da marca Mini, eles competiam com os Silpo, de Silvano Pozzi e depois com os próprios karts, os FBM. Isto permitiu que Waltinho desenvolvesse a sua sensibilidade para acerto, mas também privou-lhe de muitas vitórias, por não dispor do melhor equipamento.

 

Em 1974, no que seria o auge e de onde ele poderia ter partido para o automobilismo. Faltou apoio...

 

Após participar do Mundial de 1970, Waltinho trouxe para o Brasil um chassis alemão Taiffun, que foi copiado e tornou-se o Cox, da fábrica Azeva (A de Affonso, ze de Zeca e va de Waltinho). Este kart era mais de 1 segundo mais rápido que os Mini deitados e revolucionou a fabricação de karts no Brasil, obrigando a então dominante Mini a fabricar os Maxi, que eram cópia dos Birel italianos.

 

Além de diversos campeonatos paulistas, Waltinho também foi tricampeão brasileiro de kart, nos anos de 1972, 1973 e 1977. O primeiro título resultou de uma batalha época contra Carol Figueiredo no Kartódromo do Taquaral, em Campinas, que dispunha de um equipamento superior graças ao apoio da Hollywood. O último, foi uma de suas maiores conquistas, ao vencer o “jovem leão” Ayrton Senna em Brasília, mais uma vez com um equipamento inferior. Ayrton, aliás, foi um dos muitos alunos de Waltinho, que também teve a sua escolinha de pilotagem e equipe, a Speedmaster.

 

Entre seus admiradores, um adversário de peso que se desdobrava para tentar superar o ídolo... e raramente conseguia.

 

Waltinho era um piloto completo, inteligente e velocíssimo. Nos seus melhores dias, era imbatível. Tinha uma tocada extremamente suave e conseguia “encurtar” a pista, encontrando traçados que os outros não imaginavam.

 

Ainda hoje, Waltinho continua envolvido com o kart, formando pilotos e chefiando uma equipe vencedora. Seu filho Luca foi o campeão brasileiro da categoria Graduados este ano.

 

Waltinho é um daqueles pilotos que poderia facilmente ter chegado à Fórmula 1 e vencido títulos, mas que não chegou lá por falta de apoio financeiro. Mas para aqueles que o viram pilotar, será sempre o Marvadão número 1!

 

Carol Figueiredo e Dionísio Pastore no pódio no Superkart em 1983. Em primeiro plano, Emerson Fittipaldi dá entrevista.

 

Bom gente, o texto está ficando enorme, então na próxima coluna continuo com o assunto das lendas do kart. Espero que tenham curtido esta viagem no tempo tanto quanto eu!

 

Abraços,

 

Rodrigo Bernardes

 
Last Updated ( Wednesday, 01 October 2014 07:14 )