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Lorenzo e o equilibrio PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Sunday, 13 July 2014 11:58

Olá fãs do automobilismo,

 

Quem nunca se sentiu surpreendido em algum momento nesta vida, não? Pois é... quando as vezes a gente menos espera, algo vem e nos surpreende e na semana passada minha assistente recebeu uma ligação consultando possibilidades de horários para um novo paciente.

 

Não seria nada estranho se fosse um piloto de alguma categoria do automobilismo. Com tantos clientes de diferentes categorias, no Brasil e no exterior, acho que já fiquei famosa no meio das quatro rodas pelo mundo a fora, mas a ligação de um motociclista foi algo novo. Nunca havia sido procurada por nenhum.

 

Como não acompanho o esporte tão de perto, precisei me preparar para receber o paciente, estudando sobre a categoria, as dificuldades, as disputas, os protagonistas e isso foi abrindo meus olhos para o tipo de desafio que eu teria pela frente. Seria como receber um paraquedista que saltou do avião sem o paraquedas!

 

Ficou tudo agendado para este último dia 9, pouco antes dele viajar para a Alemanha e disputar mais uma etapa do mundial de motovelocidade. Jorge chegou cedo, era o primeiro paciente do dia e quando cheguei ele já estava na sala de espera. Como tinham me falado que pilotos de motovelocidade eram baixinhos e franzinos, não achava que fosse ele quando se levantou e se apresentou. Era mais alto do que eu... se bem que isso não quer dizer muito.

 

Jorge mostrou-se muito simpático e educado e entendeu quando falei para ele em um risível ‘portunhol’ que precisava de alguns minutos antes de chamá-lo ao consultório. A primeira impressão que tive foi de alguém muito tenso, muito ansioso.

 

Jorge mostrou-se uma pessoa simpática, mas muito angustiada.

 

Quando minha assistente autorizou sua entrada ele parecia já estar em pé do lado oposto da porta. Deve ser coisa de motociclista, né? As motos arrancam rápido. Se nos sinais fazem isso, imagina essas de 1000 cc do campeonato que ele disputa! Mas a expressão tensa no olhar do meu novo paciente era tão transparente que me deixou preocupada.

 

Tentei relaxá-lo, perguntando se ele estava gostando do Brasil, da cidade, lamentei a saída precoce da seleção espanhola da copa e ele, rindo, disse que esta copa era algo para esquecer para espanhóis e brasileiros por conta das goleadas que sofremos. Funcionou! Tirei-lhe um dos franzidos da testa.

 

Quando começamos a conversar sobre sua vida e o que tinha levado-o até o centro oeste brasileiro para conversar com uma psicóloga logo começou uma troca muito intensa de expressões de alegria e angústia por parte daquele rapaz que desde criança foi talhado, formado e que teve na sua formação uma vitória como o alimento para continuar vivo.

 

A busca pela vitória sempre foi algo demasiadamente pesado em sua vida.

 

Desde menino o sonho de se tornar um grande piloto era apenas um detalhe. Jorge não queria ser “apenas” um grande piloto. Queria ser o maior do mundo! E, em seu crescimento profissional, Jorge acabou tendo uma referência, um exemplo e um desafio: Valentino Rossi.

 

Pelas minhas pesquisas, fui tentando desenvolver uma linha de avaliação do que tanto estaria perturbando meu paciente e, dentre as coisas que pesquisei, vi que, em suas vitórias no início de carreira, ele tentava fazer algo diferente fora da pista, depois da prova.

 

Bem... diferente mas nem tanto. As bandeiras fincadas nas caixas de brita com o símbolo de seu capacete, um “X” vermelho dentro de um círculo prata, e os dizeres “Terra de Lorenzo” acabaram por ter, para muitos dos seguidores do motociclismo, uma imagem de algo “artificial”, uma tentativa de copiar as performances do grande campeão e referência italiano. Achei melhor deixar que ele tocasse neste assunto, mas ele não tocou. Confesso não ter me surpreendido.

 

Durante anos, seu objetivo foi superar o ídolo e referência. Com o tempo, conseguiu.

 

Em todo caso, acabei me sentindo motivada a perguntar sobre a relação dele com o companheiro de equipe e ele disse que se tratava de um grande campeão e – entregando o jogo – confessou que seu grande sonho era superá-lo. Superá-lo em tudo. Em títulos, em vitórias, em paixão e reconhecimento por parte do público... e isso me preocupou.

 

A forma como Jorge falou sobre o assunto mostrou claramente que seu problema estava no que estava em sua volta, naquilo que ele sentia e via mais como ameaça do que como desafio. É muito complexo para algumas pessoas a separação entre este tipo de coisa.

 

Performático,  nem sempre conseguiu convencer a naturalidade de seus gestos.

 

De tão obstinado, Jorge conseguiu atingir um estágio em que foi capaz de superar àquele que um dia foi sua referência. Uma vitória pessoal que tornou-se um fardo ainda mais pesado quando ele passou a ter como meta superar todos os recordes estabelecidos pelo outrora dominador da categoria.

 

Esta cobrança, em algumas vezes, transformou-se em grandes decepções e algumas quedas... cair de uma moto a mais de 200 Km por hora não é algo confortável, mesmo com todo o equipamento que o piloto usa. Mesmo assim, a possibilidade de tornar a ambição em realidade continuava real. Até que...

 

Antes de atingir seus objetivos, um enorme obstáculo surgiu: Marc Marquez.

 

Pior do que ver o velho campeão recuperar-se, algo mais difícil de acontecer, uma vez que os anos pesam, foi ver o surgimento de um novo e duro desafio. Um adversário mais jovem que ele, tão rápido ou mais do que ele e, para piorar tudo, nascido no mesmo país.

 

A chegada de Marc Marquez na Moto GP tem sido um problema para Jorge. Na ânsia de superar o jovem espanhol, que mostrou-se um fenômeno assim como ele um dia o foi tem levado-o a ultrapassar o limite do bom senso, do equilíbrio emocional e físico. Com isso, as quedas tem acontecido, as ultrapassagens vem se sucedendo e a quantidade de erros cometidos nas corridas tem deixado-o atrás até mesmo do companheiro de equipe, o antigo campeão o qual um dia superou.

 

O excesso de pressão tem desequilibrado Jorge Lorenzo... equilíbrio que eles precisa recuperar.

 

Estava claro que o equilíbrio que Jorge precisa vai muito além do estar no limite sobre duas rodas. O equilíbrio interior do homem, do atleta é tão ou mais importante do que a força física ou a capacidade técnica. De nada adianta o terapeuta trabalhar o aspecto emocional se o paciente não se conscientizar de que ele precisa trabalhar também, mudando pontos de vista, aspectos que pode vir a dar a ele exatamente aquilo que ele tanto busca: a superação! Tanto dos desafios, quanto das expectativas.

 

Equilibrar-se é a chave do sucesso, Jorge. Mas este equilíbrio depende de você!

 

Beijos do meu divã,

 

Catarina Soares