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Entrevista: Fernando Julianelli PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Saturday, 01 June 2024 09:40

Depois que a VICAR “trocou de mãos”, com a venda da promotora de automobilismo que tem como carro chefe a Stock Car, que passou a ser chamada Stock Pro Series, os novos donos, a Veloci, entre suas mudanças, trouxe para sua equipe Fernando Julianelli. Inicialmente como Vice-Presidente Comercial e de Marketing e que assumiu o cargo de CEO da empresa e 2021. Desde então, vem promovendo uma revolução na forma de gerir a principal categoria do automobilismo brasileiro, abraçando novos projetos, agregando parcerias e ampliando a plataforma de negócios. Aos 50 anos de idade e ligado ao automobilismo desde os 12, tendo sido piloto de kart e em categorias de turismo (com 1,96 m ele não “caberia em um monoposto”), tendo se tornado publicitário e encontrado uma forma de se manter ligado ao automobilismo.

 

Uma “entrevista de 15 minutos” tornou-se uma bela conversa de 45 com nosso Assessor de Comunicação e Marketing, Flávio Pinheiro.

 

NdG: Nós pesquisamos um pouco sobre sua trajetória antes de chegar a VICAR e sendo você um profissional de sucesso, o que trouxe você a mergulhar tão profundamente no automobilismo?

 

Fernando Julianelli: Eu me formei empresário e sempre tive a paixão pelo automobilismo. Corri de kart, de Turismo – com esse tamanho não dava pra correr de Fórmula (risos) – mas eu me tornei publicitário e estava longe do meio quando o Cacá Bueno me chamou para ser seu empresário em 2001. Ele estava voltando para o Brasil pra correr na Stock Car depois de ter corrido na Argentina e eu estava com saudades das pistas. Ele pediu para eu agenciá-lo, mas inicialmente minha resposta foi não (risos). Ele insistiu e acabei topando e acabei me tornando sócio de uma agência de Marketing Esportivo, a Reunion Sports Marketing, que existe até hoje. Fiquei lá muitos anos, gerenciamos a carreira do Christian Fittipaldi, do Luciano Burti, Enrique Bernoldi entre outros. Fizemos grande ações para empresas como a Red Bull, mas em 2011 eu vendi minha participação na agência e fui ser CMO da Mitsubishi Motors do Brasil, onde fiquei até 2020 quando o Lincoln Oliveira, me convidou para contribuir com a transformação e a evolução da categoria.

 

Não dá para ter apenas uma receita para fazer o automobilismo dar certo. Estamos usando todos os meios de interação.

 

NdG: Transformação e evolução? Você vem fazendo uma revolução na VICAR. A “veia” do pessoal de Marketing tem o cerne na criatividade. Mas de onde vieram tantas ideias. Você trouxe coisas de fora, saíram da tua cabeça, como foi – está sendo – o processo?

 

Fernando Julianelli: Foi um pouco de tudo, não dá pra ter apenas uma receita. Coisas que eu vi enquanto estava na Stock Car antes e que possibilidade de serem feitas e não eram feitas por alguma razão, teve também essa mudança de acesso de conteúdo pelos canais de comunicação no meio virtual, de se poder ter páginas próprias em diversas redes sociais como Instagram, Facebook, Twitter, TikTok, youtube, etc. deixando de depender de agentes terceiros. Hoje conseguimos distribuir nosso conteúdo para 153 países e em 4 idionas ao vivo. Fizemos um casamento super positivo com o Grupo Bandeirantes e levar a Stock Car para todas as corridas da Stock Car para a TV aberta novamente, mantendo a nossa relação com o Grupo Globo, pelos canais Sportv, impulsionando o hábito das pessoas a assistir a Stock Car pela TV. Com isso você aumenta a visibilidade, consegue mais recursos, as empresas se interessam mais pelo teu produto, você com mais dinheiro consegue fazer um evento melhor e aí a roda gira um pouco mais rápido. Sem dúvida o grande gatilho disso foi o Lincoln (Oliveira, que é o pai de Enzo e Gabriel Bortoleto), que comprou a VICAR e acreditou no meu trabalho e no da equipe que tem na mentalidade o como e o quanto podemos fazer o negócio crescer e não o quanto eu vou ter de retorno financeiro no primeiro, no segundo ano. Então tudo o que geramos de conteúdo e economia, entendemos que deve ser reinvestido no negócio. É uma série de coisas, não tem um ponto único. Trouxemos ótimos profissionais e temos trabalhado com muita motivação. Esse é o caminho.

 

NdG: Na tua visão, quais são os maiores desafios para se fazer automobilismo nesse país?

 

Fernando Julianelli: O automobilismo por si só já é um esporte muito complexo. Começa que você tem diversos ‘stakeholders’. Tem a imprensa, as equipes, os pilotos, fornecedores, patrocinadores, prefeituras, federações, a confederação, então se você tiver um problema com qualquer um deles na semana, você já tem problema para a semana inteira e tendo que resolver. Some-se a isso, o desafio que envolve muito dinheiro, tempo e energia, logico, com algumas exceções, a qualidade dos autódromos brasileiros. Uma coisa é chegar em autódromo onde a grama está cortada, a pista está perfeita, os guard rails e as barreiras de pneus em perfeitas condições, instalações, salas, coberturas, boxes pra todo mundo, estacionamento decente pra todo mundo, a pista toda cercada de grades. Outra coisa é termos que chegar num autódromo onde é preciso fazer uma reforma para conseguir viabilizar o teu evento. Hoje a gente tem alguns autódromos muito sucateados o que é uma pena, porque quando vamos para uma cidade nós lotamos os hotéis, alugamos praticamente todos os carros da frota da cidade, lota os restaurantes, então é muita miopia de uma prefeitura ou de um estado que argumento não investir em um equipamento como um autódromo porque não vamos fazer um negócio para 30 pessoas correrem e na verdade não é isso. O automobilismo é o meio e não o fim. Já está comprovado por diversos estudos que, quando vamos para uma cidade, geramos um movimento gigante na economia, independente se são 20 ou 30 carros correndo, soma-se a isso se o autódromo está em boas condições pode receber uma corrida de outra categoria nacional, de corridas dos campeonatos regionais, por isso clamamos por reformas nos autódromos já existentes e pelo surgimento de novos. Alguns estão saindo no Brasil, como é o caso de Chapecó, Cuiabá, Brotas e a recuperação do autódromo de Brasília. Acredito que nos próximos dois anos teremos menos desafios para acomodar um evento do porte da Stock Car.

 

Um dos maiores desafios é a condição precária de alguns autódromos no Brasil. As vezes temos quase que reformá-los.

 

NdG: Partindo do princípio que teremos mais autódromos de qualidade, vendo que há muitos anos a Stock Car tem um calendário de 12 corridas, haveria possibilidade de ampliar um pouco este calendário, com duas, talvez três corridas mais?

 

Fernando Julianelli: É algo que para ser executado precisa ser muito conversado. No caso do automobilismo, diferente de outros esportes como tênis, vôlei, futebol, que os custos do evento são praticamente os mesmos, mantendo uma equipe jogando ou só treinando, no caso do automobilismo é diferente. Tem custo de viagem, combustível, peças, desgaste do carro, pneu, etc. assim, para podermos aumentar uma etapa ou duas, é preciso manter este equilíbrio sócio-econômico com as equipes e patrocinadores, do contrário se uma equipe chega para ou patrocinador e fala que ao invés de 12 etapas serão 14, a chance do patrocinador não querer aumentar proporcionalmente o valor investido para este aumento de etapas existe. Isso reduziria a margem de viabilidade econômica das equipes, a promotora da categoria também teria que promover mais eventos no ano e isso também impactaria no orçamento. Seria necessário olhar o todo e não apenas “uma foto, mas todo o filme”. Depois de 2025, com o carro novo, que é realmente totalmente novo, uma nova geração, que iremos entender o custo operacional desse projeto na vida real e aí ver se é possível fazer uma ampliação no número de etapas, levando a Stock Car para diferentes lugares e atingir mais fãs do automobilismo.

 

NdG: No caso do autódromo de Brasília, o BRB, que patrocina a categoria, entrou diretamente no projeto da reforma. Você que é uma pessoa do Marketing, como seria possível desafiar investidores em outros estados a fazer o que o BRB está fazendo?

 

Fernando Julianelli: É lógico que cada cidade, região, tem no seu empresariado suas próprias peculiaridades e particularidades. Mostrando o potencial de turismo que e de visibilidade que um evento de automobilismo pode levar, a partir do momento que existe um autódromo naquela cidade ou região. Por exemplo: este ano teremos uma corrida em volta do Mineirão, em Belo Horizonte, e a previsão é a de vendermos para todos os dias 80 mil ingressos. Imagine o impacto disso na economia da cidade. São 80 mil pessoas, muitas de fora, consumindo, hospedando-se nos hotéis, ocupando os restaurantes, shoppings, visitando outros pontos turísticos da cidade... esse dinheiro que fica na cidade é muito interessante, custeia o evento e dá retorno. Em cidades menores, que não tem tanta visibilidade, colocar um autódromo e levar grandes eventos é uma forma de colocar um ‘pin’ no mapa. Veja o exemplo dos autódromos no oriente médio. Jeddah, Abu Dhabi, Dubai, se não tivessem os autódromos seriam mais uma cidade na região. Foram cidades que investiram muito em atrair o turista estrangeiro e um dos instrumentos para isso foi levar a F1 pra lá. E isso mexe com outras cidades. Las Vegas investiu mais de 1 bilhão para levar a F1 pra lá e, em teoria, nem precisava, mas esses caras sabem fazer contas e não podem estar tão errados quando investem tudo isso. Eu fico imaginando cidades como Londrina, Chapecó, Cuiabá, Santa Cruz do Sul, Cascavel... é uma oportunidade de levar as imagens da tua cidade, da tua região para 153 países. Eu mesmo já fui viajar e fazer turismo em cidades do mundo onde eu tinha ido a trabalho. Fui a trabalho e depois voltei com a família. Temos que olhar os 360° e não sermos binários, pensando apenas no custo para construir um autódromo e quantas corridas vão acontecer naquele lugar por ano.

 

Os prefeitos, governadores, políticos, precisam entender o retorno que um autódromo pode gerar para uma cidade ou região.

 

NdG: Pensando em futuro, como vocês da VICAR estão vendo o processo de renovação de gente, dentro da VICAR e dentro das equipes, não apenas pilotos, mas engenheiros, mecânicos entre outros?

 

Fernando Julianelli: Quanto mais visibilidade você tem, mais oportunidades de patrocínio, de pagar melhores salários, de ter acesso às pessoas do automobilismo – que ficou muito mais fácil – quando comecei no automobilismo era muito difícil falar com as pessoas. Você conhecia alguém, e aí pedia para ele te apresentar para outros. Hoje em dia você entra no Linkedin e vê: chefe de equipe da Stock Car. Um engenheiro recém-formado, um mecânico de concessionária que quer sair daquela rotina e ir trabalhar numa equipe, com alguma persistência ele consegue chegar nessas pessoas e conseguiu uma oportunidade. De certa maneira, essa integração do mundo digital furou um pouco essa bolha, que era quase uma confraria de automobilismo e que as redes sociais permitem que você siga, interaja... eu já recebi muitas mensagens de gente que quer trabalhar na Stock Car, são atalhos que você não teria 15 anos atrás. Isso acaba trazendo gente nova, fazendo essa renovação. Com o esporte em crescimento, é preciso contratar mais gente, falar com outras pessoas. Quando eu comecei na Stock Car em 2001, tinha um assessor de imprensa na equipe. Hoje tem o vídeo maker, tem o influenciador, tem o cara que edita os vídeos, tem o fotógrafo, os pilotos as vezes tem o seu assessor de imprensa e antes era um assessor de imprensa para a equipe inteira. São 5, 6 pessoas e isso é só para comunicação. Por isso vemos mais caras novas, recicla pessoal, aprimora, tira vícios do passado... e uma das coisas que estamos pensando e planejando é um curso profissionalizante especializado em motorsport. É algo que tem nos EUA, na Europa, em vários lugares do mundo e enquanto lá fora tem ‘head hunters’ que buscam profissionais para esta área, com formação pra ela, coisa que não temos no Brasil. Se sai alguém de uma equipe aqui e for numa faculdade ou escola técnica e diz que quer contratar estagiários, muita gente vai querer. Esse é um movimento que tende a ser cada vez maior.

 

NdG: Entre as coisas novas que a VIVAR fez, a premiação para o campeão da Stock Series, de 2,5 milhões, um valor robusto para o campeão subir de categoria, e alguns vieram para a Stock Car mesmo sem esse prêmio, teve o processo de abraçar a Turismo Nacional, também oferecendo uma premiação, para fazer uma categoria de entrada. Como foi o estudo dessa mudança?

 

Fernando Julianelli: Se formos parar para pensar em custo de temporada, é uma diferença muito grande. Enquanto uma temporada na Stock Series custa em torno de 900 mil reais/ano e uma temporada na Stock Car gira entre 4 a 4 milhões e meio. A gente precisou dar uma ajudinha para o piloto “pular esse muro”. Obviamente é um custo para a VIVAR, mas entendemos que é preciso ver o todo, buscar algo maior. Na Turismo Nacional não é diferente. A gente resolveu, primeiro e o grande ponto, adotar a categoria, colocando-a debaixo de um guarda-chuva e dentro do Padrão VICAR de entrega de qualidade de evento, de segurança, de governança. Criamos também um sistema de power train único, com motor e câmbio únicos, eletrônica única, justamente para termos a governança de valores e orçamentos para as equipes, evitando aquela competição fora da pista, tipo “ah, aquele preparador faz um motor melhor, mas cobra o dobro”, de motor que estourava por estar trabalhando acima do limite, coisas que vimos como problema antes de estarmos no negócio e quando entramos, mudamos o pacote técnico, a entrega de produção do evento e nada mais justo do que premiar o campeão da categoria que queira fazer essa carreira e galgar os passos e ele vai ter a temporada completa na Stock Series. É como a bolsa de estudos: o melhor aluno vai estudar na minha faculdade sem pagar nada. Este foi o sentido.

 

A Stock Series terá novos carros em 2026. As equipes vão aumentar a oferta e o grid pode crescer. Temos apenas 13 carros.

 

NdG: Na Turismo Nacional tivemos um ganho de carros no grid considerável com essa premiação, mas na Stock Series o grid continua pequeno, mesmo com o prêmio. Qual a razão disso?

 

Fernando Julianelli: O que temos é um grande gargalo técnico. Como os carros estão começando a ficar velhos, só temos 13 carros 100% prontos para colocar no grid pra correr nesse regulamento. Então, olhando o 13 como um número não tão grande, 13 é o máximo de carros prontos para correr que temos no Brasil. Tem um gargalo de câmbio também. Como vamos mudar esse carro da Stock Series a partir de 2026, as equipes falaram que não fazia sentido investir num equipamento prestes a ser trocado. O câmbio é a peça mais cara do carro e não faz sentido um investimento desses. É um gargalo temporário, estamos convivendo com isso mesmo sabendo da procura pela categoria. Acredito que mesmo com 13 carros teremos ótimas corridas, temos a dificuldade de estar no Brasil, com um câmbio monetário que não ajuda a importar material, mas em 2026 teremos um novo carro e a expectativa é boa.

 

NdG: Os espetáculos de automobilismo no Brasil são de excelente qualidade, mas temos visto os autódromos muito vazios em relação ao que se via 10 ou 15 anos atrás. A gente “perdeu a mão” no sentido de atrair o público pro autódromo?

 

Fernando Julianelli: Vamos pensar lá trás. Quando a gente assistia uma corrida de automobilismo pela televisão a transmissão tinha 4 câmeras, o som da tua televisão não era tão bom, ela era pequena, as vezes não era ao vivo porque tinham poucos canais, as corridas nem sempre eram transmitidas, não existia imagem em HD... tinha um monte de coisas que levavam o fã para o autódromo. A experiência na TV não era tão legal, de ver o carro passando, ouvindo o ronco do motor, ver a corrida ao vivo. Hoje, a qualidade da transmissão é outra. Em Interlagos colocamos 14 câmeras, 2 drones, microfones espalhados pela pista, são imagens em 4K, todo mundo tem em casa uma TV de plasma, ou LED, Smart, de HD com 42 polegadas ou mais. Se formos parar pra pensar, talvez seja mais interessante assistir a corrida pela TV do que ir para o autódromo. Sou bem sincero. Você vai chegar lá, pegar fila pra entrar, sentar na arquibancada comprar teu sanduiche, tua cerveja, vai pegar fila pra ir no banheiro. Se formos olhar o ponto de vista do “vou assistir o esporte”, talvez o melhor lugar seja a televisão. Por isso que é necessário para se conseguir atrair o público termos as outras coisas, criarmos experiências. As pessoas querem participar de experiências. Para isso a gente tem o Village, ter uma plataforma grande de camarotes... os camarotes corporativos são todos vendidos em todas as corridas. A empresa quer trazer seu cliente pra viver a experiência. Eles veem a Stock Car como um grande negócio que faz uma corrida. O camarote se paga com os negócios que são feitos com os convidados. Eu acho que nossos públicos são bons, que temos as arquibancadas cheias. Em Interlagos é diferente porque são arquibancadas muito grandes, é para uma F1. Nós estamos atraindo um público novo, vemos crianças e adolescentes jogando os jogos da Stock Car, famílias vindo assistir corridas dom pais e filhos, é uma forma de atrair público também. Podemos falar horas sobre isso e não chegar num ponto convergente.

 

80% dos pilotos da Stock Car vieram dos monopostos. Ter uma categoria de entrada no Brasil é fundamental.

 

NdG: A VICAR sempre trabalhou com categorias de Turismo, mas há 3 anos vocês abraçaram o projeto da Fórmula 4 FIA no Brasil para dentro do evento. Qual é a relação com a categoria de monopostos? Apenas encaixaram as corridas ou há um envolvimento na mesma?

 

Fernando Julianelli: Nós identificamos que 80% do nosso grid da Stock Car tenha começado a correr em monopostos. F. Renault, F. Chevrolet, F. Ford, então, sem dúvida nenhuma, o Brasil precisava de uma categoria FIA de Fórmula pra minimamente criar essa base para esses pilotos vindos do kart começarem aqui no Brasil o caminho para tentarem chegar à Fórmula 1. Este desafio para os pais era mandar o menino ou a menina com 14 ou 15 anos que ganhava tudo no kart pra Europa. Aí chega na Europa ele tem que aprender a cozinhar, lavar louça, banheiro, morar longe dos pais, vai parar de estudar, tem que aprender o idioma, que nem sempre é o inglês, se relacionar com a equipe... provavelmente 90% dos problemas que o piloto vai enfrentar estão fora da pista. Quando começamos a discutir isso e vimos que se fizéssemos uma Fórmula 4 no Brasil, com o mesmo regulamento FIA, com o mesmo carro, com preços acessível, nos mesmos autódromos que a Stock Car corre, com algum subsídio, isso pode ser bom para todos. O piloto vai dar o primeiro passo aqui no Brasil, vai continuar estudando, morando com os pais, trabalhando com uma equipe que fala seu idioma, tudo facilita e, até se um dia eles voltem para o Brasil, sem chegar na F1, já terá uma experiência de correr de carro no Brasil. Esse foi também um propósito de se pensar a longo prazo para a Stock Car. Aí vem o investimento: como chegar para um chefe de equipe, um dono de equipe e dizer que é preciso comprar um carro de 700 mil reais (e não é só um), mais pneus, peças, etc. O cara vai dizer que é muito dinheiro para uma categoria que ele não sabe se vai dar certo, ninguém vai investir um milhão e meio (ou mais) pra ver se vai dar certo. Aí nós fomos pra Itália, onde fica a Tattus, compramos 16 carros e locamos de forma super acessível estes carros para as equipes, inicialmente 4 equipes da Stock Car, reduzindo o investimento das equipes para fazermos o campeonato. Junto disso tem outro desafio: o piloto que chega na Stock Car, chega querendo ficar e o piloto da Fórmula 4 chega querendo ir embora e isso obriga a gente a trabalhar quase do zero no final da temporada para ter um grid pra temporada seguinte e aí vamos buscar os pilotos, seus pais, patrocinadores para fazer a temporada seguinte. Enquanto for possível continuar fazendo isso e o campeonato funcionando, vamos continuar insistindo.

 

NdG: E qual o papel do Gastão Fráguas neste processo?

 

Fernando Julianelli: O Gastão é o responsável pelo projeto dentro da estrutura. A categoria precisava ter um “pai” e ele já foi campeão mundial de kart, entende muito da relação de equipe com pilotos jovens, entende a relação com os pais dos pilotos, com tudo isso achamos que ele era a pessoa ideal para ficar à frente desse projeto.

 

NdG: Começando pelos parabéns por trazer a Mitsubishi para ser a 3ª montadora na Stock Car para 2025, existe uma “fábula” – e ninguém fala a verdade nisso – de que lá na Argentina eles tem tudo das montadoras e nós não temos nada. Mas com tantas montadoras no Brasil, porque é tão difícil colocar uma montadora na pista?

 

Fernando Julianelli: Eu vivi 10 anos dentro de uma montadora e a Motsubishi já fez parte da Stock Car num passado recente, assim como a Peugeot e a Volkswagen. De uma certa forma, quando se está do lado da montadora e se pensa em entrar no automobilismo, principalmente o de pista, você tem vários desafios. Precisa ter uma equipe de Motorsport na estrutura, precisa desenvolver o carro, vamos entrar numa categoria que outras montadoras já estão há muito tempo, vamos chegar fazendo escala com os concorrentes... então tem muitos pontos a serem analisados. A grande vantagem na Stock Car é que a gente desenvolve tudo. A montadora vai ficar com a parte gostosa desse processo que é o marketing, o relacionamento com a rede de concessionárias, promover a marca, gerar conteúdo, atrair clientes, enquanto o restante nós fazemos. Penso que esse caminho nosso é um caminho vencedor. Uma coisa que de certa forma nos limitava de trazer outras montadoras era a redução no mercado de sedans no brasil e o crescimento do mercado dos SUVs. Quando começamos a conversar sobre futuro com a Toyota e a Chevrolet, vimos a possibilidade de mudar o carro da categoria, não para um SUV grande, mas um menor, como o Corolla Cross e a Tracker? Falamos muito internamente e eu levantei um ponto: tem coisa mais esquisita do que corrida de caminhão? Não tem, mas todos nos acostumamos a ver corrida de caminhão, é um evento maravilhoso, super interessante, competitivo e tal. Se corrêssemos com carros super esportivos apenas e fôssemos migrar para os sedans, seria a mesma coisa. Iam falar que era “carro de motorista”, de gente mais velha, etc. Tem sempre aquela rejeição inicial. Fizemos uma pesquisa com o público, fãs da Stock Car e, pra nossa surpresa, a ideia foi super bem aceita. Daí fizemos o visual do carro, que ficou muito bonito e as montadoras disseram que era isso que elas queriam. Com isso na mão, fomos prospectar o mercado, que tinham baixa venda de sedans comparada com a venda de SUVs. As conversas estão sendo muito boas e o que fazíamos de ir procurar as montadoras, agora nós estamos sendo procurados por elas para conhecer como funciona o modelo de negócios, o custo do investimento, como podemos aproveitar isso dentro da empresa. A apresentação da Mitsubishi vai ser um evento para toda a mídia e não estamos privilegiando ninguém com um “furo de reportagem”. Também não queremos que isso atrapalhe nossa estratégia com outras montadoras.

 

Durante anos nós buscávamos as montadoras para vir pra Stock Car. Isso mudou: agora estamos sendo procurados.

 

NdG: Você deu uma entrevista há alguns meses e disse que o desejo seria ter quatro montadoras. É possível termos um novo anúncio ainda este ano?

 

Fernando Julianelli: Essa entrevista foi dada deixando claro nosso objetivo e neste final de semana da etapa de Interlagos a Mitsubishi foi anunciada como a terceira montadora a se juntar ao grid. Estamos em conversas com outras duas montadoras que estão indo muito bem. Uma delas, inclusive, já tinha fechado conosco, “no fio do bigode”. Mas houve uma mudança de executivo e acabamos voltando para a estaca zero da conversa, isso faz parte. Eu sempre falo que por trás de um CNPJ tem sempre um CPF, mas independente de termos quatro ou três, a temporada 2025 vai ser muito bacana, com a nova montadora, pelo sistema de “draft” das equipes para definir quais equipes usarão quais carros, uma coisa que todos serão informados como será no seu devido tempo, o novo visual dos carros e eu penso que estamos puxando uma fila que será tendência em várias categorias de turismo no mundo.

 

NdG: O bom gestor tem sempre que pensar na frente. Como você projeta estar a VICAR daqui há 5 anos? Mas por favor, tente separa o desejo no que você acha exequível.

 

Fernando Julianelli: Nos já temos um plano de trabalho para os próximos anos. Aonde pretendemos estar a médio prazo e o carro novo vai ser um fator transformador, certamente. Ter uma relação mais interativa com os fãs com os jogos eletrônicos e suas plataformas, inclusive a nossa, com aplicativos que estamos lançando onde vai ser possível ouvir o rádio dos pilotos, as câmeras e o áudio dos carros...

 

NdG: Com “piii” ou sem “piii”?

Fernando Julianelli: Sem “piii” (risos). Pelo menos no começo. Se a coisa ficar muito complicada a gente muda de ideia (mais risos). Vai ser algo muito legal, pois vai trazer o fã, o público em geral e a imprensa pra dentro do carro e além disso, voltando a pergunta inicial, esse carro é um projeto que a patente é nossa, o projeto é nosso e com o sucesso dele a ideia é poder crescer globalmente e não ter um “mundial de Stock Car”, mas ter um promotor em outro país, na Austrália, na Europa, na Ásia, que diga: “quero montar a categoria aqui” e comprar os carros aqui no Brasil pra fazer o campeonato lá, com o regulamento e tudo mais. Como fazemos com a Fórmula 4. Nós fizemos isso e porque não fazer o contrário: vender nosso campeonato para o mundo? Nosso sonho é grande!

  
Last Updated ( Monday, 03 June 2024 20:00 )